Artigo: Contra a corrupção, compliance

Por Roberto Abdenur, Presidente Executivo do Instituto Brasileiro de Ética Concorrencial (ETCO)

Benéficas mudanças no ambiente de negócios já começam a aparecer em consequência da Lei Anticorrupção (Lei nº 12.846/2013), antes mesmo de ela ser regulamentada. Aprovada e sancionada em agosto, ainda depende de processo de análise de vetos. A lei, que pela primeira vez no País abre a possibilidade de punição de pessoas jurídicas em caso de corrupção, descortinou um horizonte até então pouco percebido por muitos executivos, que constatam agora a necessidade de criar ou reforçar a área de compliance, até como forma de comprovar uma atuação ética.

Programas de compliance são conhecidos por empresas de capital aberto, que têm por compromisso atuar com transparência e seguir os parâmetros de governança corporativa.

A disseminação do conceito de compliance, graças à Lei Anticorrupção, que visa responsabilizar a empresa por atos ilícitos praticados por seus funcionários, certamente vai provocar uma mudança cultural no modus operandi das empresas e organizações, mas não sem apresentar desafios que, sob vários aspectos, são muito brasileiros. Atuar como empresa ética é muito mais do que cumprir as regras: significa erradicar a cultura de tolerância com desvios de conduta de toda sorte. Significa esquecer o significado do famoso jeitinho brasileiro.

O incentivo às mudanças deve-se, em grande parte, a um dos artigos da lei, que prevê redução de pena a empresas que comprovarem programas de compliance. Isso significa que, se a companhia cria uma estrutura para estimular que todos sigam as leis, ela já está fazendo a sua parte. Presume-se que, dessa forma, haja menos possibilidade de um funcionário ter desvios de conduta e a empresa pode, eventualmente, se eximir de culpa. Sem conformidade, o terreno se torna mais fértil para atitudes não éticas.

A Lei nº 12.846 também inova ao envolver a atuação de empresas brasileiras no exterior. Nesse sentido, está alinhada a legislações dos Estados Unidos e da Grã-Bretanha, por exemplo. Nos EUA, desde 1977, o Foreign Corrupt Practices Act (FCPA) proíbe suborno de funcionários públicos estrangeiros por empresas americanas. Em 2011, a Grã-Bretanha aprovou o Bribery Act, a lei de combate à corrupção que também prevê punição em casos envolvendo funcionários estrangeiros.

Com a globalização cada vez mais consolidada, a tendência é de que os governos se preocupem não apenas com a corrupção dentro de casa, mas também portas afora. Em tese, a Lei Anticorrupção pode ser aplicada no recente caso de uma empresa estrangeira que revelou um esquema de corrupção em licitações de serviços públicos no Brasil.

Resumidamente, pela lei, são atos lesivos à administração pública, nacional ou estrangeira, prometer ou dar vantagem indevida a agente público; financiar ou patrocinar atos ilícitos; fraudar processo licitatório; criar, de modo fraudulento, pessoa jurídica para participar de licitação pública; obter vantagem ou benefício indevido em contratos com a administração pública; manipular ou fraudar o equilíbrio econômico-financeiro dos contratos; ou dificultar investigação ou fiscalização de órgãos ou agentes públicos. Tudo isso para evitar os descaminhos no relacionamento público-privado.

Demoraram os trâmites da lei. Após três anos no Congresso, foi votada e sancionada no início de agosto, em boa parte por conta da pressão popular decorrente das manifestações de junho.

Proposto pelo Executivo, o Projeto de Lei 826/2010 se transformou na Lei Ordinária 12.846/2013. Como foi sancionada pela Presidente Dilma Rousseff com alguns vetos, a Câmara constituiu Comissão Mista incumbida de relatar o veto. Integra a comissão o deputado Carlos Zarattini (PT-SP), relator do PL. Para ele, a aprovação da lei é um grande avanço, por prever também que a empresa repare o dano causado.

Entre as punições previstas estão multas que podem ir de 0,1% a 20% do faturamento da empresa, perda de bens, suspensão de atividades ou até a dissolução da pessoa jurídica em caso de empresas-laranja. As penas podem ser atenuadas se as organizações colaborarem com as investigações ou se já tiverem mecanismos de compliance.

Como com os princípios de sustentabilidade, em que grandes empresas adotam modelos internos e passam a exigir o mesmo de fornecedores, apresenta-se hoje uma grande oportunidade de criarmos um círculo virtuoso de compliance. Duas consequências imediatas podem ser vislumbradas com isso: o Brasil vai atrair mais investimentos externos e a relação entre o setor privado e o setor público será mais ética.

Artigo: Corrupção em xeque

Roberto Abdenur, Presidente Executivo do Instituto Brasileiro de Ética Concorrencial (ETCO)

Contra um mal que pervaga todos os estratos da sociedade, precisamos de remédios potentes, ou melhor, de vacinas. Quando não há vacinas, como contra o mal da corrupção, que tem impacto direto no desenvolvimento socioeconômico dos países, o caminho da prevenção reside em simplicidade, transparência, esclarecimento e punição.

Simplicidade pode ser a chave para derrubar argumentações de quem pratica sonegação fiscal, comércio ilegal ou informalidade. A complexidade do sistema tributário brasileiro, o tamanho da sua carga, a burocracia e o longo processo para efetuar o pagamento dos tributos têm sido pretexto e fator para corrupção e sonegação. Números ajudam os pérfidos argumentos: no Brasil, as empresas gastam em média 2.600 horas por ano para o pagamento dos impostos, em comparação com a média mundial de 277 horas, conforme o ranking Paying Taxes 2013, elaborado pela consultoria PWC, em parceria com o Banco Mundial e a International Finance Corporation (IFC).

Transparência constitui a base da democracia e o maior antídoto contra a corrupção. Nos últimos anos, o Brasil estabeleceu mudanças na relação entre governos e população, em grande parte como resultado de pressões de setores representativos da sociedade. Novas leis, como a de Responsabilidade Fiscal e a 8.666 (das Licitações), mostram que o País vem investindo no aumento da transparência. Outras iniciativas descortinam esperanças de maior transparência no trato da coisa pública, como o Sistema Federal de Acesso à Informação, a criação das TVs Câmara e Senado ou o projeto que cria Conselhos de Ética nas Assembleias Legislativas e Câmaras Municipais.

Esclarecimento resulta de esforço de governos, instituições e organizações da sociedade civil na conscientização da população sobre a importância do comportamento ético em todas as esferas. Tanto a corrupção miúda, muitas vezes tolerada, quanto o envolvimento de agentes públicos em grandes escândalos são essencialmente os mesmos desvios de conduta.

Para boa parte da população, porém, essa relação permanece intangível. Adquirir produtos piratas ou falsificados, quando há evidência de que assim o são, recorrer à propina em vez de fazer curso de reciclagem de motoristas com excesso de pontos na carteira de habilitação ou em vez de pagar qualquer tipo de multa, deixar-se levar por vantagens escusas nos negócios. Tudo isso é corrupção. Muitas vezes tolerada. Muitas vezes nem sequer percebida como tal.

A corrupção miúda costuma envolver cidadãos bem-intencionados que consideram não haver outra saída quando se deparam com um agente público mal-intencionado. Mas também há muitos casos de agentes públicos bem-intencionados que se deparam com pessoas mal-intencionadas, para as quais só com propinas se resolvem as coisas. Combater a corrupção é dever de todos nós.

Mas grande número de brasileiros tem, como qualifica a ministra Ellen Gracie Northfleet, ex-presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), uma atitude dualista frente à corrupção. De um lado, o denuncismo que abusa do prejulgamento. De outro, a letargia condescendente com determinadas práticas nada republicanas.

As consequências dessa condescendência são graves para a economia. O estudo Global Fraud Survey 2012, da consultoria Ernst & Young, mostra que 84% dos executivos brasileiros entrevistados na pesquisa consideram que a corrupção é generalizada no ambiente de negócios. O índice é superior à média global (39%) e ao verificado na América Latina (68%). Mas os entrevistados afirmaram que não concordam com essa situação e querem melhorar o ambiente de negócios. Para 90% deles, deveria haver mais sanções contra fraudes e propinas.

Punição, por fim, comprova que a sociedade não tolera tais desvios de conduta. A sensação de impunidade tem sido apontada como um dos principais fatores dos altos índices de percepção da corrupção no Brasil. O estudo Percepções da Corrupção Index 2012, da ONG Transparência Internacional, coloca o Brasil na 69ª posição entre 176 países. No topo, como menos corruptos, estão Dinamarca, Suécia e Nova Zelândia. No fim da lista, Afeganistão, Coreia do Norte e Somália.

Nesse sentido, é alvissareira a aprovação pelo Senado do Projeto de Lei da Câmara (PLC) 0039/2013 (PL 6826/2011), no dia 4 de julho, sem alterações. Certamente em resposta às manifestações populares de junho, o Senado incluiu em sua pauta prioritária a votação do projeto conhecido como Lei Anticorrupção. Ele permite punir empresas – e não apenas seus representantes, pessoas físicas – que pratiquem atos contra a administração pública. O texto garante o ressarcimento do prejuízo causado aos cofres públicos por atos de improbidade.

Proposto pelo Poder Executivo, e tendo o deputado federal Carlos Zarattini (PT-SP) como relator, o PL foi sancionado pela presidente Dilma Rousseff em 1º de agosto, com três vetos. Por conta desses vetos, voltará a tramitar no Congresso. Para Zarattini, o Brasil é um dos três países dos 34 integrantes da OCDE que não têm uma lei específica para punir corruptores. Daí a importância e a premência da aprovação da Lei Anticorrupção.

A corrupção constitui um obstáculo ao desenvolvimento econômico, especialmente porque subtrai recursos das políticas públicas, aumenta os gastos públicos, causa distorções e desequilíbrios na concorrência entre as empresas, estimula a sonegação fiscal, provoca insegurança jurídica, encoraja a criminalidade e dá fôlego a uma certa cultura de leniência com as transgressões.

Só com simplicidade, transparência, esclarecimento e punição, além de instituições fortes em ambiente democrático, poderemos quebrar as engrenagens de funcionamento da corrupção e criar a sociedade que almejamos. O combate à corrupção deve ser um dos sustentáculos na construção dos valores que podem conduzir o Brasil ao lugar de merecido destaque no panorama mundial.

ETCO discute transparência e ética em congresso de Live Marketing

Para Roberto Abdenur, a ética precisa ser incluída como um valor central nos negócios das empresas


Com o objetivo de ampliar os espaços para a discussão sobre a defesa da ética concorrencial, o Presidente Executivo do ETCO, Roberto Abdenur, aceitou convite para ser um dos palestrantes do 1º Congresso Brasileiro de Live Marketing, promovido pela Associação de Marketing Promocional (Ampro) nos dias 29 e 30 de julho, em São Paulo.

O evento teve como objetivo promover o debate sobre os temas relevantes que envolvem agências, clientes, fornecedores e toda a cadeia produtiva do Live Marketing, conceito que valoriza a experiência ao vivo de uma marca.

Em sua apresentação, Abdenur salientou que a ética precisa ser um valor central nos negócios das empresas, tanto diante do público interno como dos clientes e dos fornecedores. “Incluir a ética como um valor da empresa, entretanto, não a autoriza a usá-la apenas como uma ferramenta de marketing. A ética deve ser um compromisso real da empresa.”

Ele lembrou que o processo de construção da reputação de uma empresa é longo e isso inclui comportamento ético, responsabilidade social e sensibilidade ambiental.

O Presidente Executivo do ETCO apresentou pesquisa que mostra a complexidade do sistema tributário, a impunidade e a corrupção como principais obstáculos a serem superados para o estabelecimento de maior ética no ambiente de negócios. Abdenur lembrou que, no Senado Federal, mais de 20 senadores têm processos na Justiça, enquanto na Câmara dos Deputados o número passa de 100. “A crescente indignação com a corrupção ocorre em uma etapa caracterizada por importantes avanços nas leis e instituições voltadas a combatê-la”, afirmou Abdenur, citando, entre outras medidas, a aprovação da Lei Anticorrupção.

Os representantes de Live Marketing que participaram do painel seguinte à apresentação de Abdenur concordaram que é impossível tornar esse mercado sólido e confiável se as empresas não agirem de maneira ética com clientes e fornecedores, e também entre si.

“O elemento novo (nos negócios) é a transparência. Algumas empresas ainda praticam a ideia de que nos negócios sempre um ganha e outro perde. Mas todos podem ganhar”, afirmou a editora-chefe do jornal Meio&Mensagem, Regina Augusto, que concluiu dizendo que “é possível uma relação sustentável entre cliente e empresa.”

O diretor de Marketing do Itaú, Fernando Chacon, destacou que a transparência deixou de ser importante apenas para o público. “A gente quer uma relação de transparência também com os fornecedores”, explicou.

Já a diretora de Marketing da Johnson&Johnson, Andréia Bó, afirmou que a empresa tem uma relação de sustentabilidade com as agências, ou seja, seus fornecedores. “Para nós, a transparência é o que rege o processo de escolha de um parceiro.”

Para Marcelo Heidrich, da agência Ponto de Criação, é preciso trabalhar com transparência e credibilidade. “Este é o momento de discutir novas relações, não podemos ficar mal entre nós porque estamos indo muito bem”, afirmou, referindo-se à necessidade de união entre as agências para a busca de um objetivo comum: negócios éticos, onde todos sejam vencedores.

Artigo: Uma doença de R$ 730 bilhões

Por Roberto Abdenur, Presidente Executivo do ETCO, e Fernando de Holanda Barbosa Filho, pesquisador do IBRE/FGV

A economia subterrânea brasileira – a produção de bens e serviços não reportada ao governo, que fica à margem do PIB nacional – chegou a 16,6% do Produto Interno Bruto brasileiro em 2012, conforme o Índice de Economia Subterrânea, recentemente divulgado pelo Instituto Brasileiro de Ética Concorrencial (ETCO), em conjunto com o Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getúlio Vargas (IBRE/FGV). Em valores absolutos, a estimativa é de que a economia subterrânea em 2012 tenha superado R$ 730 bilhões. Essa parcela significativa da economia brasileira é apenas o sintoma de uma doença cuja causa pode ser atribuída a fatores como a elevada carga tributária, a rigidez do mercado de trabalho, a baixa escolaridade média da força de trabalho e o excesso de burocracia em praticamente todos os passos necessários para a formalização de um negócio. Ou seja, os elevados custos operacionais e financeiros associados com a atividade totalmente formalizada levam muitas pessoas e empresas a ficarem à margem da lei.

O resultado de 2012 mostra que a economia subterrânea teve uma redução de 0,3 ponto porcentual em relação ao ano anterior, apesar do baixo crescimento da economia em geral. A queda observada, entretanto, é pequena se comparada às reduções de 0,8 ponto porcentual nos dois anos anteriores. Essa desaceleração se deve, em grande parte, ao recuo das contratações formais pela indústria e ao desempenho do setor de serviços, que é intensivo em mão de obra e se mostra bastante dinâmico, mas apresenta níveis de informalidade maiores do que a indústria.

Assim como a figura do “copo meio cheio, meio vazio”, o resultado traz duas interpretações opostas, dependendo do ângulo em que é analisado. O “copo meio cheio”, ou seja, o lado positivo, mostra uma redução da economia subterrânea que acontece ainda que em um período de baixo crescimento do PIB associado a uma menor formalização do mercado de trabalho. Já pelo lado do “copo meio vazio”, vemos a redução do ritmo da queda da economia subterrânea, o que pode indicar uma estagnação do índice.

Mas, apesar de abaixo dos anos anteriores, esse resultado é importante e mostra que a trajetória de redução da economia subterrânea, gigante e desconhecida no Brasil, que já representou 21% do PIB, é consistente, e, mesmo em um ambiente menos propício, essa parcela da economia está se reduzindo.

Apesar do esforço do governo em criar medidas que facilitem a formalização, sobretudo nos setores de comércio e serviços, onde predominam os pequenos empreendedores, os níveis de adesão nesses setores ainda são bastante baixos.

Pesquisa recentemente divulgada pelo SPC Brasil e pela Confederação Nacional de Dirigentes Lojistas mostrou que quase metade (49%) dos entrevistados não sabe o que fazer para regularizar o próprio negócio. De outra parte, entre os que querem ampliar o negócio este ano, a maioria não pretende ir adiante porque teme a burocracia, uma queda no rendimento e o surgimento de novos custos e ônus tributários. Desde o fim de 2012, observa-se que o crescimento do mercado formal de trabalho encontra-se muito próximo do seu limite em razão de dois grandes fatores: a rigidez das leis trabalhistas e o baixo nível de escolaridade do brasileiro.

É necessária uma profunda reflexão sobre as razões dos atuais resultados, para que sejam elaboradas políticas públicas realmente efetivas, de modo que o peso de economia subterrânea no Brasil se torne gradativamente menor. Entre os principais obstáculos à continuidade dessa evolução está o das leis trabalhistas que amarram a economia. O outro, menos óbvio, mas com muito impacto na redução da informalidade, é o nível de escolaridade do brasileiro. Entre 2002 e 2011, a informalidade no mercado de trabalho caiu 10 pontos porcentuais, saindo de 43% para 32% do total da população empregada. O acréscimo dos 22 milhões de pessoas que se educaram entre 2001 e 2011, segundo a Pnad, responde por 64% dessa queda.

Esses números trazem novas e ricas possibilidades no que diz respeito à melhoria do mercado de trabalho no País e à consequente redução da informalidade na economia. A suavização das rígidas leis trabalhistas brasileiras pode ser um próximo passo para o aprofundamento do processo de formalização da economia. A redução dos custos de contratação e demissão incentivaria a formalização de trabalhadores por parte de empresas que no momento consideram tais ônus demasiados e optam pela via informal. Por outro lado, um continuado investimento em educação reduziria o impacto que o ainda baixo nível de escolaridade acarreta em termos de informalidade. É preciso, por outro lado, conscientizar a população de que a economia informal causa prejuízos a toda a sociedade, pois priva os governos de recursos para políticas públicas hoje tão flagrantemente necessárias. Em termos mais amplos cria um ambiente de transgressão que ocasiona queda na qualidade do investimento e redução do potencial de crescimento da economia.

Diminuir os índices de economia subterrânea é essencial para o fortalecimento de toda a economia brasileira, visto que ela impõe diversas dificuldades ao País: as estatísticas oficiais perdem relevância; a sonegação fiscal, em decorrência da informalidade, aumenta desproporcionalmente o peso dos tributos sobre as atividades formais; expande-se a concorrência desleal, e atividades à margem da lei passam a gerar problemas trabalhistas, sociais e até mesmo ambientais. É preciso simplificar e racionalizar o sistema tributário e, com isso, tornar o cumprimento da lei menos penoso para a população.

5 efeitos danosos da corrupção que você não vê

O descontentamento dos brasileiros com o tema ficou mais do que evidente nos últimos meses, mas será que pensamos realmente em todos os lados do problema?

Por Marina Pinhoni, Exame.com – 20/08/2013

São Paulo – A insatisfação dos brasileiros com a corrupção ficou mais do que evidente nos últimos meses com as manifestações que tomaram conta do país. Embora os protestos tenham tido como estopim o aumento das tarifas do transporte público, a corrupção também foi apontada como um dos principais motivos para levar os manifestantes às ruas.

“Se você compara o Brasil com outros países na avaliação de políticos, se tem uma percepção de corrupção bem mais alta do que a média mundial”, afirma Roberto Abdenur, diretor do Instituto Brasileiro de Ética Concorrencial (ETCO), que lançou neste mês o livro “Corrupção – Entrave ao Desenvolvimento do Brasil”, organizado pelo jornalista Oscar Pillagalo.

Embora a indignação da população aconteça devido à conclusão óbvia de que os recursos desviados deveriam ser utilizados em áreas essenciais como saúde, educação e transporte, muitas vezes não há a consciência de que a prática da corrupção também esconde outras consequências tão sérias quanto esta.

Em entrevista a EXAME.com, Abdenur ajuda a enumerar essas consequências. Confira a seguir 5 efeitos danosos não visíveis da corrupção.

1) Multiplicação dos prejuízos

“Estudo recente da Confederação Nacional da Indústria (CNI) mostra que cada R$ 1 desviado pela corrupção representa um dano para a economia e para a sociedade de R$ 3”, afirma o diretor do ETCO.

O não recolhimento de impostos e os empregos que deixarão de ser criados, por exemplo, entram nesta conta. Segundo Abdenur, embora não seja possível mensurar exatamente qual é o prejuízo total causado pela corrupção, os fatores multiplicadores não podem ser ignorados.

2) “Contaminação” dos honestos

Outro efeito que pode ser percebido é a “contaminação” de honestos por corruptos. Agentes públicos que antes exerciam suas funções corretamente podem passar a agir pensando em benefício próprio ao perceberem as vantagens que os colegas desonestos obtêm. No mínimo, sentirá um grande desestímulo na profissão.

Se não por ganância, essa “contaminação” também pode acontecer por pressão: muitas vezes os honestos são ameaçados caso não concordem em fazer parte do esquema vigente em sua área. Para o diretor do ETCO, a “vacina” contra esse problema é a adoção de medidas severas de punição.

3) Aumento da ineficiência

O excesso de burocracia também pode fazer parte do ciclo vicioso da corrupção. “A ineficiência alimenta a corrupção e a corrupção alimenta a ineficiência”, diz Abdenur.

O diretor do ETCO dá como exemplo neste caso a figura do despachante, que é um intermediário contratado pelo cidadão diante da dificuldade que ter acesso a um serviço que é público. “Às vezes esses despachantes acabam subornando os servidores públicos para agilizar o serviço. O excesso de burocracia torna o sistema ainda mais oneroso”, afirma.

4) Sensação de impunidade do cidadão

Reduzir a corrupção a zero é quase impossível. “Mesmo em países mais desenvolvidos existe corrupção e, por vezes, ela não é pequena”, afirma Abdenur. O principal problema do Brasil então, na opinião do especialista, é a falta de punição correta para esse tipo de crime. “No Brasil existe um problema sério de impunidade. Nos Estados Unidos, a média para que uma sentença em casos de corrupção saia é de um ano. Já no Brasil, esse tempo é de dez”, afirma.

Segundo ele, a quantidade de recursos permitidos pelo sistema judiciário brasileiro contribui para que casos sejam arrastados até sua prescrição, fazendo com que culpados saiam ilesos de suas acusações. “Isso cria uma cultura de leniência com as transgressões. O cidadão pode pensar: ‘se o político rouba e não acontece nada, então também vou deixar de pagar meus impostos”, diz.

5) Desmoralização das instituições (e da democracia)

Pesquisa realizada pelo Ibope no auge das manifestações de junho já havia apontado que 89% dos entrevistados não se sentiam representados por partidos políticos. No início deste mês, novo levantamento da instituição revelou que a confiança dos brasileiros nas instituições em geral e nos grupos sociais caiu 7 pontos em relação ao ano passado.

“Existe muito descrédito aos políticos e por consequência aos partidos e instituições. O Estado enfrenta uma crise que só será resolvida com a criação de mais pontes de interlocução com a sociedade”, diz Abdenur.

No entanto, o diretor do ETCO acredita que o descrédito nas instituições é muitas vezes exagerado. “Devemos afastar de nós a ideia de que o país é o pior país do mundo”, diz. “O cenário não é tão ruim como as pessoas pensam. O país está melhor que muitos dos nossos vizinhos da América Latina em rankings internacionais de corrupção, por exemplo”.

O diretor do ETCO afirma que o Brasil possui fortes órgãos e instituições de controle como a Controladoria Geral da União (CGU) e o Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade), que tiveram avanços em sua autonomia nos últimos anos.

Abdenur também vê com bons olhos a recente aprovação da presidente Dilma Rousseff da lei que pune empresas que cometem crimes contra a administração pública.