O risco da volta das fraudes fiscais na indústria de bebidas

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Receita Federal suspende sistema de controle de produção que tinha conseguido reduzir a sonegação – substituto ainda é uma incógnita

img4_SICOBENo fim do ano passado, o governo federal abandonou um dos mais bem-sucedidos sistemas de controle físico de produção de bebidas do mundo, que havia conseguido reduzir drasticamente as fraudes fiscais nesse segmento. O presidente executivo do ETCO, Edson Vismona, se diz preocupado com os impactos dessa decisão. “O equipamento anterior funcionava em 320 fábricas no Brasil e foi desativado em 13 de dezembro de 2016. A Receita se comprometeu publicamente a desenvolver um novo sistema, mas é importante que isso seja feito com prioridade e celeridade”, afirma.
Segundo dados da própria Receita Federal, o antigo sistema aumentou em 40% a arrecadação federal sobre o setor de bebidas após sua instalação, em 2008. Foram R$ 4,5 bilhões a mais para os cofres públicos. “É inegável que a ausência de um controle físico de produção pode abrir espaço para que determinados players do setor de bebidas passem a sonegar impostos”, alerta Vismona.
O histórico justifica essa preocupação. Até o início dos anos 2000, o setor de bebidas foi palco de muitos casos de empresas que faziam da sonegação de impostos a sua estratégia de negócio – e que conseguiam crescer muito rápido no mercado. É fácil entender por que elas se davam tão bem nisso. Bebidas são um produto de altíssima demanda (mais de 25 bilhões de litros por ano) e carga tributária
elevada (acima de 50%). Uma empresa que sonega impostos consegue vender rapidamente toda a sua produção cobrando preços impraticáveis para quem recolhe corretamente os impostos.

CONTROLE FÍSICO FOI A SOLUÇÃO

Em 2003, a sonegação era estimada em 30% na cadeia de produção e distribuição de refrigerantes e 15% na de cervejas. Naquele ano, o governo começou a virar o jogo. Primeiro, exigiu que as empresas instalassem medidores de vazão em suas linhas de produção; e em 2008 evoluiu o modelo para a adoção do Sistema de Controle de Produção de Bebidas, o Sicobe, que melhorou ainda mais a fiscalização. “De forma online, o sistema enviava à Receita Federal, diretamente das fábricas, as informações sobre o fabricante, a marca, a data de fabricação da bebida, o volume e o tipo de embalagem, permitindo assim a codificação dos produtos que saíam da linha de produção”, conta Vismona. O Sicobe foi extinto em meio à operação Esfinge, da Polícia Federal, deflagrada no início de 2016, que levantou suspeitas sobre o processo de licitação que resultou na contratação da empresa responsável pela implantação do sistema.
Quando anunciou o fim de um modelo antes de ter seu substituto pronto, o governo afirmou acreditar que outro mecanismo recém-criado poderia evitar a sonegação. Ele se referia à implantação do chamado Bloco K do SPED (Sistema Público de Escrituração Digital), que obriga as empresas a enviar dados detalhados à Receita sobre todas as suas compras de insumos. O sistema começou a ser utilizado no início deste ano, ainda em versão simplificada. Mas o presidente do ETCO tem outra opinião. “Não acreditamos que seja suficiente”, ele afirma. O novo sistema de controle físico que está sendo desenvolvido pela Casa da Moeda prevê monitoramento muito mais detalhado das linhas de produção, utilizando a tecnologia conhecida por QR Code. Mas há dúvidas quanto à necessidade de tanta complexidade, aos custos e ao prazo de implantação. “O cronograma original apresentado pela Casa da Moeda prevê que 100% das fábricas de bebidas estarão com um novo equipamento instalado apenas em março de 2019”, lembra o presidente do ETCO. “Dada a relevância desse controle, esse prazo deveria ser revisto, caso contrário, serão quase dois anos sem um mecanismo eficaz de fiscalização, que podem resultar em perda de bilhões de reais aos cofres públicos.”

Ambev, Heineken e Coca-Cola se preparam para dor de cabeça

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Para adotar o novo sistema, empresas de bebidas precisarão parar a produção, no auge do verão

As produtoras brasileiras de bebidas, incluindo grupos que representam Ambev, Heineken e Coca-Cola, estão lutando contra uma mudança no sistema de monitoramento da produção para fins de tributação que, segundo elas, deixará a indústria exposta a fraudes e colocará segredos comerciais em risco.

No novo sistema, chamado Bloco K, as empresas ficarão responsáveis por informar às autoridades tributárias, manualmente, a quantidade de ingredientes comprados e os volumes produzidos por elas.

O sistema substituiria o uso de máquinas para monitorar os volumes produzidos de refrigerante e cerveja — tecnologia de alto custo criada para reduzir fraudes tributárias, mas que acabou sendo considerada um exagero.

A Receita Federal afirma que a mudança é necessária para cortar custos e fazer melhor uso da receita gerada por impostos estaduais e federais que, combinados, respondem por uma média de 44 por cento no caso da cerveja.

Mas a mudança ocorre em momento difícil para a Ambev, cervejaria de maior venda no Brasil, controlada pela gigante multinacional AB InBev.

Para adotar o novo sistema, as empresas terão de interromper a produção no fim do ano, no auge do verão no hemisfério sul, segundo a Sicpa Brasil, empresa que fabrica o sistema atual.

E a Ambev ainda está trabalhando para se recuperar da desaceleração das vendas que prejudicou os resultados do primeiro semestre do ano.

As grandes produtoras também lidam com um grupo cada vez maior de cervejarias artesanais e não querem facilitar a vida das pequenas.

Associações comerciais do setor de bebidas afirmaram que o novo método de tributação pode permitir que concorrentes menores mascarem os números de produção para pagar menos impostos, oferecendo assim preços inferiores aos das concorrentes maiores.

Em agosto, a Associação Brasileira das Indústrias de Refrigerantes e de Bebidas Não Alcoólicas (Abir), a Associação Brasileira de Bebidas (Abrabe), a Associação Brasileira da Indústria da Cerveja (CervBrasil) e o Instituto Brasileiro de Ética Concorrencial (Etco) disseram ao secretário da Receita Federal, Jorge Rachid, em carta, que estavam preocupados com a substituição dos sistemas de monitoramento.

Ambev, Heineken e Coca-Cola não quiseram comentar o assunto. Os diversos telefonemas e e-mails enviados à Receita Federal não tiveram retorno. A agência não deu nenhum indicativo de que reverterá ou adiará sua decisão.

Há evidências de que o Sicobe, como o sistema tributário atual é conhecido, ajudou a evitar que as empresas driblassem impostos. A coleta de impostos aumentou em 20 por cento após a introdução do sistema, segundo estudo da Fundação Getúlio Vargas encomendado pelas associações de bebidas.

O Sicobe utiliza máquinas para medir os volumes de bebidas produzidos e rastreia os produtos finais por códigos de barras. Com isso fica mais difícil as empresas mascararem os números.

“Antes do Sicobe, o segmento de bebidas era conhecido pela alta taxa de evasão fiscal”, disse Alexandre Gleria, sócio especializado em Direito Tributário do escritório ASBZ Advogados, em São Paulo. “Esse tema precisa ser discutido sob o aspecto fiscal, mas também sob o aspecto concorrencial.”

O ASBZ tem fabricantes de bebidas e de produtos químicos entre seus clientes. Gleria preferiu não identificá-los, afirmando que seus comentários não fazem referência a uma empresa específica.

Fonte: Exame.com (13/10/2016)

 

Mobilização para o combate do crime fiscal

O Povo (CE) – 21/11/2011

Por Roberto Abdenur

O crime de sonegação fiscal é um mal que afeta nosso país em várias esferas. Mas boas iniciativas de combate a essa prática nociva vêm sendo implantadas por órgãos governamentais federais e estaduais.

Somente no Ceará, segundo dados do Ministério Público e da Secretaria da Fazenda do Ceará (Sefaz), cerca de R$ 183 milhões que deveriam estar nos cofres públicos até o mês de outubro deste ano se perderam por conta da sonegação. Esse valor se baseia em sua maioria em desvios do ICMS (Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços) e das multas aplicadas a mais de 400 empresas nos segmentos de comércio atacadista, varejista, indústrias, serviços de alimentação e alojamento, serviço de transporte e setor agropecuário.

Por este motivo, as Secretarias Estaduais da Fazenda têm criado diversas ferramentas para conter a sonegação e promover maior controle na aplicação das leis tributárias. Entre elas, está o Sistema de Controle de Produção de Bebidas (Sicobe). Apesar do setor de bebidas já ser um dos maiores pagadores de impostos de tributos federais, ainda há produtores que buscam vencer a concorrência por meio da violação da lei fiscal.

Dispositivo avançado para efeitos de arrecadação de tributos, o Sicobe fornece informações de produção e identificação do que é fabricado, garantindo o controle da quantidade produzida e dos tipos de bebidas, marcas e embalagens. O órgão atua de duas maneiras: Nas fábricas, realiza a fiscalização eletrônica das mercadorias. Após a saída dos produtos, faz o rastreamento deles durante a circulação e a apresentação nos pontos de vendas. Com o mecanismo e as informações fornecidas, a Receita Federal pode cruzar os dados de volumes da produção e as marcas de cervejas, refrigerantes e águas, relacionando com o valor agregado da bebida, os tributos e o recolhimento pelos cofres federais.

A implantação do Sicobe, desde 2008, tornou-se obrigatória e um dos principais instrumentos para combate à sonegação fiscal. Sua instalação e manutenção pela Casa da Moeda têm um custo de R$ 0,03 por unidade de produto medido, valor que pode ser abatido com o pagamento do IPI, PIS e Cofins. Com o sistema, todos são beneficiados. O governo, que disponibilizará de mais verbas para melhorias sociais; as empresas, que terão concorrências equilibradas; e o consumidor, que terá produtos de qualidade acompanhados desde sua fabricação até os pontos de venda.

Roberto Abdenur é presidente do ETCO

Cruzada contra a sonegação nos Estados

A entrega dos códigos-fontes e da documentação técnica do Sistema BI NF-e – ou Sistema de Inteligência de Negócios com base em Notas Fiscais Eletrônicas – para 14 Secretarias de Fazenda foi apenas o início de um trabalho que tem como principal meta a efetiva implantação do sistema em todos os Estados do País. Desde o início de agosto, uma comitiva do ETCO tem visitado Secretarias Estaduais da Fazenda com o objetivo de estabelecer parcerias e mobilizar os Estados para a adoção não só do BI NF-e, mas também de outras ferramentas de controle como o Sicobe – dirigido à indústria de refrigerantes – e o Scorpios – destinado à indústria de cigarros.

No dia 11 de agosto, o secretário da Fazenda do Pará, José Tostes Neto; o secretário adjunto de Receitas, Nilo Rendeiro de Noronha e a coordenadora da Escola Fazendária, Maria de Nazaré Arruda receberam o presidente executivo do ETCO Roberto Abdenur e Everardo Maciel, membro do Conselho Consultivo. O encontro teve como pauta principal o desenvolvimento de ações voltadas ao combate dos ilícitos de natureza tributária e a oferta gratuita ao Estado do BI da NF-e.

Na ocasião, Tostes Neto afirmou: “identificamos um grande potencial de trabalho na ferramenta oferecida. O Governo do Estado e ETCO vão firmar um convênio de cooperação e o mais rápido possível o software deve ser agregado ao sistema de informática da secretaria”.

No dia 15, foi a vez do secretário da Fazenda de São Paulo, Andrea Calabi, receber a visita de Abdenur. O secretário disse que o Estado já possui ferramenta semelhante ao BI, mas mostrou-se interessado em compará-las.

Ainda em agosto, no dia 17, o presidente do ETCO e Everardo Maciel foram ao Paraná, acompanhados de Paulo Ayres e Antonio Totaro Neto, representando duas câmaras setoriais do Instituto. Os quatro foram recebidos pelo secretário da Fazenda Luiz Carlos Hauly, em reunião na qual foram discutidas possíveis parcerias no desenvolvimento de ações voltadas ao combate à sonegação fiscal no Estado, entre elas a implantação do BI NF-e, sistema de combate aplicado à Nota Fiscal Eletrônica, entregue gratuitamente pelo ETCO ao Estado, durante evento realizado em abril no Espírito Santo.

Na última visita, realizada no dia 6 de setembro, Roberto Abdenur foi a Belo Horizonte acompanhado de Cesar Guimarães e Amaury de Azevedo, representando duas câmaras setoriais do Instituto. Os três foram recebidos pelo Secretário da Fazenda Leonardo Colombini, pelo Subsecretário da Receita Estadual Gilberto Silva Ramos e assessores. Os representantes do ETCO puderam expor as alternativas e ferramentas que podem ser adotadas pelo Estado para conter a sonegação e ampliar o controle sobre a aplicação das leis tributárias.

Sicobe

“No último dia 05 de outubro, a Procuradoria Geral da Fazenda Nacional (PGFN) obteve do Tribunal Regional Federal (TRF) da 4º região, em Porto Alegre, a suspensão da liminar que assegurava à Associação dos Fabricantes de Refrigerantes do Brasil (AFREBRAS) o não pagamento do custo de operação do Sicobe – R$ 0,03 por unidade de produto medido.

A decisão fará com que mais de 130 empresas do setor se adéquem à fiscalização da Receita Federal e argumenta que a manutenção da liminar “implica ausência da fiscalização da produção de bebidas para os estabelecimentos associados à AFREBRAS, proporcionando uma perda de arrecadação da ordem de, pelo menos, R$ 300 milhões de tributos anuais”.

O Sicobe, que permite à Receita Federal o acompanhamento, em tempo real, de cada bebida (cerveja e refrigerante) é um dos principais instrumentos do governo para combater a sonegação fiscal e a instalação nas fábricas do setor tornou-se obrigatória em 2008. Sua implementação e manutenção pela Casa da Moeda têm um custo – estipulado em R$ 0,03 por unidade de produto medido – que deve ser ressarcido a ela. Porém esse valor pode ser abatido posteriormente quando as empresas pagam o IPI, PIS e COFINS.

Dessa forma, o TRF da 4º região avaliou que manter a liminar que permitia a AFREBRAS não arcar com esse ressarcimento à Casa da Moeda poderia inviabilizar a fiscalização tributária nessas indústrias e suspendeu sua validade. “