REVISTA ETCO – EDIÇÃO 24
DEZEMBRO, 2019
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“Direito compreensível, estável e previsível”

Professor titular de Direito Tributário da USP, Humberto Ávila explicou as três condições essenciais para a segurança jurídica

Por ETCO
21/10/2019

O professor titular de Direito Tributário da Universidade de São Paulo Humberto Ávila é um dos maiores estudiosos brasileiros do tema da segurança tributária. Com uma trajetória acadêmica que inclui doutorado e pós-doutorado na Alemanha e pós-doutorado em Harvard, nos Estados Unidos, ele é o autor do livro Teoria da Segurança Jurídica, com 744 páginas, um “verdadeiro tratado sobre o tema”, nas palavras do presidente do Conselho Consultivo do ETCO, Everardo Maciel.

Em palestra no seminário Tributação e Segurança Jurídica, Ávila tratou de três aspectos que considera essenciais para a segurança jurídica tributária. “Só existe segurança quando o direito for compreensível, estável e previsível”, afirmou, atribuindo a esses fatores relação com o tempo.

A compreensão diz respeito ao presente: “O direito para ser seguido precisa ser no mínimo bem compreendido”.

A estabilidade, com a passagem do passado para o presente. “O contribuinte que confia no direito ontem não pode ser traído pelo próprio direito hoje. Por essa razão o direito protege o direito adquirido, o ato jurídico perfeito, a coisa julgada, a proteção da confiança, as situações consolidadas, as preclusões, prescrições e decadências”, exemplificou.

Já a previsibilidade se refere à transição do presente para o futuro. “O contribuinte, quando age, precisa prever minimamente quais são as consequências que recairão no futuro sobre os atos que praticar no presente”, disse.

Didatismo dos tribunais

Em seguida, apontou os principais problemas que existem hoje no Brasil nessas três dimensões. Ele criticou a prática, comum no País, de não se buscar o significado preciso das palavras e assim dar margem a possibilidades muito elásticas de interpretação. “Não há país no mundo que seja desenvolvido e no qual as palavras não tenham significado”, alertou.

Citando decisão recente da Suprema Corte dos Estados Unidos, que orientou os tribunais daquele país a declarar nulas as leis mal formuladas pelo Congresso em vez de tentar corrigi-las, argumentou que boa parte dos problemas de insegurança jurídica verificados hoje no Brasil se deve à falta de determinação do Judiciário em exigir mais qualidade nas decisões do Legislativo.

“Sabem por que no Brasil a legislação é ruim? Porque o Supremo Tribunal Federal não declara a inconstitucionalidade das leis por serem ruins”, afirmou. “Nós temos que recuperar o papel didático dos tribunais e começar a declarar a inconstitucionalidade de normas que sejam contraditórias, que sejam vagas demais, ambíguas demais. Porque o contribuinte tem que se pautar ou pautar a sua conduta com base em algum direcionamento.”

Ávila condenou a prática dos entes federados de instituir ou aumentar impostos por meio de regulamentos, e não de leis, como exige a Constituição. Criticou também mudanças de orientação na jurisprudência que produzem efeitos retroativos, violando direitos dos contribuintes.

Ao final da palestra, em conversa com Everardo Maciel, chamou a atenção para o risco que o País corre com a instituição da modulação dos efeitos de decisões judiciais para proteger as finanças do Estado. Segundo Ávila, esse instrumento estimula o desrespeito à Constituição por parte do Estado, que acaba se beneficiando financeiramente de leis inconstitucionais. “O direito produz muitos efeitos, um deles é definir o que é certo e o que é errado. Agora, se o certo for igual ao errado, eu fico pensando que tipo de cidadania vai haver no Brasil e que tipo de exercício de poder público vai haver no Brasil”, ponderou.

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