Cerco aos fraudadores

Por ETCO


O Estado de S. Paulo, 18/04/2005


A presteza com que as autoridades paulistas agiram no sentido de criar um instrumento legal eficaz para coibir a venda de combustível adulterado no Estado de São Paulo renova as esperanças, que estavam perdidas, de que o combate a essa prática lesiva aos consumidores, aos empresários honestos e ao Erário irá, finalmente, produzir resultados importantes.


Até agora, mesmo quando, em operações especialmente planejadas, como as realizadas pelo governo do Estado, se constatava que alguns estabelecimentos agiam de maneira ilegal, não havia punição na prática. A interdição temporária do estabelecimento determinada pelos fiscais não era cumprida, pois bastava a equipe de fiscalização se dirigir a outro estabelecimento para que tudo voltasse a funcionar como antes.


Menos de quatro meses depois de ter enviado a proposta para a Assembléia Legislativa, o governador Geraldo Alckmin sancionou, na terça-feira, o projeto de lei que autoriza a cassação da inscrição no cadastro dos contribuintes do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) do estabelecimento que adquirir, distribuir, transportar, estocar ou revender derivados de petróleo, gás natural, álcool e outros combustíveis adulterados.


Há meses, o governo paulista, por meio de ações conjuntas realizadas pelas Secretarias da Fazenda e da Segurança Pública, vem fiscalizando postos de gasolina em diferentes pontos do Estado de São Paulo, que responde por cerca de 40% do consumo nacional de combustíveis. Mais da metade dos estabelecimentos fiscalizados apresentou algum tipo de irregularidade. A principal foi a mistura à gasolina de álcool em nível superior ao permitido e de solventes. Em algumas amostras recolhidas durante essas operações e analisadas pelo Instituto de Pesquisas Tecnológicas (IPT), a gasolina representava apenas 30% do volume.


Ao abastecer seu veículo, o consumidor não tem condições de saber se está comprando combustível adulterado ou não. Na maior parte dos casos, nem perceberá que foi ludibriado. Mas arcará com prejuízo certo. O veículo renderá menos – com a mesma quantidade de combustível, percorrerá uma distância menor – e o motor será danificado. Sistema injetor, velas e válvulas são os pontos mais afetados. A extensão do dano dependerá da freqüência com que abastecer o veículo com combustível adulterado.


Comerciantes honestos também perdem nessa guerra suja. Recolhem todos os impostos devidos (do preço final da gasolina, 60% correspondem a tributos), obtêm uma margem pequena por litro vendido e não têm como concorrer com os comerciantes desonestos. O custo do solvente é menor do que o da gasolina e, além disso, é menos tributado. Desse modo, os fraudadores podem vender por um preço inferior ao praticado pelo concorrente honesto, e com margem de lucro maior.


Perde também o governo. Calcula-se que as fraudes – além da adulteração do combustível, há também a sonegação de impostos, às vezes com a conivência e cooperação de membros do Judiciário – causem perdas anuais de R$ 5 bilhões de arrecadação tributária no País. Em São Paulo, a Secretaria da Fazenda calcula as perdas em R$ 500 milhões por ano.


A tarefa de fiscalizar os postos e a qualidade do produto que vendem é da Agência Nacional de Petróleo (ANP). Mas este órgão dispõe de apenas 51 fiscais para controlar 428 bases de distribuição e cerca de 30 mil postos de combustíveis em todo o País. A possibilidade de um estabelecimento que opere em condições irregulares ser apanhado por essa fiscalização é praticamente nula.


Agora, com a lei sancionada pelo governador Alckmin, e que começará a ser aplicada assim que a Secretaria da Fazenda baixar uma portaria específica, a situação se modifica. Qualquer empresa de distribuição, transporte ou venda que lide com combustível adulterado não poderá voltar a funcionar. E seu proprietário não poderá atuar por cinco anos no ramo nem entrar com pedido de inscrição de nova empresa para desenvolver a mesma atividade.


Dois outros projetos que tratam desse assunto foram enviados pelo governador Alckmin à Assembléia Legislativa. Um deles determina o confisco do combustível irregular, que será depois reprocessado para utilização pela polícia, e outro coíbe o uso irregular de solventes. Seguramente contribuirão para moralizar o mercado de combustíveis em São Paulo.