Editoriais: Estado empresarial

Por ETCO

Fonte: Folha de S. Paulo – São Paulo/SP – 08/03/2010

O PATRIMÔNIO dos fundos de pensão fechados no Brasil cresceu rapidamente nos últimos anos e atingiu quase R$ 500 bilhões em fins de 2009. Há, além disso, uma forte concentração dos recursos em fundos patrocinados por empresas estatais -os três maiores do país (Previ, Funcef e Petros) detinham em novembro de 2009 um patrimônio de R$ 219 bilhões, equivalente a 45% do total do setor.



É por meio deles -e do BNDES- que o governo vem aumentando sua influência nos principais setores da economia.



Não há dúvida do papel relevante dos fundos de pensão e do BNDES como provedores de capital de longo prazo, tão essencial ao desenvolvimento. Eles podem e devem participar de projetos de infraestrutura e manter investimentos em empresas importantes.



Essa atuação, todavia, tende a ser nociva ao país caso não esteja assentada em supervisão independente e em sólidos critérios de gestão financeira. Infelizmente estas condições não se acham asseguradas.



Os fundos de pensão patrocinados por empresas públicas estão sendo metamorfoseados em instrumentos de poder político, a serviço do governo de plantão e da burocracia sindical que hoje domina as representações de empregados e empregadores. Aí não se trata de um problema de regulação. As regras são -como tantas no Brasil- bem feitas.



O problema é o enfraquecimento dos freios e contrapesos institucionais que estão na base de uma fiscalização eficaz. Com isso, abre-se caminho para a fusão de interesses entre governo, sindicatos, fundos de pensão e empresários favoritos, que, se perenizada, pode vir a representar até uma ameaça ao bom funcionamento da democracia.
O destino de bilhões de reais sob critérios obscuros é apenas uma das faces do problema. Além das questões de natureza política e institucional, é preciso considerar ainda os riscos financeiros incorridos pelo Estado -ou seja, pelo contribuinte- em operações bilionárias.



O reforço da atuação do BNDES em 2009, possibilitado pela capitalização de R$ 100 bilhões feita pelo Tesouro, é um exemplo. A capitalização tem como contrapartida o endividamento público no mesmo montante. Ou seja, o governo federal se endivida para, em seguida, fazer aportes em empresas, junto com os fundos de pensão.
A história do capitalismo brasileiro é marcada pela forte presença estatal, cujo auge, em parceria com o capital privado nacional e estrangeiro, aconteceu no período do presidente Ernesto Geisel (1974-1979), às vezes enaltecido por Lula. Mas os descaminhos da década de 1980, que tanto custaram ao país, são em parte consequência do modelo intervencionista anterior.



Inebriado por sua voracidade empresarial, o governo não parece preocupado com os riscos de eventuais prejuízos -afinal a economia cresce e todos os projetos seriam rentáveis e muito sólidos “desta vez”. Se o passado é um bom guia, há motivos de sobra para preocupação.