Editorial – Remédios falsos: crime sem perdão

Por ETCO

Fonte: Jornal do Brasil, 16/04/2009

Parece que o governo enfim descobriu que a integração dos órgãos públicos, somada à fiscalização e à repressão planejadas, representa o melhor antídoto para combater um mercado criminoso e nocivo à saúde da população. Só nos primeiros três meses do ano, foram apreendidas 170 toneladas de medicamentos clandestinos, quase mil por cento a mais do que todo o volume confiscado no ano passado. As investigações chegaram a uma alarmante conclusão: o comércio de remédios foi inundado por um verdadeiro derrame de produtos falsificados, sem registro ou contrabandeados. Tornou-se, assim, um imenso problema de saúde pública.

O mais grave, conforme ressaltou a reportagem publicada ontem pelo Jornal do Brasil, é que a pirataria deixou de ser uma atividade do pequeno contrabandista para invadir as farmácias legalmente estabelecidas, especialmente na periferia de metrópoles como Rio e São Paulo, além das cidades do interior, onde os controles são precários. Dados oficiais do Ministério da Justiça e da Agência de Vigilância Sanitária (Anvisa) mostram que, entre as 85 farmácias fiscalizadas no primeiro trimestre deste ano, 39 foram interditadas e seus proprietários presos por comércio ilegal.

A Polícia Federal informa que o volume de remédios falsos apreendido nesse primeiro trimestre equivale a mais de R$ 1 bilhão. O rombo, contudo, não para por aí, pois se soma aos prejuízos causados à indústria legalmente estabelecida. No ano passado, por exemplo, apenas para garantir a segurança de seus produtos e driblar a pirataria, o laboratório Lilly – detentor de uma marca indicada para problemas de ereção, bastante copiada e revendida ilegalmente – investiu R$ 2 bilhões. Embora não haja estimativa sobre as perdas provocadas pelas falsificações no setor farmacêutico, projeções apontam para cifras superiores a R$ 10 bilhões.

Das 170 toneladas de remédios apreendidas entre janeiro e março, 90% estavam nas gôndolas sem registro de origem e notas fiscais – o que significa, segundo as autoridades, que são oriundas do roubo de cargas de medicamentos operado pelo tráfico, composto por quadrilhas especializadas. Outros 5% foram produzidos em países da Ásia e chegaram ao Brasil pela Colômbia, Bolívia e Paraguai. Os 5% restantes simplesmente foram falsificados, ou seja, não produzem qualquer efeito contra as enfermidades. Especificamente no Rio, o comércio de medicamentos ilegais é operado por redes de farmácias de bairro, cujos nomes são mantidos em sigilo pelos investigadores.

O que se conclui é que os brasileiros estão sendo ludibriados, envenenados e mortos por causa da pirataria. Embora tardiamente, o governo parece ter despertado para a dimensão epidêmica do problema. Essa foi a primeira vez que órgãos públicos da União (como Polícia Federal, Anvisa e secretaria executiva do Ministério da Justiça) trabalharam conjuntamente para fazer um pente-fino no mercado clandestino de remédios. O cidadão espera que seja a inauguração de um novo marco na fiscalização do setor. E que os responsáveis por este crime de lesa-humanidade tenham o merecido julgamento e condenação.