Entrevista do mês: Emerson Kapaz

Por ETCO

Fonte: Ceatsp.org.br, março de 2005

P: O Ceat e o CBT são ONGs vinculadas à Diocese de São Paulo e promovem a (re) qualificação e a reinserção do trabalhador no mercado do trabalho. Procuramos dar um atendimento integral àqueles que nos procuram, que são os que estão à margem do processo produtivo; oferecemos cursos de qualificação, apoio psicológico e espiritual. Colocamos à disposição das empresas um banco de vagas e fazemos uma pré-seleção cruzando o perfil do trabalhador com o tipo de profissional que a empresa necessita. D. Cláudio, conhecido internacionalmente como o Cardeal dos trabalhadores, sente-se comprometido com essa causa e o Ceat e o CBT refletem essa preocupação. Como o senhor vê esse tipo de iniciativa e no que ela pode contribuir efetivamente para a situação dos trabalhadores e para o processo de produção do País?


R: Acho essa iniciativa muito importante e relevante. Esse tipo de trabalhador que vocês atendem, está fora do sistema produtivo. Ele tem maior dificuldade de inserção no mercado de trabalho; às vezes, não tem a mínima chance. Esse trabalhador precisa de uma brecha para entrar e é muito difícil encontrá-la. Por isso acho o trabalho de vocês tão importante: vocês representam para ele essa brecha por onde ele vai poder se inserir no mercado de trabalho.


P: O Pensamento Nacional das Bases Empresariais (PNBE), criado em 1987, representou uma transformação tanto no âmbito empresarial, quanto no impacto positivo que teve sobre a opinião pública. Quais as mudanças que ele trouxe na época e hoje, qual a contribuição efetiva do PNBE para a sociedade, em especial para empresários e para trabalhadores?


R: Nossa proposta era mudar a filosofia do pensamento empresarial e também a visão que o público tinha do setor empresarial. Queríamos mostrar que enfrentávamos dificuldades e, já naquela época, falávamos em responsabilidade social. Fomos os pioneiros nisso, questionando a Fiesp e enfrentando resistência de alguns empresários. Eu costumava brincar e dizer que, quando houvesse uma mudança na mentalidade empresarial, nós desapareceríamos. Nós não desaparecemos, mas esse aspecto deixou de ter uma relevância tão grande, porque estava à frente da sua época e hoje foi, de certa forma, incorporado pela sociedade. Atualmente o PNBE existe com propostas diferentes.


P: O senhor vem batendo fortemente na questão dos impostos e dos entraves burocráticos. O que isso representa em termos de obstáculo para o crescimento econômico brasileiro e para a geração de trabalho e renda?


R: Isso é crucial. Estamos vivendo um processo de concorrência desleal entre as empresas éticas, que pagam seus impostos e têm práticas coerentes, e as que não têm essa mentalidade e ganham um diferencial de 30% ou 40%, sonegando impostos, para competir. Há mais vantagens para quem está fora do sistema formal do que para quem está dentro, uma dicotomia entre a economia formal e a informal. Mas o sistema tributário precisa sofrer alterações, as cargas devem diminuir para que aqueles que estão hoje na informalidade, possam entrar na formalidade. A informalidade não tem retorno social para o empregado, mas ele também prefere ser informal, porque não vê retorno social no que é descontado do seu salário. A porta de entrada para a informalidade é não registrar funcionários, é ir por fora do sistema formal, ter caixa dois…


É importante dizer que há um Estado Pirata, que está lá para atender esse mercado ilegal. Há políticos e juízes que trabalham à margem do sistema legal, fiscais que complementam renda às custas da sonegação e da corrupção. Mas também nós, como sociedade, precisamos estar conscientes e cobrar uma nova postura do governo. E, em nosso cotidiano, estarmos atentos: cada compra pirateada é uma contribuição à permanência desse estado de coisas. Existe, de um lado, um bombardeio de propaganda e, de outro, o consumidor, que não tem como arcar com os custos desse consumo. Para ele é mais viável comprar produtos pirateados, mesmo que nem sempre tenha consciência de que contribui para esse Estado Pirata.


R: Nesse contexto, qual a saída para as pequenas empresas?


R: A proposta é criar um mecanismo de transição. O Simples acaba sendo um empecilho para crescer. A pequena empresa passa pela ?Síndrome de Peter Pan?, porque, se crescer, está condenada. Na minha opinião, é preciso criar um ?supersimples?, uma única tributação para impostos municipais, estaduais e federais, diminuir e simplificar a tributação hoje. A carga nos produtos e nos serviços inescapáveis aumentou: energia elétrica, telefone, gás, produtos essenciais, combustíveis etc. O governo está tirando sua sobrevivência disso e causando um ciclo vicioso.


P: O que o senhor pensa da Reforma Sindical?


R: Concordo com você que ela deve vir acompanhada de uma Reforma Tributária. Ela vai ajudar na negociação direta e numa melhor relação capital-trabalho.


A flexibilização vai assegurar direitos e fortalecer as negociações, é claro, com garantias mínimas numa CLT renovada e arejada. O trabalhador dentro da empresa sabe melhor da sua empresa do que um sindicato que está do lado de fora. O imposto sindical patronal ou de trabalhadores sustenta estruturas arcaicas.


P: Como nasceu o Instituto Brasileiro de Ética Profissional (ETCO)?


R: Pela iniciativa de empresas de quatro setores: cerveja, combustível, refrigerante e fumo. No final de 2002 criaram OSCIP e me chamaram para presidir. A ETCO atua, prioritariamente, na busca de soluções para três graves problemas da economia:


O primeiro é a crescente sonegação de impostos, em parte resultante da elevada carga tributária brasileira (36,4 % do produto interno bruto), superior à de países como os Estados Unidos, Inglaterra, Canadá e, inclusive a Suíça, todos com renda per capita muito superior à brasileira.


Os outros dois são o comércio ilegal de produtos e a adulteração de marcas.


P: Na sua opinião, quais são os elementos necessários para aliar a concorrência à ética?


R: É desenvolver uma mentalidade de que não é possível ter concorrência sem ética. Não se pode falar em concorrência saudável sem ética. Por isso os objetivos da ETCOS são: Identificar e diagnosticar os fatores causadores da concorrência desleal no mercado;
informar e sensibilizar a opinião pública sobre as conseqüências da concorrência desleal;
mobilizar e apoiar os poderes constituídos e as entidades privadas para combater a concorrência desleal;
propor instrumentos legais adicionais para coibir a difusão de práticas de concorrência desleal.


R : O que é preciso fazer para superar as dificuldades para a abertura e especialmente para a manutenção de novas empresas?


R: Para resolver a questão temos trabalhar na burocracia ? unificar as juntas comerciais do Brasil, unificar CPFs, ter apenas uma Inscrição Estadual, Municipal e Federal. Por trás da burocracia, há a mentalidade de criar dificuldade para vender facilidade. Temos que chegar a um sistema mais paritário com relação ao resto do mundo. O governo tem que acreditar na boa-fé de quem está abrindo uma empresa, de quem está preocupado em contribuir com o País e pôr na cadeia quem vier com malandragem. Não se pode partir do pressuposto contrário.