Exportando impostos

Por ETCO

Autor: Clóvis Panzarini

Fonte: O Estado de S. Paulo – 06/04/2010

A Confederação Nacional da Indústria (CNI), em estudo recente sobre comércio exterior, mostrou que o acúmulo de créditos tributários, isto é, dos impostos que incidem indevidamente nas exportações e não são devolvidos pelos governos estaduais e federal, afeta a decisão de exportar de 44,3% das empresas exportadoras brasileiras. No caso das empresas predominantemente exportadoras, aquelas cujas vendas ao exterior respondem por mais de 50% do faturamento, o problema da acumulação de créditos diminui em 54,6% o seu ímpeto exportador. Esses saldos credores das exportadoras relativos a tributos do tipo valor agregado, como IPI, PIS, Cofins, federais e, principalmente, o ICMS, de competência estadual, ocorrem sempre que os créditos dos impostos que incidem sobre as matérias-primas utilizadas no processo de fabricação do bem exportado alcançam valor maior do que os débitos relativos às saídas internas, pois as exportações são imunes. A empresa fica, então, credora da União ou dos Estados, que, quando não honram tais dívidas, passam a ser “inadimplentes”. Estima-se que o passivo do governo federal e dos governos estaduais com as exportadoras ultrapassa R$ 35 bilhões.

É interessante observar a assimetria entre o tratamento dado à inadimplência do contribuinte e à do Fisco. No primeiro caso, o contribuinte, quando não recolhe o imposto no prazo regulamentar, sofre multa e juros moratórios, além de, em tese, poder ser denunciado por crime contra a ordem tributária. Quanto à “inadimplência” do Fisco, nem sequer há prazo para o pagamento do débito. No caso do ICMS, a Constituição determina que ele não incida “sobre operações que destinem mercadorias para o exterior (…), assegurados a manutenção e o aproveitamento do montante do imposto cobrado nas operações e prestações anteriores”. Garante, pois, não só imunidade na exportação, mas também a devolução ao exportador de qualquer montante de ICMS cobrado ao longo da cadeia produtiva do bem exportado. Esse é um direito incondicionado, mas os Estados, como regra, procuram dificultar seu gozo, frustrando a exoneração plena das exportações. Cria-se, então, um viés tributário contra as vendas ao exterior, pois, quanto maior a sua participação no faturamento da empresa, maior o represamento de créditos.

O fato é que, dada a inexistência de prazo para os governos honrarem essa dívida, eles podem confortavelmente melhorar seu fluxo de caixa com o capital de giro dos exportadores e isso compromete a competitividade da indústria brasileira no mercado internacional, uma vez que empresas de outros países que concorrem com as brasileiras não têm esse tipo de problema.

Países com sistema tributário moderno não exportam impostos! Os exportadores têm comemorado propostas de reforma tributária que preveem a adoção do princípio de destino do ICMS nas operações interestaduais, o que, supostamente, mitigaria o problema de crédito acumulado nas exportações, pois as vendas interestaduais que as antecedem não seriam tributadas. Essa, entretanto, é uma visão parcial e falsa do problema. Há apenas duas formas para implementar o princípio de destino nas operações interestaduais: a mais óbvia, a adoção da alíquota zero na saída interestadual ou, então, a adoção da alíquota “cheia” (interna) na origem e repasse da receita ao Estado de destino da mercadoria. No primeiro caso (adoção da alíquota zero na origem) a venda interestadual teria, no processo de acumulação de crédito, efeito idêntico ao de uma exportação. No segundo caso (adoção da alíquota “cheia” na origem) os créditos interestaduais, hoje balizados pelas alíquotas de 7% e 12%, passariam a sê-lo pela alíquota de 18%. O problema seria agravado e não mitigado!

O fato é que impostos do tipo valor agregado são inadequados para figurar na competência subnacional, mas no caso do ICMS esse é um fato político consumado.

Economista, ex-coordenador tributário da secretaria da fazenda paulista. É sócio-diretor da Cp Consultores Associados Ltda. site: WWW.CPCONSULTORES.COM.BR