Leia aqui o artigo do presidente do ETCO, publicado no Jornal do Brasil

Por ETCO
03/12/2018

As origens da violência no Brasil

por Edson Vismona

A questão da violência é hoje tema central do debate público no Brasil e certamente estará presente na campanha eleitoral deste ano. Uma pesquisa realizada no final de 2017 pela consultoria organizacional Crescimentum, em parceria com o Instituto Datafolha, revela que de um universo de 2.422 entrevistados, 1.504 apontaram a violência como principal fator de preocupação em nosso país. Apenas a corrupção obteve mais indicações (1.754) e vale salientar que os dois fatores estão interligados.

De fato, a violência tem aumentado nos últimos anos, os números não mentem. Atualmente, o Brasil tem a nona maior taxa de homicídios do mundo, com 30,5 casos para cada 100 mil pessoas, segundo dados da Organização Mundial da Saúde (OMS). De acordo com o estudo da entidade, das 50 cidades mais violentas do mundo, 25 estão no Brasil, sendo que 9 são capitais, logo não são apenas áreas isoladas e mais pobres, sem acesso ao desenvolvimento econômico e social.

Uma grande parte dos homicídios registrados no país ocorre em torno do tráfico de drogas, há muito comandado por sofisticadas organizações integrantes do chamado crime organizado, que cresce baseado no mercado ilegal não apenas de substâncias entorpecentes proibidas, mas também de produtos piratas, falsificados ou contrabandeados de países vizinhos.

Em 2014 foi instituído o Movimento em Defesa do Mercado Legal Brasileiro, coordenado pelo Fórum Nacional Contra a Pirataria e Ilegalidade (FNCP) e pelo ETCO – Instituto Brasileiro de Ética Concorrencial. Este movimento foi apoiado por mais de 70 entidades representativas dos setores industriais e comerciais de todo Brasil.

Considerando apenas o cigarro, produto mais contrabandeado, os números impressionam. A Receita Federal de Foz do Iguaçu apresentou balanço das apreensões de mercadorias e veículos realizadas em 2017, que somaram cerca de R$ 260 milhões (só naquela região ). Este valor é 19% maior que o registrado no ano anterior. O cigarro lidera o ranking da ilegalidade, correspondendo a 38% das mercadorias apreendidas no ano passado. No total foram apreendidos 20 milhões de maços de cigarro, o que corresponde a cerca de R$ 100 milhões e estima-se que o mercado ilegal de cigarros movimentou mais de R$ 6 bilhões em 2016.

Esses recursos servem para financiar as organizações criminosas. O tráfico de drogas face mais conhecida e temida das facções se entrelaça com o contrabando, pirataria, falsificação, tráfico de armas e munição e alimenta a corrupção e o trabalho escravo, gerando lucros e poder. Nos últimos quatro anos, este fenômeno assumiu uma dimensão nunca antes vista. Os fatos alarmantes que ocorreram no Rio de Janeiro, Fortaleza, Natal, nas fronteiras, especialmente com o Paraguai, e nos presídios demonstram que é urgente articular uma contraofensiva do Estado para deter esta verdadeira onda financiadora da violência no Brasil.

Como bem afirmou o ministro da Defesa, Raul Jungmann, “o sistema de segurança brasileiro faliu”. O poder público não pode continuar a agir como se esse fenômeno fosse algo isolado e repetindo antigas práticas. Iniciativas sistêmicas e sistemáticas desde as fronteiras até as cidades, passando pelas rodovias com ações coordenadas utilizando informação, inteligência e a tecnologia; aprofundar a ocupação das áreas dominadas pelo crime com ações sociais e educacionais que devem ser tratadas como prioridade e não como um paliativo retórico. Não é aceitável que o poder público ignore uma das maiores preocupações dos brasileiros.

Neste ano de novas eleições gerais é preciso que o tema esteja na agenda de todos os candidatos e que sejam discutidas propostas factíveis para avançar na solução do problema.

Não se constrói uma nação em um clima de terra de ninguém, onde princípios e valores são esquecidos e o autoritarismo seja lembrado como uma possível saída. É preciso rapidamente colocar em prática uma política consistente para enfrentar com coragem este problema. No século 19, o naturalista francês Saint-Hilaire cunhou no livro “Viagem à Província de São Paulo” uma frase que se tomaria famosa e causaria muita polêmica: “Ou o Brasil acaba com a saúva , ou a saúva acaba com o Brasil”. Hoje, podemos dizer sem medo de errar que a violência está corroendo o Brasil, como a saúva, causando medo e perplexidade em todos. É uma pauta urgente e que requer firmeza de propósitos e coragem na execução.

O Brasil é maior, somos obrigados a enfrentar o nosso destino com responsabilidade e determinação. O crime, a corrupção e a incompetência devem ser colocados no seu devido lugar: marginais, e nunca como algo compreensível e suportável. Nas próximas eleições devemos trabalhar para termos no exercício da política uma atividade nobre que engrandeça princípios e valores e não a esperteza, o compadrio e a torpeza. Esta deve ser a rota para alcançarmos o desenvolvimento econômico e social que tanto desejamos para o nosso país e que, com certeza, o brasileiro merece.

Edson Vismona, é advogado, presidente do ETCO e do Fórum Nacional Contra a Pirataria e ilegalidade

Artigo Publicado no Jornal do Brasil em 25/03/2018