Contrabando cresce com a recessão na Europa

Por ETCO
23/02/2012

Valor Econômico

Assim como milhões de espanhóis, Alicia García vê-se obrigada a fazer sacrifícios para enfrentar a crise de endividamento do país. A esteticista de 32 anos costumava fumar um maço por dia, mas agora reduziu para apenas cinco cigarros.

“Fumar simplesmente tornou-se caro demais”, diz García, enquanto fuma em uma rua no centro de Madri. “Tenho de pensar duas vezes antes de acender.”

Pressionados por uma recessão cada vez maior e por aumentos nos impostos sobre o consumo, os mais de 10 milhões de fumantes espanhóis tornaram-se alvos perfeitos para os contrabandistas de cigarro. As importações ilegais agora representam entre 7% e 8% das vendas totais de cigarros, sendo que há um ano eram praticamente inexistentes, segundo a associação das empresas de tabaco do país.

O número de maços de cigarro vendidos na Espanha caiu 17% no ano passado, de acordo com a Tobacco Market Comission, que acompanha apenas o comércio legítimo.

“O contrabando e a falsificação de tabaco, que estavam erradicados desde 1993, voltaram com força no ano passado”, diz Jaime Gil-Robles, diretor de assuntos empresariais da Altadis, unidade local do Imperial Tobacco Group, que domina cerca de 30% do mercado espanhol, de € 11,3 bilhões.

Em apenas uma semana de janeiro, as autoridades espanholas confiscaram mais de 1 milhão de maços ilegais de cigarros, no valor de € 4 milhões, aproximadamente.

O problema não é exclusivo da Espanha. As autoridades francesas confiscaram 462 toneladas de produtos com tabaco contrabandeado ou falsificado em 2011 – 33% a mais do que em 2010. Grande parte disso estava destinada ao Reino Unido e Irlanda, que têm os maiores impostos sobre o consumo de tabaco da União Europeia (UE). Em Dublin, um maço de Marlboro custa € 9,10, em comparação ao preço de € 6,20 em Paris.

“Trabalho nesta área há quatro anos e o problema só faz crescer, crescer, crescer”, diz Ross Marié, que comanda a unidade encarregada de combater o comércio ilegal na British American Tobacco, fabricante das marcas Lucky Strike e Dunhill. Morgan Rees, diretor de comunicação de regulamentação da Philip Morris International, dona da marca Marlboro, estima que as vendas ilegais dominem cerca de 10% do mercado na Europa.

Embora as importações de contrabando da China tenham se estabilizado, as provenientes da Rússia e outros países do Leste Europeu estão em alta, diz Austin Rowan, chefe da unidade de tabaco e bens falsificados da Agência Europeia Antifraude (Olaf, na sigla em inglês), em Bruxelas.

“A profunda crise econômica em certos mercados, como Lituânia, Letônia, Romênia e Espanha, alimentou o problema”, afirma.

O índice de desemprego da Espanha, em 22,9%, é o maior da UE. Também leve em conta a proibição ao fumo em lugares públicos em vigor desde o início do ano e o aumento nos impostos de € 0,50 por maço e você tem a “tempestade perfeita”, diz a executiva-chefe da Imperial Tobacco, Alison Cooper. As multidões de espanhóis fumando do lado de fora de bares e restaurantes são um mercado de fácil alcance para os vendedores ambulantes de cigarros contrabandeados, diz Marcelino Gamez, presidente da Onae, um grupo lobista que representa cerca de 2,5 mil empresas do setor de tabaco. Um maço de Marlboro, de € 4,25, pode ser comprado por volta de € 2,25 nomercado paralelo.

Não são apenas os fabricantes de cigarros que perdem. O comércio ilícito de tabaco custa aos governos europeus cerca de US$ 10 bilhões em perda de arrecadação, segundo a Olaf. Na Espanha, a Altadis defendeu o congelamento por dois anos dos aumentos nos impostos sobre o tabaco, enquanto Cooper, da Imperial, tem esperanças de que o governo relaxe a proibição ao fumo.

São concessões que enfureceriam ativistas pela saúde pública, como Armando Peruga, gerente da Iniciativa Livre de Tabaco, da Organização Mundial da Saúde (OMS). Peruga destaca que a Espanha, ao lado da Itália e Irlanda, foi bem-sucedida ao usar aumentos tributários para diminuir o número de fumantes. “As empresas de tabaco querem assustar o governo com o espantalho de que, com os aumentos, perde dinheiro em impostos do tabaco”, afirma. “Isso é uma falácia. Quando se proíbe fumar em espaços públicos, o único poder que as empresas têm é reduzir os preços, [poder] que eles perdem quando o governo eleva os impostos.”