Contrabando gera prejuízo de R$ 130 bilhões ao País, mas não é combatido

Por ETCO
03/12/2018

Atividade ilegal não coibida sustenta facções como o PCC e Comando Vermelho. Tema é discutido no 12º Enecob

 

O mercado ilegal gera perdas de, em média, R$ 130 bilhões ao ano para os setores produtivos brasileiros. O enfrentamento à prática de contrabando esbarra, porém, na sensação de impunidade e na atuação policial insuficiente. Com 16 mil quilômetros de divisa com dez países para cuidar, a Polícia Federal conta com pouco mais de 10 mil agentes e 24 delegacias para controle.

Em 2016, eram 13.674 policiais em todo o País, mas o efetivo não teve reposição para as saídas nos últimos anos. “A política de fronteira no Brasil tem que ser de investimentos homogêneos”, defende o delegado Fabiano Bordignon, chefe da corporação em Foz do Iguaçu, onde acontece, desde segunda-feira (16), 12º Encontro Nacional de Editores, Colunistas, Repórteres e Blogueiros (Enecob), que debate o tema.

“As facções criminosas ultrapassam fronteiras e desafiam o Estado. O Brasil não termina na fronteira com o Paraguai, transborda para lá e vice-versa. A ideia de fronteiras estanques não existem mais. Há um potencial grande de corrupção com contrabando porque são penas e risco pequenos com lucro grande. Combater só com polícia não adianta. Tem que rever a tributação”, defende, lembrando que as baixas cargas tributárias de países vizinhos, como o Paraguai, fomentam a ilegalidade.

Os descaminhos do contrabando

Mercadorias, remédios, cigarros, armas, drogas e munições atravessam as divisas brasileiras clandestinamente por contrabando e descaminho. Segundo informações da Receita Federal e da Polícia Federal, facções como o Primeiro Comando da Capital (PCC) e o Comando Vermelho (CV) expandem a atuação cada vez mais nos países vizinhos para ter acesso aos produtos ilegais.

Edson Vismona, presidene do ETCO, no 12º ENECOB
Edson Vismona, presidente do ETCO, no 12º ENECOB

“As fronteiras estão sendo ocupadas pelo crime organizado. O PCC controla tráfico cigarros, que lhes dá grande liquidez, ainda que também façam contrabando de armas e drogas”, afirma Edson Vismona, presidente do Instituto Etco, entidade empresarial que atua no combate à sonegação e ao comércio ilegal. A estimativa é que 48% das vendas no Brasil sejam de cigarros contrabandeados e quase a totalidade com origem no Paraguai.

Desde 2014, crimes de contrabando e descaminho são diferenciados pela legislação brasileira. O primeiro consiste na importação e exportação de produtos proibidos e tem pena de dois a cinco anos de prisão. O outro trata do não pagamento de impostos pela entrada ou saída de produtos, como no caso da compra de eletrônicos em viagens internacionais, com punição máxima de quatro anos. Geralmente, os dois são praticados ao mesmo tempo.

Luciano Godoy, no 12º ENECOB
Luciano Godoy, no 12º ENECOB

Luciano Godoy, advogado e professor da Fundação Getúlio Vargas (FGV), aponta que os contrabandistas não se sentem acuados com a possibilidade de punição. “Como as penas são muito baixas, a maioria das pessoas nem chegam a cumprir em regime fechado. A maioria nem é pega. Quando é, no fim a pessoa é solta. A percepção de impunidade é muito mais grave que a impunidade em si. É preciso capacitação dos agentes públicos, recursos materiais e humanos às carreiras. É preciso criar um novo marco legal de enfrentamento ao contrabando na segurança pública”, diz.

Terra sem lei (que funcione)

Ele prossegue a análise e coloca a capacidade da Justiça em xeque. “Não há estrutura para julgar em larga escala. O Judiciário brasileiro julga casos individuais, mas quando percebo o fenômeno do contrabando de cigarros não vejo um caso de cada vez, mas uma macro criminalidade que demanda capacitação, informação e interação entre os países, setores público e privado, para conseguir combater”, compara.

O especialista ainda aponta problemas na aplicação da lei, que, na visão dele, joga a responsabilidade ao elo mais fraco da cadeia da organização criminosa: as chamadas “mulas”, que fazem o transporte do produto mas pouco lucram ou se beneficiam com o esquema.

Fernando Mendes, presidente eleito da AJUFE, durante o 12
Fernando Mendes, presidente eleito da AJUFE, durante o 12º ENECOB

Secretário Geral da Associação de Juízes Federais (Ajufe), Fernando Mendes acredita que ainda não há “ferramentas suficientes para combater a macro criminalidade”. Para ele, além do aperfeiçoamento do Marco Legal, a prestação jurisdicional precisa ser efetiva. “Precisamos de uma justiça que dê respostas em um tempo razoável do ponto de vista constitucional. Só alterar a tipificação sem pensar na atuação dos órgãos vai acabar produzindo resultados pouco efetivos. Hoje, o modelo

Vanessa Neumann, da Asymetrica
Vanessa Neumann, da Asymetrica

judicial contribui para a ineficiência do resultado”, considera.

 

Para Vanessa Neumann, fundadora da Asymmetrica, empresa de consultoria e pesquisa de risco político, é preciso ter uma atuação cooperativa para ser efetiva. “Parece ter apreensões aqui e lá. Quando se retira uma célula, ela facilmente se restitui”, aponta. Assim, ela pensa que é preciso atuar de forma mais ampliada para um cerco eficiente.

 

Fonte: Jornal de Brasíllia – 18/04
Fotos: ETCO