REVISTA ETCO – EDIÇÃO 25
AGOSTO, 2020
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É hora de enfrentar o contencioso tributário

Por que contratamos um estudo da EY (Ernst & Young) sobre a situação do contencioso tributário brasileiro e dedicamos esta edição da Revista ETCO exclusivamente ao tema

Por Edson Vismona, presidente executivo do ETCO
17/07/2020

As atenções do Brasil concentraram-se, nos últimos meses, nos temas fundamentais para o combate à maior crise de saúde enfrentada pelo mundo em mais de um século e seus profundos efeitos na economia. Quando superarmos a pior fase da pandemia, será hora de voltarmos a encarar os nossos antigos problemas. Melhorar o nosso sistema tributário, cuja disfuncionalidade constitui um raro consenso na sociedade brasileira, deve ter prioridade.

Dentro das discussões sobre reforma tributária, em nossa visão, há um tema que não vem recebendo a merecida atenção por parte dos atores políticos do País: o flagelo do contencioso tributário. Lamentavelmente, o Brasil amarga o vergonhoso posto de campeão mundial de litígios entre o Fisco e seus contribuintes.

Com o intuito de dar visibilidade ao tema e contribuir na busca de soluções, no ano passado contratamos a consultoria EY (Ernst & Young) para fazer um diagnóstico do problema. O estudo, lançado em novembro, mostrou que o contencioso cresce de maneira descontrolada e já supera o equivalente à metade do PIB brasileiro – uma proporção que não encontra paralelo em nenhum outro lugar do mundo.

Esta edição da Revista ETCO dá continuidade a esse trabalho. Além de apresentar os resultados do estudo da EY, ela traz a visão de dezenas de nomes importantes que têm envolvimento com esse problema e condições de influenciar na busca de soluções. Nomes que representam diferentes pontos de vista da questão – Fisco, contribuintes, advogados tributaristas, Judiciário e segmento acadêmico –, com análises sobre as causas do fenômeno e as medidas que defendem para prevenir os litígios tributários.

Três aspectos dessa discussão merecem atenção especial. O primeiro diz respeito ao passado, à busca de solução para o estoque de contencioso já formado. O País vem registrando alguns avanços nesse sentido – e cabe aqui um elogio ao Congresso Nacional, que em abril converteu a Medida Provisória do Contribuinte Legal, apresentada no ano passado pelo governo federal, na Lei nº 13.988/20, regulamentando algumas modalidades de transação tributária. É necessário agora estimular a utilização desse mecanismo e partir para outras ações a fim de reduzir o estoque gigantesco gerado no passado.

O segundo aspecto são iniciativas para resolver as causas do problema e assim prevenir a formação de contencioso novo, portanto, soluções para o futuro. Infelizmente, temos notado poucas ações focadas nessa direção. Instrumentos como mediação e arbitragem de conflitos, que são empregados com sucesso em países com alto nível de segurança jurídica tributária e baixo índice de contencioso, poderiam ter um papel muito importante na solução das divergências entre o Fisco e os contribuintes antes de se tornarem disputas formais.

Também aqui cabe reconhecer esforços importantes adotados nessa direção, como o programa Nos Conformes, criado pelo governo estadual de São Paulo em 2018, que valoriza os bons contribuintes permitindo a autorregularização de débitos tributários, evitando litígios. Mas ainda há muito a fazer para melhorar o relacionamento entre o Fisco e os contribuintes e reverter a cultura de desconfiança mútua que existe hoje no País.

O terceiro ponto é o combate àquele que é o oposto do bom contribuinte: o devedor contumaz de tributos. Trata-se de um tipo de fraudador que estrutura seu negócio para ganhar mercado não por meio da oferta de bons produtos ou serviços, mas sim por não recolher os impostos devidos e usar essa vantagem ilícita para praticar preços predatórios, beneficiando-se da complexidade do sistema tributário e da morosidade da Justiça para fugir da lei.

A luta do ETCO contra essa forma de concorrência desleal é antiga e foi inclusive citada em julgamento do Supremo Tribunal Federal realizado em dezembro passado pelo relator do processo, o ministro Luís Roberto Barroso, em seu voto vencedor a favor da criminalização dessa prática. Esse julgamento fortalece a urgente necessidade de aprovação de lei que faça a clara distinção entre o devedor contumaz e o inadimplente eventual, permitindo um combate mais duro ao primeiro e respeitando os direitos do segundo. Um projeto nesse sentido, o PLS 284/2017, encontra-se no Senado Federal pronto para ser votado e tem o nosso integral apoio.

Espero que o estudo da EY e as propostas de grandes especialistas reunidas nesta edição lancem mais luz sobre a necessidade de termos instrumentos eficazes para solucionar esse problema que tanto mal vem fazendo ao Brasil.

Boa leitura.

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