Projeto de Lei no Senado prevê combate a devedor contumaz

No momento em que se avalia a implantação de um novo Refis, para a renegociação de dívidas das empresas, surge a discussão sobre a busca de medidas compensatórias.

Nesse sentido, há uma iniciativa pronta para ser votada pelo plenário do Senado Federal que irá permitir o combate ao devedor contumaz, que sangra os cofres federais na ordem de R$ 14 bilhões ao ano, só no mercado de combustíveis. É o PLS 284/17 que prevê entre uma série de medidas a distinção objetiva entre os devedores: o devedor eventual e o devedor reiterado (que não serão afetados pelo referido PLS) e o devedor contumaz, esse sim, deve ser combatido, pois, se estrutura dolosamente para não pagar os impostos devidos.

Para se ter uma ideia do passivo, também no setor de combustíveis, as dívidas ativas chegam a R$ 70 bilhões. O que corresponde, por exemplo, a 8% do PIB de Minas Gerais no ano passado.

O PLS 284/17 foi relatado pelo senador Fabiano Contarato (PT-ES) e foi aprovado por diversas comissões e agora só depende do Presidente do Senado Federal, Rodrigo Pacheco (PSD-MG) para seguir adiante e ser pautado. A demora na aprovação desse projeto incentiva o devedor contumaz, prejudicando os cofres públicos e toda a sociedade.

Para o presidente do ETCO (Instituto Brasileiro de Ética Concorrencial), Edson Vismona, que acompanha a tramitação da pauta no Congresso, o grande desafio do sistema legal brasileiro é diferenciar o inadimplente do devedor contumaz. “O contumaz não é um contribuinte, ele é criminoso, pois pratica fraude no exercício de suas atividades. Já o inadimplente quer estar em dia, mas por circunstâncias diversas não conseguem arcar com suas obrigações tributárias, este sim, merece atenção do governo e estímulo para sua regularização, já o contumaz deve ser repelido”, afirma.

Devo, não nego, mas não pago.

O título desse artigo pode parecer ao leitor uma piada, mas na verdade revela como pode ser encaminhado o contencioso tributário no Brasil.

Para ilustrar, recordo de um caso amplamente divulgado na mídia de uma cervejaria no Rio de Janeiro que, segundo a Procuradoria Geral do Estado, tem uma dívida de R$ 1,2 bilhão em ICMS e, está tentando se beneficiar de uma lei estadual que permite o parcelamento especial. A primeira instância aprovou o parcelamento em mais de dois mil anos!

Sem entrar no mérito, esse prolongamento milenar de uma dívida tributária faz lembrar o modus operandi do denominado devedor contumaz no qual a empresa se estrutura para não pagar tributos e utiliza todos os meios administrativos e judiciais para protelar indefinidamente o pagamento. Ao não pagar impostos sua margem de lucro é multiplicada e pode ofertar produtos a preços bem mais baixos, destruindo a concorrência leal.

Os valores devidos são bilionários e embolsados por quem se locupleta. Só no setor de combustíveis o passivo é de R$ 60 bilhões e no de cigarros R$ 24.7 bilhões. Uma subversão do dito popular “Devo, não nego, não pago”.

É evidente que o sistema tributário brasileiro se apresenta de modo caótico, são tantas normas, decretos que possibilitam as mais diversas interpretações e dessa forma, fazem com que a vida do contribuinte que tem patrimônio declarado e atividade regular, seja muito mais difícil do que aquele que atua exercendo suas atividades nas sombras.

É certo que temos que enfrentar esse desafio simplificando o sistema tributário, facilitando e estimulando a atividade do contribuinte regular e dificultando e diminuindo o espaço dos contumazes. Nesse sentido, temos parado desde março de 2019 no Senado Federal e pronto para ser votado, o PLS 284/17 – definindo com precisão o que é devedor contumaz, diferenciando-o de devedor eventual e reiterado e assegurando medidas mais eficazes para o fisco poder agir.

Assim temos de um lado, o sistema tributário complexo que criando obstáculos para os contribuintes, resultando em cifras inacreditáveis (estudo patrocinado pelo Instituto ETCO com a consultoria internacional EY indica que o contencioso tributário no Brasil é de R$ 3.4 trilhões) e, de outro, esse caos auxilia os que querem postergar o pagamento de tributos indefinidamente. Essa situação causa insegurança jurídica e afasta investimentos, devendo ser revertida com urgência.

Voltando à lei que permite esse parcelamento de extensão bíblica, temos um retrato das consequências que algumas iniciativas legislativas podem ter. Assim, limitar o valor das prestações poderia ser uma medida defensável, mas, em verdade, boas intenções podem gerar um resultado anacrônico. A análise de risco e efeitos deve ser sempre aprofundada.

Diante dessa possibilidade de transação, é possível que seja proposta uma conciliação, diminuindo as prestações para quinhentos anos. É, parece piada, mas é verdade patente.

Ser legal no Brasil não pode ser uma opção

As pessoas físicas e jurídicas, no Brasil, vivem cotidianamente as dificuldades decorrentes do não cumprimento das leis. Esse tema está diretamente ligado a um dos fundamentos do próprio desenvolvimento do país, a segurança jurídica.

O poder público tem o dever de respeitar e fazer com que seja respeitada a Constituição Federal. Ninguém está acima dos seus princípios. A atração de investimentos, com a geração de empregos e renda, depende da certeza de que todos os agentes do mercado vão respeitar as mesmas regras, que os direitos e contratos serão respeitados. O Estado deveria, de um lado, facilitar a vida de quem quer agir corretamente e, de outro lado, combater aqueles que transgridem a lei. Conceitos óbvios, porém, o caminho para garantir essa realidade normal em uma República não é nada simples.

O necessário cumprimento de leis, decretos, regulamentos em qualquer área pode ser um verdadeiro tormento. São evidentes as agruras de quem quer constituir uma empresa, conseguir um mero habite-se para uma casa, obter licenças de funcionamento de uma loja, acompanhar a transbordante legislação tributária ou as interpretações oscilantes dos tribunais.

Em paralelo, temos o avanço das práticas ilegais no mercado: contrabando, pirataria, contrafação, fraudes, subfaturamento, não cumprimento de regulamentos técnicos, sonegação, atos que distorcem a concorrência e pervertem o ambiente de negócios.

Esse quadro é preocupante. As empresas que cumprem suas obrigações têm que competir com quem busca obter vantagens ilícitas, que se estruturam para burlar todas as regras e assim conquistar o mercado, elevando suas margens de lucro de modo totalmente irregular, às custas de toda a sociedade.

O resultados são impressionantes. O mercado ilegal (quinze setores produtivos), segundo dados do FNCP – Fórum Nacional Contra a Pirataria e Ilegalidade -, movimentou em 2019 R$ 291,4 bilhões. Os devedores contumazes, que se estruturam com o objetivo de não pagar impostos, acumulam mais de R$ 60 bilhões em débitos.

Entretanto, esses prejuízos bilionários são muito maiores, atingem valores intangíveis, pois corroem a crença de que o crime não compensa, desestimulam novos investimentos e esgarçam princípios éticos.

Para alterar essa situação a impunidade deve ser enfrentada; e a obediência das leis, valorizada. Algumas sugestões:

Leis que disciplinem as condutas com clareza e objetividade. E que sejam aplicadas de modo eficaz, diminuindo o espaço, não para o legítimo exercício da ampla defesa, mas sim para atitudes meramente protelatórias, que beneficiam quem deseja ganhar tempo e, assim, permanecer auferindo vantagens e lucros;

As iniciativas dos setores produtivos de denunciar práticas ilegais no mercado devem ser consideradas pelos agentes públicos como um importante apoio para as necessárias ações corretivas, que devem ser encaradas como relevantes e não como uma interferência no ritmo normal de trabalho;

Incentivar a cooperação e a integração entre os entes da administração pública, com a participação da sociedade civil, que pode auxiliar com informações que facilitem e agilizem o trabalho de contenção da ilegalidade;

Combater a corrupção sem tréguas, punindo quem desonra o serviço público. É certo que esse é o único “imposto” pago pelos infratores da lei;

Simplificação de procedimentos administrativos e da legislação, especialmente tributária, para que seja mais fácil cumprir a lei do que ignorá-la;

Essas propostas são conhecidas, mas há resistências. O combate à ilegalidade não é algo natural como deveria.

Um exemplo desse comportamento hostil foi dado pela consulta pública que o Senado faz sobre projetos de lei. A proposta de punir a pirataria de sinal de TV foi rejeitada por 95% das manifestações.

Esse breve panorama expõe alguns dos entraves do chamado “doing business” apresentado pelo Banco Mundial (de 190 países o Brasil está na 124º. posição) e que, há muito tempo, são debatidos, porém, a cada ano postergamos as necessárias medidas e esse atraso prejudica o nosso desenvolvimento.

Em verdade, ser legal no Brasil não pode ser uma opção; é sim um dever para que deixemos de ser o “país do futuro” que nunca chega.

Cassação de registro de empresas tabagistas inadimplentes volta à pauta do STF

 

O Supremo Tribunal Federal (STF) volta a discutir, nesta quinta-feira (17/9), a possibilidade de cancelamento de registro de empresas tabagistas pelo não pagamento contumaz de tributos. Trata-se de um dos assuntos mais importantes dentre os pautados pelo novo presidente da Corte, Luiz Fux, até o fim do ano.

Em setembro de 2018, o plenário do Supremo se debruçou sobre o tema. Oito ministros entenderam ser constitucional a cassação do registro, mas, na ocasião, eram três as linhas diferentes de fundamentação ou argumentação alinhadas a esta visão.

Diante da  complexidade da discussão num processo que tramita na Corte há 13 anos e já acumula oito volumes,  a ministra Cármen Lúcia, então presidente, adiou a proclamação do resultado. Agora, a expectativa é que o voto de Cármen Lúcia seja entendido como o médio e dê os contornos à proclamação.

A ação direta de inconstitucionalidade (ADI) 3952 chegou a voltar à pauta do plenário em 19 de outubro de 2019 e 12 de março de 2020, mas acabou não sendo apregoada. Diante dos seguidos adiamentos, a Corte passou a receber pedidos para que a proclamação fosse concluída logo.

A ação, proposta pelo Partido Trabalhista Cristão (PTC), contesta o “cancelamento sumário” pela Receita Federal do registro especial das empresas tabagistas quando houver inadimplência de tributos federais. O partido alegava que a restrição ao exercício de atividade econômica ou profissional lícita constituiria sanção política vedada pela Constituição, na medida em que não se admite a existência de “instrumentos oblíquos” para coagir ou induzir o contribuinte ao pagamento de tributos .

Em síntese, alegava que o artigo 2º do Decreto-Lei nº 1.593/77, com a redação dada pela Lei 9.822/1999, violaria os princípios constitucionais do devido processo legal, da ampla defesa, do contraditório, da presunção de inocência, da liberdade de iniciativa e da proporcionalidade. Segundo o partido, a sanção imposta às empresas de cigarro não atingiria o fim almejado, que é o pagamento de tributo ou de contribuição.

Edson Vismona, presidente-executivo do Instituto Brasileiro de Ética Concorrencial (ETCO), que é amicus curiae na ação, defende que, na verdade, a cassação é medida adequada para aqueles que, segundo ele, estruturam um empreendimento com o fim de lesar o Fisco para lucrar. Na medida em que assim agem, não se deveria contar com uma possibilidade de recuperação do imposto devido.

“Tem devedores contumazes com dívidas de milhões. A ação corrosiva do devedor contumaz fica muito clara. E não se pode mais protelar. E esse é o verbo preferido do devedor contumaz. ele existe para protelar, não ter decisão, cassação e ele continuar livre e solto, seguir sonegando. A cassação é importante porque impede a continuidade de um delito criminoso e que afeta toda a concorrência”, enfatiza Vismona.

Devedor contumaz é a empresa que declara possuir uma dívida tributária, mas de forma reiterada e premeditada não age para quitá-la. Como o empresário não sonega, apenas não paga o imposto devido, em tese, não comete um crime. Mas, deixa a concorrência para trás, já que o não pagamento dos tributos impacta positivamente o preço dos produtos, que ficam artificialmente mais baratos.

O trabalho para recuperar os montantes devidos é, segundo Vismona, hercúleo. E, com o tempo, tende a ficar ainda mais dificultado. “É um processo contínuo para o Fisco. A cassação não impede que a ação se repita, porque esses grupos abrem novos CNPJs, têm uma estrutura em torno disso. Mas temos de cercá-los, diminuir o espaço que tem.”

A definição final da ADI 3.952 consolida um precedente importante e, na visão do ETCO, fortalece a atuação do Congresso para legislar sobre o combate aos devedores contumazes. Dois projetos de lei em tramitação no Congresso contêm critérios para detectar e punir empresas que se valem desta prática: o PLS 284/2017 e o PL 1646/2019. O primeiro, por exemplo, diferencia o devedor contumaz do eventual — justamente uma das preocupações de quem acompanha o debate. Mas, no Parlamento, a discussão está parada.

O advogado constitucionalista e professor da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (Uerj) Gustavo Binenbojm atua na causa pelo Sindicato da Indústria do Fumo no Estado do Rio Grande do Sul (Sindifumo-RS). De acordo com ele, “a cassação se dá diante da circunstância especial de que essa é uma indústria que a tributação é tão elevada que não basta o Fisco ter à sua disposição os instrumentos tradicionais para cobrança, penhora de bens”.

Nesses casos, avalia Binenbojm, o que se tem é a constituição de empresas que vivem da sonegação fiscal e “por meio dela distorcem o mercado porque oferecem valores muito inferiores aos economicamente viáveis para uma competição justa”.

Desta forma, o dano comercial provocado pela ação é irreversível. Nesse contexto, o fato não se enquadraria na jurisprudência do Supremo de não permitir o que se chama de sanção política. Como regra, não se permite que haja efeitos extrafiscais para o não pagamento de tributo. Mas, neste caso, o entendimento é o de que o Estado não dispõe de outros meios para combater a prática.

“O Direito funciona a partir da realidade. Não é uma abstração filosófica. O argumento de que se fechar a empresa, aí mesmo é que não vai ter como pagar não se coloca com empresas que abrem e fecham e criam novos CNPJs para praticar o mesmo ilícito. A única forma de estancar a sangria e evitar novos danos é impedir a continuidade da ação”, disse.

Binenbojm lembra o caso em que o Supremo autorizou a prisão por dívida de ICMS declarado, mas não pago. “Agora não envolve privação à liberdade. Mas o direito de a pessoa praticar atividade econômica ou não. Se o STF validou a prisão, muito mais grave, por maior razão deve validar a cassação do registro de empresas com intenção inerentemente ilícita”, ressalta.

No fim de 2019, o plenário do Supremo, por sete votos a três, definiu a tese de que o contribuinte que deixa de recolher o ICMS pratica crime desde que haja dolo e de forma contumaz. Na ocasião, a Corte julgou o RHC 163.334 impetrado pelos proprietários de lojas de roupas em Santa Catarina denunciados por não recolher ICMS entre 2008 e 2010. Venceu o voto do relator, ministro Luís Roberto Barroso, que incluiu o critério da contumácia para a construção da tese proposta — alterando a sugestão inicial, sem a expressão.

As correntes de voto

O julgamento teve início em 2010 e foi suspenso após pedido de vista de Cármen Lúcia. Na ocasião, o relator, ministro Joaquim Barbosa, votou pelo provimento parcial da ADI, para conferir aos dispositivos normativos impugnados interpretação conforme a Constituição Federal, estabelecendo as seguintes condições para que a cassação do registro das empresas aconteça: a análise do montante dos débitos tributários não quitados; o atendimento do devido processo administrativo tributário na aferição da exigibilidade das obrigações tributárias e o exame do cumprimento do devido processo legal para aplicação da sanção.

Cármen Lúcia acompanhou Barbosa. Segundo a ministra, essa interpretação “equaliza os princípios da livre iniciativa econômica lícita, da livre concorrência, conciliando com a garantia do devido processo legal tributário e da inafastabilidade da jurisdição, com o dever do contribuinte de cumprir suas obrigações tributárias”. Acompanharam esse mesmo entendimento a ministra Rosa Weber e o ministro Celso de Mello.

O ministro Alexandre de Moraes defendeu que a empresa deve continuar funcionando até que o secretário da Receita Federal julgue o recurso por ela apresentado. Assim, ele votou no sentido de excluir a expressão “sem efeito suspensivo” do parágrafo 5º do artigo 2º da norma, mantendo o restante da lei. Segundo o ministro, a norma, com as alterações feitas pela nova legislação (Lei 12.715/2012), prevê as condicionantes propostas pelo relator da ação. Os ministros Ricardo Lewandowski e Gilmar Mendes acompanharam a corrente aberta por Moraes.

Uma terceira linha foi aberta por Fux. Ele afirmou que a opção do legislador deve ser obedecida e votou pela improcedência do pedido. “Se o legislador entendeu que a medida tem que ser severa, ele tem expertise melhor do que a nossa para saber se um efeito suspensivo não posterga uma atividade ilícita”. Além disso, para Fux, a medida do cancelamento do registro não impede de modo definitivo a atividade econômica da empresa, que poderá ser estabelecida desde que cumpridas as exigências legais. “A liberdade de iniciativa quando exercida de forma abusiva deixa de merecer a tutela do ordenamento jurídico”, concluiu.

Único a votar pela total procedência do pedido do PTC, e consequentemente contra a constitucionalidade da cassação dos registros das empresas, o ministro Marco Aurélio ressaltou que a norma impugnada compele a empresa devedora do tributo, não importando o valor devido, à satisfação do débito tributário. “O preceito não se refere a devedor eventual, reiterado ou devedor contumaz, não há distinção. Contenta-se o dispositivo atacado, para chegar-se a esse ato extremo da cassação do registro, com o inadimplemento puro e simples”, disse.

Os ministros Dias Toffoli e Luís Roberto Barroso se declararam impedidos e o ministro Luiz Edson Fachin não votou por ter assumido a cadeira de Barbosa.

Especialistas defendem tributação especial para combater empresas sonegadores de impostos

A Comissão de Transparência, Fiscalização e Controle e Defesa do Consumidor (CTFC) realizou nesta quarta-feira (5) audiência pública sobre o projeto que cria tributação especial para evitar desequilíbrios da concorrência e combater a sonegação.

A proposta (PLS 284/2017) estabelece punição para quem deixar de pagar tributos para obter vantagem concorrencial. A senadora Ana Amélia (PP-RS), autora do texto, disse que a concorrência desleal pode repercutir nos preços de produtos e serviços e desequilibrar o mercado.

O presidente-executivo do Instituto Brasileiro de Ética Concorrencial (ETCO), Edson Vismona, deu exemplos de quem perde com a concorrência desleal.

— Nós estamos defendendo o erário. Os setores que participam do ETCO são duramente afetados por qualquer prática de sonegação, porque são grandes contribuintes. Com o mercado ilícito, perdem os consumidores e perde o mercado legal, que tem que concorrer de forma absolutamente desproporcional com a brutal sonegação de impostos e a evasão fiscal — disse.

O advogado especialista da Confederação Nacional da Indústria (CNI), Gustavo do Amaral, ressaltou como a deslealdade lesa a economia.

— Quem comprou a cerveja, o refrigerante, o cigarro, o produto que for, sem o recolhimento de tributos, deixou de comprar o outro e não renovará essa compra — afirmou.

O senador Ricardo Ferraço (PSDB-ES) defendeu o projeto de Ana Amélia. Segundo ele, o texto estabelece deveres para o Estado e direitos para o contribuinte, corrigindo uma falha na legislação: a ausência de um marco legal que faça a ética concorrencial prevalecer.

Fonte: Agência Senado (05/12/2018)

A destrutiva estratégia de negócio das devedoras contumazes

Em artigo publicado no Portal Jota, presidente do ETCO fala sobre o julgamento da ADI 3952, que pode autorizar o funcionamento de empresas devedoras contumazes de impostos

Se ADI for validada pelo STF, continuariam a ser prejudicadas a sociedade e as empresas que operam legalmente

A carga tributária sobre os cigarros no Brasil é bastante elevada, variando de 70% a quase 90% em alguns estados. Este é um setor altamente regulado, e as empresas que operam legalmente no país devem atender rigorosamente todas as normas que norteiam a fabricação do produto no país.

A fabricação e comercialização de produtos derivados do tabaco são regidas pelo Decreto-Lei 1.593/77, que entre outras regras obriga que a Receita Federal instale nas fábricas um sistema batizado de Scorpios, que acompanha in locoa produção. Além disso, há necessidade de autorização prévia da autoridade fazendária para a produção de cigarros, denominada registro especial, que, dentre outros requisitos, exige a comprovação da plena regularidade fiscal da empresa.

Apesar do trabalho intenso realizado pelas autoridades para regular de forma adequada o setor, ao longo do tempo um grupo de empresas passou a adotar a sonegação de tributos como estratégia de negócios. Não estamos falando aqui de companhias que, eventualmente, deixam de recolher impostos em função de problemas pontuais, mas de um método adotado pura e simplesmente para que seja possível ganhar competitividade por meio do não pagamento de tributos. Para se manter em funcionamento, essas empresas operam onerando os cofres públicos e prejudicando a livre concorrência no setor.

Estima-se que o conjunto dos impostos devidos pelas empresas devedoras contumazes do setor de tabaco seja superior a R$ 32 bilhões. Além de sonegar impostos essas devedoras contumazes também praticam outros atos ilícitos como a falsificação de selos de controle tributário, o descumprimento de normas reguladoras da produção, da importação e da comercialização de cigarros e outros derivados de tabaco.

A Receita Federal, respaldada por decisões anteriores do Supremo Tribunal Federal, tem agido no sentido de cassar o registro especial das empresas que, comprovadamente, sonegam impostos de forma recorrente. O STF inclusive já se manifestou em algumas oportunidades de forma a manter a empresa sonegadora contumaz com suas atividades suspensas.

Mas uma Ação Direta de Inconstitucionalidade, que tramita desde 2010, deve ser votada no próximo dia 5 de setembro no STF. A ADI 3952, proposta pelo Partido Trabalhista Cristão (PTC), contesta mudanças na legislação que permitiram o cancelamento do registro especial a que estão submetidas as empresas tabagistas do país quando constatado, pelo secretário da Receita Federal, que determinada empresa não está cumprindo suas obrigações tributárias.

Se a ADI for validada pelo STF, proibindo o cancelamento do registro desses devedores, continuariam a ser prejudicadas tanto a sociedade quanto as empresas que operam legalmente, investindo no país, arrecadando impostos e gerando emprego e renda. É preciso que a decisão dos ministros leve em conta os interesses do país, e não de falsos empresários que operam à margem da lei.

 

Artigo publicado em 03/09/2018 no Portal Jota

 

A nova inimiga nº 1 dos devedores contumazes de impostos

Senadora Ana Amélia fala sobre seu Projeto de Lei para combater empresas que usam a inadimplência tributária para ganhar mercado

 

ANA AMELIA INTERNA GRANDE

Elas agem assim de forma sistemática, diferenciando-se, portanto, daquele contribuinte que num momento de dificuldade deixa de recolher os tributos, mas demonstra intenção de regularizar sua situação.

Sonegar imposto no Brasil é crime. Os culpados podem ir até para a prisão. Existe, no entanto, uma prática que provoca praticamente os mesmos prejuízos que a sonegação, mas não é considerada crime e seu combate tem sido muito difícil no País. Trata-se da inadimplência tributária contumaz, que ocorre quando a empresa informa suas vendas ao fisco, mas simplesmente não paga os impostos.

O devedor contumaz se beneficia da falta de instrumentos legais específicos para combatê-lo e da lentidão da Justiça para arrastar os processos de cobranças durante anos – muitas vezes, atuando por meio de laranjas que, quando as ações são definitivamente perdidas, não dispõem de nenhum patrimônio para quitar débitos que milionários. Enquanto isso, utiliza a vantagem do imposto não pago para baixar seus preços e conquistar mercado às custas dos concorrentes honestos, desestabilizando o mercado.

A boa notícia é que essa prática pode estar com os dias contados. Em agosto, a senadora gaúcha Ana Amélia Lemos (PP-RS) apresentou um Projeto de Lei ao Senado (PLS 284/2017) que regulamenta o artigo 146-A da Constituição, permitindo a criação de regimes especiais de tributação e fiscalização. A iniciativa cria condições para um combate muito mais rápido e efeito desse tipo de empresa e conta com o apoio do ETCO.

Jornalista com quase 40 anos de atuação profissional, 31 dos quais cobrindo assuntos de Brasília para a rede gaúcha RBS, Ana Amélia entrou na política em 2010. Em sua primeira disputa, foi eleita senadora com mais de 3,4 milhões de votos. Desde então, vem se destacando no Congresso: foi escolhida quatro vezes como um dos dez melhores senadores no prêmio Congresso em Foco, em 2013 foi apontada pelo Departamento Intersindical de Assessoria Parlamentar (Diap) como a parlamentar mulher mais influente no Congresso Nacional e atualmente ocupa a segunda colocação no Ranking Políticos, levantamento que avalia a produção legislativa de dos 594 congressistas (senadores e deputados).

No dia 10 de novembro, a senadora Ana Amélia falou sobre os propósitos do PLS 284/2017 em entrevista exclusiva à Revista ETCO.

Senadora, o seu projeto busca regulamentar o artigo 146-A da Constituição. Qual a principal finalidade desse artigo constitucional?

Senadora Ana Amélia: O artigo 146-A da Constituição Federal foi formulado para impedir a utilização de tributo como instrumento de desequilíbrio concorrencial. O projeto de lei complementar (PL 284/2017) permitirá não só à União – que sempre teve competência para dispor sobre o tema – mas também aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios estabelecer regimes especiais de tributação e de fiscalização diferenciados, para neutralizar os efeitos dos tributos sobre a concorrência.

Nos últimos anos, vários segmentos empresariais vêm sofrendo a concorrência desleal de empresas que recorrem a vantagens ilícitas, como a inadimplência tributária contumaz, para ganhar mercado. O objetivo do projeto é combatê-las?

Senadora Ana Amélia: O projeto estabelece critérios especiais de tributação, com o objetivo de prevenir desequilíbrios da concorrência, sem prejuízo da competência de a União, por lei, estabelecer normas com igual objetivo. A intenção é evitar a fraude, evasão fiscal, ou mesmo a utilização da inadimplência contumaz como meios para que empresas inescrupulosas aumentem seu faturamento e lucro, ganhando mercado de forma desleal e prejudicando a concorrência. O projeto, portanto, tem espectro amplo, possibilitando a prevenção de desequilíbrios concorrenciais independentemente da forma como o tributo seja utilizado para lesar o Erário e a concorrência, incluindo a inadimplência tributária contumaz.

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Como a senhora vê os prejuízos que os devedores contumazes de tributos causam à sociedade?

Senadora Ana Amélia: O site Movimento Combustível Legal informou, com base em estudo da Fundação Getúlio Vargas, que a sonegação no setor de combustíveis, hoje, é de R$ 4,8 bilhões. É dinheiro que poderia ser arrecadado e revertido em investimentos em saúde, educação, segurança e infraestrutura. Quem comete esse crime se aproveita de brechas na legislação que permitem ao devedor contumaz continuar exercendo a atividade mesmo que tenha débitos com o Estado. O devedor contumaz obtém vantagens desproporcionais em relação àquele concorrente que funciona na legalidade, uma vez que tem uma margem muito maior para trabalhar. A sonegação impacta direta e negativamente na vida dos cidadãos. O dinheiro que seria pago em imposto referente à comercialização de combustíveis poderia ser revertido para serviços voltados à população, pois mais da metade do valor cobrado do motorista, na bomba, é tributo. A sonegação cria um ambiente de concorrência desleal, prejudicando revendedores e distribuidores que trabalham legalmente. Outro crime que precisa ser combatido e que prejudica o consumidor é a adulteração no combustível, pois polui o meio ambiente, e a fraude, na bomba, pesa no bolso dos consumidores.

Como a criação de regimes especiais de tributação pode ajudar a combater essas práticas desleais?

Senadora Ana Amélia: Os regimes especiais consistem em formas diferenciadas de cumprimento de obrigações tributárias com o objetivo de viabilizar a arrecadação dos tributos legalmente previstos. Quando os meios tradicionais de cobrança não funcionam, em razão de práticas adotadas pelos devedores com vistas a burlá-las, há necessidade de dotar as Administrações Tributárias de ferramentas adequadas para combatê-las com eficiência. É esse o objetivo do PL 284/2017.aspas ana amelia 2

 

O Supremo vem mantendo a mesma jurisprudência?

Senadora Ana Amélia: O Supremo Tribunal Federal tem súmulas (70, 323 e 547) que impedem a adoção de meios coercitivos indiretos para obrigar o contribuinte a recolher tributos, como, por exemplo, a imposição de regimes especiais gravosos que impeçam o regular exercício de atividade econômica. Entretanto, no RE 550.769 e na ADI 173, a Suprema Corte ressalvou que a orientação contida em tais súmulas não se aplica quando o contribuinte usa a inadimplência do tributo como meio para explorar sua atividade e ganhar mercado, pois, neste caso, o exercício da atividade econômica torna-se ilícito e, como tal, não merece proteção judicial. Neste cenário, deve-se prestigiar o princípio da livre concorrência.

O novo entendimento do Supremo busca proteger o equilíbrio do mercado?

Senadora Ana Amélia: Sim, numa ponderação de valores, entende o Supremo Tribunal Federal que a livre concorrência deve prevalecer sobre a livre iniciativa, quando constatado o exercício abusivo da atividade econômica, com inadimplência sistemática e injustificada de tributos. Dessa maneira, busca-se a proteção do mercado, considerado patrimônio nacional pelo Constituição (art. 219).SINTONIA COM O STF

Hoje, por causa da confusão jurídica, os processos de cobrança de devedores contumazes chegam a durar mais de dez anos – e nesse período a empresa provoca grandes danos concorrenciais. Caso o seu projeto venha a ser aprovado, a solução será mais rápida?

Senadora Ana Amélia: Essa também é uma das finalidades. A definição de regras claras de tributação e de fiscalização poderá agilizar as soluções e isso será benéfico não apenas para impedir a concorrência desleal, mas para evitar outras irregularidades que tragam prejuízos aos consumidores e ao meio ambiente. O projeto vai separar o devedor eventual, que às vezes enfrenta um problema e não paga o imposto por um período específico, mas depois faz um acordo e quita a dívida, daquele devedor que nunca paga o imposto. Assim, o judiciário conseguirá identificar de forma mais exata para tomar sua decisão. Além disso, poderá a Administração Tributária, em situações extremas, suspender ou cancelar a inscrição do devedor no cadastro de contribuintes, o que permitirá solucionar o problema em seu nascedouro, evitando o prolongamento de seus efeitos prejudiciais ao mercado e à sociedade como um todo.

Poderia fazer um resumo dos principais pontos do projeto?

Senadora Ana Amélia: O projeto prevê que União, estados e municípios possam estabelecer critérios para o cumprimento de obrigações tributárias, como, por exemplo, controle especial do recolhimento do tributo, manutenção de fiscalização ininterrupta no estabelecimento de sujeito passivo, antecipação ou postergação do fato gerador e concentração da incidência do tributo em determinada fase do ciclo econômico, entre outras medidas.  Prevê também a alteração da situação do sujeito passivo no cadastro de contribuintes para as modalidades suspensa ou cancelada. Caso persistam as infrações, ou se tenham evidências de que a companhia tenha sido constituída para a prática de fraude fiscal estruturada e pela produção ou comercialização de produto roubado ou em desconformidade com os padrões estabelecidos pela legislação vigente esse será o tratamento. A intenção é garantir a transparência e o devido processo legal, sem prejuízo para o consumidor e para os proprietários dos estabelecimentos que trabalham cumprindo as regras e os princípios éticos da atividade. A iniciativa também tem como alvos setores altamente tributados, como bebidas e cigarros.

Quais são os tipos de punição previstos no projeto?

Senadora Ana Amélia: O projeto determina que a autoridade administrativa possa alterar a situação do sujeito passivo no cadastro de contribuintes para as modalidades suspensa ou cancelada. A suspensão tem lugar quando persistam as infrações que motivaram a aplicação de regime especial, ou a empresa não possua autorização do agente regulador ou do órgão fiscalizador competente. O cancelamento se justificaria por razões como evidências de que a companhia tenha sido constituída para a prática de fraude fiscal estruturada e pela produção, comercialização ou estocagem de mercadoria roubada, furtada, falsificada, adulterada ou em desconformidade com os padrões estabelecidos pelo agente regulador ou órgão fiscalizador competente.

O projeto preserva o direito de defesa dos contribuintes?

Senadora Ana Amélia: Sim, prevê a intimação prévia do sujeito passivo para exercício do direito de defesa, em prazo não inferior a quinze dias, e assegura a interposição de recurso, sem efeito suspensivo, que deverá ser apreciado em até noventa dias, sob pena de imediato cancelamento do regime diferenciado, além da aplicação individual da autoridade administrativa, por até doze meses, admitida prorrogação por decisão fundamentada.

 

O projeto busca atender a uma causa nobre e importante, que é o combate à concorrência desleal. Mas ele não pode ser usado por estados, municípios ou pela União de forma desvirtuada apenas para aumentar a arrecadação? O projeto deixa claro os limites para evitar que isso aconteça?

Senadora Ana Amélia: Não poderá ser usado de forma desvirtuada para aumentar a arrecadação pois os critérios especiais de tributação, previstos no projeto, não têm aptidão para gerar aumento de tributos. Eles apenas viabilizam a cobrança dos tributos, já previstos. Além disso, sua aplicação deve ser precedida de motivação que demonstre a necessidade, adequação e calibração das medidas tomadas para proteger a livre concorrência.

 

O regime diferenciado poderá ser utilizado em qualquer setor e para qualquer imposto ou o projeto limita sua aplicação?

Senadora Ana Amélia: O projeto prevê que a lei seja válida para qualquer setor da atividade econômica em que se verifique a necessidade de utilização de instrumentos tributários diferenciados para assegurar o regular funcionamento do mercado, com ênfase naqueles em que o tributo seja componente relevante na composição de preços de produtos ou serviços e nos quais a estrutura da cadeia de produção ou comercialização prejudique a eficiência do controle das diferentes formas de evasão fiscal. Estão fora do alcance do projeto apenas os tributos incidentes sobre a renda, o lucro, a movimentação financeira ou o patrimônio, diante das características desses tributos, que os tornam menos propensos de influenciar a concorrência.

 

O senador Ricardo Ferraço havia sido escolhido para ser o relator do projeto, mas ele pediu licença no fim de outubro. Como fica o projeto agora? Quais serão os próximos passos e qual sua previsão em relação a quando poderá ser votado?

Senadora Ana Amélia: O nome do senador Ricardo Ferraço ainda consta como relator no portal do Senado. Porém, imagino que, devido à licença de 120 dias, poderá ser indicado novo relator na Comissão de Assuntos Econômicos. A partir disso, aguardaremos a apresentação e votação do texto na comissão. Depois disso, o projeto precisará ainda passar pelo Plenário do Senado. Depois, vai para a Câmara dos Deputados. Sendo aprovado sem modificações, segue para sanção presidencial. As comissões pelas quais terá que passar pela Câmara serão definidas somente depois que o projeto chegar na Casa. Não há como prever o tempo aproximado ou exato para a tramitação, mas espero que possa virar lei até o final de 2018.

 

 

 

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Ela propõe lei dura contra devedor contumaz de imposto

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