A INTERDEPENDÊNCIA DO ESTADO BRASILEIRO

Ao longo da história do Brasil percorremos uma extensa jornada para a consolidação de uma identidade nacional e com ela a constatação da interdependência que deveria nos unir na construção do nosso destino.

Esses postulados ressaltam um aspecto fundamental de qualquer sociedade civilizada: a preservação da convivência. Todas as regras existentes buscam preservar o relacionamento pacífico entre as pessoas, a sustentabilidade do meio ambiente, a superação das desigualdades sociais, buscando a justiça e a harmonia social. Há um claro sentido de utopia que como ensinou o cineasta Fernando Birri; “A utopia está lá no horizonte. Me aproximo dois passos, ela se afasta dois passos. Caminho dez passos e o horizonte corre dez passos. Por mais que eu caminhe, jamais alcançarei. Para que serve a utopia? Serve para isso: para que eu não deixe de caminhar.”

A vida em sociedade pressupõe o reconhecimento e a necessidade de preservar as nossas relações, estimulando permanentemente a ética, a inclusão, a diversidade, posturas que, ultimamente, vem sendo valorizadas também no meio corporativo com a adoção das métricas ESG, aproximando as empresas, enfim, da defesa dos direitos humanos.

Entretanto, as ações voltadas para fortalecer a convivência são ameaçadas. O debate político atesta uma radicalização que afasta o entendimento, as opiniões contrárias são atacadas violentamente, sem apego à argumentação e a “cultura do cancelamento” se alastra. O contrário não é adversário e sim inimigo.

Esse ambiente tem raízes profundas na nossa história. São abundantes as práticas de desrespeito a direitos, patrocinadas pelos governantes e apoiada por parcelas da sociedade – cada vez mais desconfiada segundo pesquisa global do instituto Ipsos. A apuração divulgada pela Veja mostra que diante da pergunta “Você confia no próximo?” feita a 22 500 pessoas em trinta países, o Brasil aparece em último lugar.

Escândalos de corrupção, o sentido de impunidade que contamina toda a sociedade, a profunda desigualdade e certamente dificuldade em fazer valer os mais comezinhos direitos do consumidor claramente são prejudiciais à nossa convivência. Sim, o nosso passado e o que estamos vivendo no presente não são animadores, mas podem servir de combustível para mudar o futuro.

Ao lembrar que a nossa dependência mútua é a realidade que deveria significar união e que é possível superar nossas inúmeras dificuldades com diálogo, tolerância, sem subserviência. Assim, poderemos questionar e encontrar caminhos. Utopia? Talvez, mas como ensinou Birri, assim deve ser o nosso caminhar.

O contribuinte e o Estado

O pensador Alceu de Amoroso Lima ensinou que “O Brasil começou pelo fim” uma vez que ao sermos achados, o Estado, a soberania portuguesa se impôs, o povo veio depois.

Recorro a essa frase para demonstrar que o poder do Estado é determinante na realidade brasileira. Sabemos da difícil relação que o cidadão tem com o poder público. Não obstante o artigo 5º da Constituição Federal definir como cláusulas pétreas os nossos direitos e garantias fundamentais, no dia a dia o reconhecimento e a prática desses direitos enfrenta grandes percalços. É comum governantes confundirem Estado com governo e este com seus partidos políticos e interesses pessoais.

A área tributária reproduz essas dificuldades. A ação do fisco, com o argumento que está a defender os interesses públicos do erário, por vezes, ultrapassa limites na interpretação da lei, mediante decretos, portarias e regulamentos, apontando para o contribuinte o caminho do contencioso administrativo e judicial. Assim, não surpreende que tenhamos o maior contencioso tributário do mundo, com mais de R$ 5.0 trilhões em discussão.

Cientes desse contexto, o Instituto ETCO, por sugestão do presidente do seu Conselho Consultivo, Dr. Everardo Maciel, contratou, junto à consultoria EY, um estudo técnico sobre os instrumentos de defesa e proteção ao contribuinte na legislação brasileira e no direito tributário comparado, internacional. Foram tratados: Cenário atual; O contribuinte brasileiro nos níveis federal e  estadual (com o mapeamento das normas constitucionais e infraconstitucionais existentes) Análise comparada: instrumentos estrangeiros de proteção ao contribuinte. A proposta é identificar como o contribuinte é tratado no Brasil e em países com as melhores práticas para que possamos refletir como evoluir na relação do contribuinte com o fisco, ponto diretamente ligado à melhoria do ambiente de negócios e ao fortalecimento da segurança jurídica dos cidadãos e empresas.

O estudo apresentou dados que demonstram que, não obstante iniciativas como o Programa de Conformidade Cooperativa Fiscal (Confia) da Receita Federal e Programas de Conformidade Tributária nos Estados, o índice de insatisfação do contribuinte com os serviços prestados (pesquisa da Receita Federal) em 2021 teve a média de 74%.

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Ao lado dessa constatação foram identificados os aspectos que merecem atenção: Previsão de direitos do contribuinte dispersa em diversos dispositivos legais e regimentos, dificultando a compreensão das suas garantias pelo próprio contribuinte; Imposição de multa agravada antes da efetiva comprovação de eventual cometimento de fraude, com foco em grandes contribuintes; Ausência de tratamentos distintos dos contribuintes eventual, reiterado e contumaz, em inobservância ao princípio da equidade; Expressivo percentual de aplicação da representação fiscal para fins penais, cujos dados de contribuintes são publicizados antes da conclusão na esfera administrativa; Ausência de iniciativas de avaliação de desempenho da administração tributária por meio de ferramentas internacionais, que foram adotadas por alguns dos entes federados, a exemplo do TADAT (Tax Administration Diagnostic Assessment Tool) que identificou que estamos entre os mais baixos índices de resolução eficiente de litígios tributários do mundo, entre outras constatações.

No nível estadual foram identificados 12 estados brasileiros que adotaram a positivação dos direitos e garantias do contribuinte por meio de códigos, além do Distrito Federal: Ceará, Espírito Santo, Goiás, Maranhão, Mato Grosso do Sul, Minas Gerais, Pará, Paraná, Piauí, Rio Grande do Sul, Santa Catarina e São Paulo.

Na comparação com as melhores práticas foram avaliados três países: EUA; Alemanha e Austrália. Em todos há leis voltadas para a defesa dos direitos dos contribuintes, com destaque nos EUA para a Taxpayer First Act com foco no atendimento ao contribuinte e, procedimentos de fiscalização; Taxpayers Advocate Services (TAS) que no âmbito do Internal Revenue Service (IRS), é o órgão independente de defesa ao contribuinte; Taxpayer Advocacy Panel (TAP) Comitê de consultoria federal do IRS que auxilia na identificação de questões tributárias relevantes para o contribuinte; E a expressa previsão de contato com superiores nos termos do item nº 2 do Taxpayer Bill of Rights, assegurando o direito a um serviço de qualidade que inclui a possibilidade de contato com superiores dos agentes fiscais em caso de problemas durante as fiscalizações.

Na Austrália, assim como nos EUA, há o reconhecimento dos direitos do contribuinte por meio da Carta do Contribuinte (Taxpayers’ Charter), destacando as seguintes posturas: Direito de audiência, contribuinte tem o direito de audiência no curso do processo administrativo; O Australian Taxation Office (ATO) se compromete a auxiliar o contribuinte quando necessário, explicar as suas manifestações, responder às solicitações do contribuinte e promover o seu atendimento efetivo e o direito de representação perante o ATO e inclusive de questionar o ATO que explicará os procedimentos possíveis, caso o contribuinte decida por recorrer a uma decisão do órgão, buscará resolução rápida dos problemas e manterá o contribuinte informado.

Por fim, na Alemanha foi identificado a adoção da defesa preliminar (Anhörung Beteiligter), na qual o contribuinte tem direito à audiência preliminar, que antecede atos administrativos que “impactariam os direitos da parte envolvida” e, também a audiência ao final da fiscalização (Schlussbesprechung) que ocorre após a entrega, pelo contribuinte, de todos os documentos e informações requisitados pelas autoridades fiscais. Caso as autoridades identifiquem alguma irregularidade, a realização da audiência é obrigatória.

O referido estudo demonstra que devemos avançar na melhoria das relações do fisco com o contribuinte e que medidas legislativas, como o PL 17/22, instituindo normas gerais relativas a direitos, garantias e deveres do contribuinte não devem ser considerados como atos contra o fisco e seus agentes, mas sim de equilíbrio, superando ancestrais querelas entre o Estado brasileiro e seus cidadãos.

Os direitos do contribuinte e a justiça tributária

Há muito tempo é defendida uma reforma tributária que seja estruturante de um modelo que viabilize a justiça fiscal e tributária, vale dizer, que reduza a desigualdade social e incorpore alguns princípios, como eficiência, equidade, simplicidade, estimulando a competitividade e combatendo aqueles que pervertem o sistema, não pagando dolosamente os impostos. Nesse propósito cabe valorizar o contribuinte e coibir o que chamamos “devedor contumaz”, para que os impostos arrecadados sejam destinados para atender as demandas da sociedade e que o Estado receba o que é efetivamente devido, nada mais.

Entretanto, é viável — antes de alcançarmos uma reforma tributária que mereça esse nome — termos uma legislação que simplifique o sistema, combatendo desvios e facilitando a arrecadação. O Instituto Brasileiro de Ética Concorrencial — ETCO, vem, desde sua fundação, em 2003, contribuindo com estudos técnicos, apresentando sugestões para a melhoria das relações entre o fisco e o contribuinte. Identificamos ser urgente afastar imprecisões que incentivam a litigância, causando danos a ambas as partes. O contribuinte deseja a sua regularização fiscal e o tesouro precisa receber, porém, esses objetivos não são alcançados face ao conturbado sistema vigente. O contribuinte não pode ser tratado como um inimigo e o fisco como um algoz.

Em 2019, para apresentar a grave situação que enfrentamos, o ETCO contratou um estudo internacional com a consultoria EY tratando do contencioso tributário. Foi apresentado um quadro desolador, nada comparável com outros países: só no âmbito federal, cerca de R$ 3,4 trilhões estavam sendo discutidos nas instâncias administrativas e judiciais. Para enfrentar esse descalabro apontamos, olhando para o passado, a necessidade de se aperfeiçoar a transação tributária e para o futuro, a adoção da mediação e arbitragem tributária. Para a primeira situação, estimulamos essa discussão em seminários com a PGFN e eméritos tributaristas e, por iniciativa do governo federal foi aprovada a lei 13.988/2020 que foi reforçada pela Lei 14.375/2022. Esses dispositivos e a ação da PGFN resultaram em claros avanços, permitindo a solução de antigas pendências. O contribuinte se regulariza e o fisco arrecada. Com relação à mediação e arbitragem temos projetos de lei nos Estados e no Congresso Nacional, que devem avançar.

Validando a expressão “separar o joio do trigo”, enquanto defendemos uma nova relação fisco — contribuinte, diminuindo as disputas intermináveis e prejudiciais aos que agem de boa-fé, precisamos combater quem se aproveita da confusa situação existente para a cobrança de impostos e se beneficia, estruturando suas ações para nunca pagar impostos, o já aqui referido “devedor contumaz” que tem dívidas ativas no fisco federal de R$ 100 bilhões, somente nos setores de combustível e tabaco. Temos um Projeto de Lei no Senado Federal (PLS 284/17) definindo quem deve ser considerado como devedor contumaz, diferenciando -o dos devedores eventuais e até os reiterados. Está em plenário e, sem uma razão que possa ser compreendida, não é votado.

A mais recente iniciativa do ETCO é um novo estudo internacional com a consultoria EY — que está em fase final — tratando dos direitos do contribuinte, apresentando um diagnóstico da nossa legislação constitucional e infraconstitucional e avaliando a postura de países com as melhores práticas (EUA, Alemanha e Austrália). O objetivo é dimensionar, assim como fizemos no estudo do contencioso, como o contribuinte é tratado e quais sugestões podem ser apontadas para garantir direitos e definir deveres, com o objetivo de estabelecermos um novo patamar nesse relacionamento, hoje de animosidade, para uma atitude de maior compreensão e exatidão das obrigações, o que é do interesse do Estado e dos cidadãos de boa — fé.

Assim, devemos, por exemplo, combater eventuais abusos, como a normalização da representação fiscal para fins penais e a aplicação de multas agravadas em até 150%, sem critérios.

Esse trabalho do ETCO encontrou no Projeto de Lei 17/2022, de autoria do Deputado Felipe Rigoni, a demonstração de quão importante é essa iniciativa de alcançarmos um equilíbrio na convivência mais cidadã no âmbito fiscal. Esse deve ser o objetivo.

Na audiência pública realizada pela Comissão de Finanças e Tributação da Câmara Federal, o ETCO demonstrou que o PL 17/22 deve consolidar os direitos do contribuinte sem inibir a legítima ação do fisco. Esse projeto de lei não deve ser encarado como uma medida contra o fisco ou contra a presença fiscal, aliás, para o exercício dessa ação é dever do agente público defender direitos e definir deveres. Nesse sentido, a redução da litigiosidade; a valorização da boa-fé, apoiar a composição antes da imposição de penalidade, permitindo que o contribuinte aponte fatos e documentos são medidas que longe de defender sonegadores, demonstram um sentido de respeito aos cidadãos e às empresas, em benefício do trabalho da fiscalização, que não tem como objetivo punir e sim arrecadar o que for justo. Importante salientar que os países que contribuíram com o estudo do ETCO/EY, reconhecidos como rigorosos no combate eficiente aos sonegadores, estimulam a defesa dos contribuintes. Os EUA, por exemplo, têm o “Taxpayers Bill of Rights”. Uma vez definido que é devido o imposto e o seu valor, a ação do fisco é fortalecida.

Claro que o projeto de lei pode e deve ser aperfeiçoado, mas não é crível que seja desacreditado. Essa postura afasta a seriedade da crítica. Por que não termos uma lei que garanta direitos do contribuinte e aponte deveres e que, uma vez estabelecidos, sejam cumpridos?

Para fortalecermos a segurança jurídica é necessário que tenhamos, de um lado, a exata definição do imposto devido, simplificando seu pagamento e a eficiência da arrecadação, afastando o contencioso excessivo e, de outro, uma lei que combata os sonegadores e devedores contumazes.

Esse é o caminho que deve representar avanços na busca da justiça tributária, antes mesmo de alcançarmos uma efetiva reforma tributária.

*Edson Luiz Vismona é advogado, presidente do Instituto Brasileiro de Ética Concorrencial (ETCO) e do Fórum Nacional Contra a Pirataria e Ilegalidade (FNCP). Foi secretário da justiça e defesa da cidadania do Estado de São Paulo (2000/2002)

Contrabando, ameaça à soberania nacional

Em artigo publicado no Jornal Correio Braziliense, de 15/08, o presidente do ETCO,  Edson Vismona, fala sobre a falta de competitividade brasileira, provocada pela insegurança jurídica e por regras comerciais e regulatórias equivocadas.

 

CONTRABANDO, AMEAÇA À SOBERANIA NACIONAL

por Edson Vismona

 

Entre os principais problemas da falta de competitividade brasileira estão a insegurança jurídica e as diferenças comerciais e regulatórias existentes, inclusive entre países.

Na visão clássica, e correta, da análise empresarial, são fatores de inibição ao investimento e, portanto, da geração de empregos e renda. De outro lado menos visível, por ser mais complexo e de difícil controle, formadas as condições assimétricas de competição, dá-se o favoreci mento ao ingresso de produtos por vias Ile-gals, em primeiro momento, chegando-se ao ápice da existência de empresas que falsificam até mesmo a versão ilegal de produtos, ou ainda que se utilizam de mecanismos tributários para perpetuarem sua ação de má fé, de forma contumaz.

O caso do cigarro é emblemático desse problema. De forma eficiente, os programas de redução de consumo do produto atingiram patamares bastante satisfatórios. Entretanto, a medida da dose do remédio não somente afetou a indústria nacional como facilitou o crescimento da criminalidade, que hoje é responsável por 45% do mercado brasileiro de cigarros. Pergunta-se, então, quem cuida desse mercado e seus efeitos danosos à população ? A certeza que temos é de que o agravamento das medidas atuais vai gerar claro e objetivo favorecimento ao país vizinho, uma diminuição da atividade industrial brasileira e o crescimento da criminalidade, beneficiada pelo contrabando, orquestrada por organizações criminosas que ampliam seu poder.

No Paraguai, por exemplo, os cigarros são tributados em apenas 16%, enquanto que no Brasil as empresas do setor pagam, em média, 70% de impostos sobre os produtos fabricados legalmente. Além disso, os fabricantes do país vizinho não são obrigados por seu governo a cumprir normas semelhantes às Impostas pelas autoridades brasileiras como a colocação de frases e imagens de advertência nas embalagens, que, por lei, devem ocupar 75% do espaço dos maços.

A qualidade dos cigarros paraguaios também é muito inferior à brasileira de acordo com pesquisa realizada pela Universidade Estadual de Ponta Grossa, que mostrou que esses produtos contêm, além de altas concentrações de metais pesados, resíduos animais como patas de baratas e pelos de rato.

A questão do contrabando de cigarros, inclusive, está se transformando em uma questão de segurança nacional. Não é novidade para ninguém que essa atividade é dominada por organizações como o PG. Mas em um depoimento ao Senado americano, em maio de 2017,0 cientista político Ema-nuele Ottolenghi, da Fundação para a Defesa da Democracia (FDD na sigla em inglês), revelou a ligação íntima entre o comércio ilegal de cigarros e o terrorismo internacional.

De acordo com Ottolenghi, presença crescente de empresas afiliadas ao Hezbollah no negócio de varejo de tabaco aumenta a possibilidade de que o comércio ilícito de tabaco se torne uma fonte adicional de renda para a organização terrorista”.

Ele ainda explicou aos senadores americanos que as rotas de contrabando de drogas e de cigarros ao longo da fronteira Paraguai-Brasil estão se tornando indistinguíveis. A atual situação na segurança pública no Rio de Janeiro é um. lembrete de como o crime organizado atua. Quantos fuzis, pistolas e metralhadoras foram produzidos na capital fluminense nos últimos anos? Quantos centros de produção de drogas foram estourados pelas autoridades? O comércio ilegal de produtos é uma das atividades que mais prejuízos traz para a população e para o país.As dificuldades na fiscalização e controle das fronteiras reforçam a necessidade de uma maior integração entre as diversas forças governamentais envolvidas no combate ao problema. Essa é uma premissa para que o país possa voltar a crescer, a gerar empregos e a promover o desenvolvimento de que tanto necessitamos. Não podemos mais conviver com a ilegalidade como se fosse parte normal de nossas vidas. É preciso que toda a sociedade se una em torno de um objetivo comum: a restauração do país que nós queremos, respeitando a ética e a lei, hoje e para as gerações que ainda estão por vir.

O impacto do contrabando na realidade dos brasileiros

Edson Vismona

Uma pesquisa inédita encomendada pelo Instituto Brasileiro de Ética Concorrencial (ETCO) para o Datafolha traz dados surpreendentes. O levantamento feito com mais de 900 pessoas do sudeste do país mostra que a maioria dos entrevistados (75%) acreditam que a entrada de produtos contrabandeados no país favorece o crescimento da violência e da criminalidade. E ainda mais alarmante: mesmo diante desta informação, a maioria dos entrevistados reconhece que vai continuar comprando mercadorias ilegais.

Mas o que torna o produto contrabandeado tão atrativo? Outra pergunta feita na pesquisa pode elucidar essa questão: os altos impostos praticados no Brasil. Para 86% dos entrevistados, o aumento de impostos de produtos brasileiros favorece a entrada de produtos contrabandeados. Isso porque, devido à tributação, o produto nacional geralmente custa mais caro. É a questão do preço.

Tomemos como exemplo o produto mais contrabandeado para o Brasil, o cigarro, em que a carga tributária pode superar 80%. Não é difícil concluir o motivo pelo qual, atualmente, 30% do mercado brasileiro é dominado por marcas contrabandeadas, gerando, apenas em 2015, evasão fiscal de R$ 4,9 bilhões aos cofres públicos.

Atualmente, 19% do mercado capixaba de cigarros é dominado por marcas ilegais. Entre 2012 e 2015, o mercado de cigarros contrabandeados deu um salto de 6% no estado, enquanto o mercado formal sofreu uma retração de igual proporção. Enquanto marcas como Gifty e Bill são vendidas por um preço médio de R$ 3,77 – abaixo do preço mínimo de R$ 5,00 estabelecido em lei – o estado contabiliza perdas de R$ 75 milhões de reais, apenas pela evasão fiscal entre 2012 e 2015. Perdem, portanto, o governo e a população e ganham os criminosos, extremamente bem-sucedidos em seus negócios, realizados à margem de qualquer Lei.

É certo que uma medida de natureza tributária seria de grande ajuda e poderia surtir efeitos significativos. Em se tratando de cigarros, especificamente, tal medida deveria buscar um equilíbrio que possibilitasse a efetividade dos ajustes tributários em termos de redução de consumo, sem, contudo, provocar a migração dos consumidores do mercado legal para o ilegal, como orienta a própria OMS.

Além da questão tributária a fragilidade das fronteiras também precisa ser combatida, na medida em que representa uma das principais oportunidades para enfrentamento a esse crime. Especificamente com relação a este ponto, o governo federal já se sensibilizou e determinou a criação de um grupo de trabalho formado por diversos ministérios afetos ao assunto. Relatório recente do Tribunal de Contas da União (TCU) apontou diversas oportunidades de eficiência e, principalmente, de governança para a resolução do problema das fronteiras, que é de interesse público e soberania nacional.

Na luta contra o contrabando, é preciso, contudo, que as autoridades, tanto na esfera federal como na estadual, compreendam o que a sociedade já entendeu: aumentos de impostos já não são mais toleráveis e o governo tem papel fundamental na instauração de um ambiente de legalidade e concorrência justa no mercado interno brasileiro.

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Edson Vismona é presidente executivo do ETCO – Instituto Brasileiro de Ética Concorrencial

Artigo publicado no Jornal A Tribuna (ES) em 14/10/2016

Edson Vismona é o novo Presidente-Executivo do ETCO

foto-edson-06_10_2014_ok-3Edson Luiz Vismona assume a partir de outubro, a Presidência Executiva do Instituto Brasileiro de Ética Concorrencial (ETCO), substituindo Evandro Guimarães.

Vismona é advogado, especializado em defesa comercial e direito do consumidor.  Foi Secretário da Justiça e da Defesa da Cidadania do Estado de São Paulo (2000/2002); Secretário Nacional da Reforma Agrária (2002). Fundador e Presidente da Associação Brasileira de Ouvidores/Ombudsman – ABO, é membro do Conselho Nacional de Combate à Pirataria (CNCP), da Comissão de Combate à Pirataria da OAB/SP – Ordem dos Advogados do Brasil, secção São Paulo e do Conselho de Ética do Instituto Ética-Saúde.

À frente do FNCP desde 2009, Vismona vem coordenando diversas iniciativas de defesa do mercado legal em parceira com o ETCO.

O novo Presidente-Executivo do ETCO entende que a ética concorrencial deve ser um dos fundamentos do desenvolvimento econômico do Brasil, na medida em que fortalece princípios e valores da sociedade e aumenta a segurança jurídica, contribuindo para a construção de um país mais justo e digno.