Dilma segue estratégia de reforma fatiada

Fonte: O Estado de S. Paulo (São Paulo – SP) – 28/05/2012

Sem alarde, a presidente Dilma Rousseff começou a fazer o que chama de reforma tributária “de resultados”. A mudança no PIS-Cofins é considerada fundamental pelo Palácio do Planalto para acabar com as distorções do modelo tributário. Com esse diagnóstico, Dilma está disposta a usar a mesma estratégia adotada no início do mês, quando anunciou alterações na poupança, para angariar apoio às novas medidas.

Integrantes do governo já estão conversando com empresários, governadores, prefeitos e sindicalistas sobre o assunto, na tentativa de aparar arestas e diminuir resistências à proposta. A presidente sabe que não conseguirá emplacar uma reforma tributária de maior fôlego tão cedo e, por isso, resolveu apelar para ações específicas em algumas áreas.

Na avaliação de Dilma, a estrutura de impostos no Brasil figura na lista dos três principais entraves ao crescimento do País, ao lado das taxas de juros e do câmbio. “Eu acho que, de fato, existe uma tributação inadequada no Brasil”, disse a presidente a uma plateia formada por prefeitos que participaram da Marcha em Defesa dos Municípios, no último dia 15. “Nós tributamos insumos fundamentais, por exemplo, para o desenvolvimento do País. Eu não conheço muitos países que tributam energia elétrica. Nós tributamos”.

Agenda. Depois das mudanças na poupança – aprovadas pela população, de acordo com pesquisas que chegaram ao Planalto -, Dilma vai investir cada vez mais no calendário de reformas, mesmo que fatiadas. O tema é classificado pela equipe econômica como “agenda positiva”.

Em menos de três meses o governo já conseguiu sinal verde do Congresso para o Fundo de Previdência Complementar do Servidor (Funpresp) e para a Resolução 72, que acabou com incentivos dados pelos Estados nas importações e disparou o processo de reforma do ICMS. Além disso, Dilma editou a Medida Provisória que mudou as regras da poupança.

Agora, enquanto alinhava o novo PIS-Cofins, que terá até o nome alterado, o governo também trabalha para aprovar no Congresso a Proposta de Emenda Constitucional (PEC) que trata da cobrança do ICMS nas vendas pela internet. O projeto já passou pelo crivo da Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado.

Em todas as conversas sobre o sistema de impostos e a carga tributária, Dilma diz que não adianta esperar para fazer uma “reforma dos sonhos” sem atacar problemas localizados. Para Dilma, o atual modelo concentra os investimentos em poucas regiões e precisa ser modificado. A presidente avalia, porém, que a guerra dos portos é um “mal maior” a ser combatido.

Economista entrega proposta de reforma tributária a Mantega

Fonte: Yahoo Brasil – 24/05/2012

BRASÍLIA. O economista Paulo Rabello de Castro, que coordena o Movimento Brasil Eficiente, apresentou nesta quinta-feira proposta de reforma tributária ao ministro da Fazenda, Guido Mantega, e ao vice-presidente Michel Temer. Batizado de “Agenda para o Avanço Acelerado do Brasil”, o texto contém diretrizes até 2022 e foi formulado pela entidade Grupo de Líderes Empresariais (Lide).

Segundo Paulo Rabello, que estava acompanhado do empresário e presidente do Lide, João Doria Júnior, a carga tributária brasileira corresponderá este ano a 37% do PIB (Produto Interno Bruto, soma de riquezas produzidas num ano). E, pela proposta, poderia cair para 30% até 2022, com aumento de arrecadação.

Esse é o pulo do gato, conforme o economista: ao simplificar a cobrança de tributos – inclusive com a unificação do ICMS -, cortar juros, melhorar a gestão e aumentar a competitividade, ele aposta que governo promoveria o crescimento econômico e, assim, compensaria a diminuição de impostos.

– O foco principal da Agenda Brasil é dar mais força ainda para o plano de investimentos que já está em curso e que pode ser bastante acentuado, se houver uma repactuação dos termos da dívida dos estados – disse Paulo Rabello, após o encontro com Mantega e Temer no início da tarde, na Vice-Presidência, em prédio anexo ao Palácio do Planalto.

– (Isso) ajudará governadores e prefeitos a implementarem mais investimentos úteis para a população lá no interior do país. Centenas, milhares de municípios sendo beneficiados por uma liberação de recursos que hoje vão, de modo estéril, para pagamento de juros.

João Doria disse que o Lide e a Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp) convidaram Mantega para debater o tema no início de julho, em São Paulo. Segundo João Doria, Mantega topou.

Paulo Rabello afirmou que Mantega foi receptivo à proposta e elogiou as medidas adotadas pelo governo para enfrentar a crise internacional:

– Estamos apoiando o ministro Guido Mantega para trazer os juros para patamar de normalidade. Os juros no Brasil são juros de agiota – afirmou o economista.

O tributarista que estuda mitologia

Fonte: Gazeta do Povo Online (Curitiba – PR) – 25/05/2012

Defensor do ICMS neutro, sem nenhuma isenção e com as alíquotas iguais para o Brasil inteiro, o jurista Sacha Calmon é contra a proibição dos estados utilizarem suas despesas para fazerem política fiscal. O sotaque mineiro engana e faz pensar que o advogado tributarista não é soteropolitano. Torcedor do Flamengo e do Bahia, Calmon justifica a escolha explicando que em Minas, estado onde vive, “não tem time”. Adorador da comida do sertão, o ex-juiz federal pôde conhecer o Nordeste quando ainda era criança e acompanhou o pai, que era engenheiro e trabalhava na ferrovia Transnordestina. Na entrevista à Gazeta do Povo, Calmon defendeu a privatização da infraestrutura brasileira, a diminuição dos impostos sobre consumo e um regime trabalhista mais flexível.

Qual a opinião do senhor sobre o projeto de lei de unificação dos tributos do ICMS?

Quando houve a reforma tributária, na emenda número 1 da Constituição de 1966, logo depois da Revolução de 1964, foi criado o ICM em substituição ao IVC. Os estados cobravam impostos de vendas e consignações. Era um imposto cumulativo, não dava direito a crédito. Então era um imposto extremamente inflacionário. E nós importamos da Europa a introdução do IVA, um imposto sobre valor adicionado. Naquela época, a competência para cobrar os impostos sobre valor adicionado, que é o caso do ICMS, ou era do governo federal, quando o estado era organizado como federação, ou era do estado nacional, porque aí não tinha estados, não tinha problema. É o caso da França, de Portugal, da Itália. Na Alemanha já existia um Estado. Resultado: o competente era a união. O Brasil contrariou e deixou que os estados ficassem competentes. Mas em seguida, quase castrou a competência deles. Definiu tudo em resolução do Senado. Os estados não se deram por vencidos e começaram a dar incentivos que não deviam dar, porque esse imposto é incompatível com finalidades extrafiscais. Daí nasceu a guerra fiscal. Esse tiroteio que a meu ver atrasa o desenvolvimento do Brasil.

Depois dessa explicação, digo o seguinte: eu sou a favor do ICMS neutro, sem nenhuma isenção, sem nenhuma redução de base de cálculo e com as alíquotas iguais para o Brasil inteiro e cobrado no estado do destino, como é na Europa. Agora, é errado proibir os estados de fazerem política fiscal com a sua despesa. Os estados têm que fazer essa política de atração de investimentos com a despesa, com clareza, para saber quanto estão gastando para atrair empresas, para fomentar o desenvolvimento industrial, criação de empregos. Porque quando você renuncia à receita você não sabe de nada, não sabe nem se está sendo produtiva ou não a política de incentivos. Até porque como é um imposto que repercute em outros estados, a consequência é aquela briga, essa confusão jurídica, demanda perigosa de crédito e um ambiente de negócios ruim, há muita incerteza, insegurança jurídica.

O ministro Guido Mantega disse que a resolução 72, aprovada no Senado, é o primeiro passo para a Reforma Tributária. O senhor concorda?

Ele está se referindo exatamente à Reforma Tributária do ICMS, que não é imposto dele, é imposto dos estados. Essa questão dos portos, originariamente, era botar alíquota zero. Porque você dava vantagem, em qualquer porto, para não pagar nada de ICMS. Agora, na operação posterior, você vai pagar alíquota interestadual ou interna que for devida, sem crédito. Então a pessoa que importou não pagou, mas aquela que cobrou do importador, vai pagar no lugar dele. Essa que era a ideia, anular o incentivo zerando, que aí eu não transfiro crédito.

Porque o que os portos estavam fazendo era o seguinte: você não precisa pagar nada e aí eu ponho no livro fiscal que você pagou 18%, mas não pagou. O contribuinte do outro Estado acreditava nesses 18% e abatia no imposto que ele tinha que pagar no outro Estado. E o outro Estado falava: eu não vou aceitar, você não pagou nada, você está transferindo para o meu consumidor o ônus, porque não me deu isenção nenhuma, apenas transferiu o momento do pagamento para ele. Então a ideia do Mantega era zerar esse incentivo ilegal, e na operação posterior, com a alíquota cheia, se recuperava o zero da importação. Aí os estados disseram que queriam uma compensação e botaram a alíquota em 4%. Quer dizer, então paga 4% e também só transfere 4%.

Como o senhor acha que o Brasil pode enfrentar a competitividade internacional hoje, principalmente a China, sem ser protecionista? É possível?

Eu acho que sim. Nós temos que fazer, a médio prazo, algumas coisas, como melhorar a infraestrutura, o que significa privatizar ela toda. A capacidade de investimento do governo federal é de 3,7% do PIB, nós precisamos de 24% de investimento. Também é preciso diminuir os impostos sobre o consumo, eles é que encarecem as coisas feitas no Brasil. E nós temos que ter um regime trabalhista mais flexível, se não vai acontecer o que está acontecendo na Europa. Tem muita proteção e muito desemprego. O crédito tem que cair, essas taxas de juro no Brasil são absurdas, são coisa de agiota. E último, a revolução tecnológica, inovação. Então a nossa agenda é de longo prazo. Agora, eu acho que o protecionismo não é uma boa, porque você acomoda quem está apertado.

O senhor é autor do livro A História da Mitologia Judaico-Cristã. O que levou o senhor, como jurista, a se dedicar a este assunto?

Porque, por incrível que pareça, o Direito nasceu das religiões. Porque antigamente, para obrigar as pessoas a ficarem no caminho reto, a norma era religiosa. Deus castiga, Deus manda para o inferno, era o Direito Penal, religioso. E no Direito, premiar é ir para o céu. Então na verdade, as religiões, se você for examinar, elas são mitos, mitológicas. O livro é muito grande, são 800 e tantas páginas. E eu trago a colação de grandes autores que já trataram da natalidade do direito. É uma visão jurídica, crítica das religiões.

O senhor tem alguma religião?

Não, eu sou agnóstico.

Quanto tempo o senhor levou para escrever?

Cinco anos. No fundo era uma obsessão, porque eu fui criado muito super “catolicamente”. Meus pais me inculcaram uma religião muito cheia de culpa, de pecado, uma religião do medo, e eu resolvi sacudir esta irracionalidade. A gente fica até com medo de escrever e ser castigado, porque já vem um Deus terrível, um Deus castigador.

O que o senhor mais gosta, agora que passou a obsessão?

Eu gosto da boa literatura, tudo que for bom, bons vinhos, boa música.

Qual a sua literatura favorita?

Gosto muito de policial, gosto da Agatha Christie, gosto do Dan Brown, acho ele fora de série. Do Umberto Eco. Do Prêmio Nobel de Portugal, o Saramago.

[Para de falar e presta atenção em um jogo da Eurocopa que passa na televisão no saguão do hotel]

O senhor gosta de futebol?

Eu gosto.

Que time o senhor torce?

Eu sou Flamenguista.

Mas o senhor não é mineiro?

Sou, mas lá não tem time não. Eu sou Bahia e Flamengo.

Mas Bahia?

É porque eu nasci lá.

Que cidade da Bahia?

Salvador.

Então o senhor é soteropolitano?

Soteropolitano, a cidade do salvador. Sotero em grego é o salvador…

E adotou o Flamengo por quê?

Eu adotei o Flamengo porque papai era engenheiro. Então ele estava fazendo uma estrada de ferro, a Transnordestina, e eu segui ainda menino. E lá no Nordeste, de dez nordestinos, oito são flamenguistas. No Piauí todo mundo é Flamengo. O Flamengo enche o estádio. O Flamengo pode jogar lá em qualquer cidade do Nordeste que a torcida é toda do Flamengo. Não sei por que. São pouquíssimos os vascaínos, fluminense.

Então o senhor conheceu bastante o nordeste na infância?

Conheci porque a estrada saía de Salvador e ia em direção a Sergipe, Alagoas, Paraíba, Pernambuco, ia embora. E eu fiquei dos cinco a uns dez anos por conta dessa estrada.

Artigo – Retomar a reforma

Fonte: Brasil Econômico (São Paulo – SP) – 24/05/2012

Recentes medidas tomadas pelo governo da presidente Dilma Rousseff possibilitaram a criação de um ambiente mais favorável à aprovação da reforma tributária no país. O debate em torno da reforma está paralisado no Congresso Nacional porque falta envolvimento dos governadores na questão, sem os quais, não será possível aprovar uma reforma ampla e completa.

Sem sinais de que essa situação irá se alterar, o governo federal decidiu mudar de estratégia e passou a modificar a tributação de determinados setores e a buscar a formação de um cenário que estimule o ingresso dos governadores no debate.

O primeiro passo foi dado com a aprovação da Resolução 72, que pôs fim à chamada guerra dos portos, ao padronizar a tributação de produtos importados e retirar dos estados a possibilidade de jogar com as alíquotas em práticas nocivas à indústria nacional.

A necessidade de estimularmos o crescimento produtivo nos próximos anos levou à mudança, mas nosso setor industrial, bem como o conjunto da sociedade, ainda sofre com um modelo tributário confuso, regressivo e que tem como marca maior ampliar o custo da produção brasileira. Há tempos isso precisa mudar, mas as resistências e obstáculos criados pela oposição no governo Lula impediram a aprovação da reforma.

A proposta enviada pelo governo Lula ao Congresso contempla os principais pontos da reforma de nosso sistema tributário. O cerne, e portanto o centro da polêmica, é a forma de cobrança do ICMS (Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços), imposto que possui hoje mais de 27 legislações diferentes, abrindo espaço para os estados fazerem uma guerra fiscal.

Em suma, a tributação do ICMS é o entrave maior à reforma. Ao acabar com a guerra dos portos, o governo federal pavimentou o caminho para avançar na reforma do ICMS. Também conta a favor o fato de que o Supremo Tribunal Federal (STF) já decidiu ser necessário revisar os critérios de partilha do Fundo de Participação dos Estados (FPE) até dezembro deste ano. Além disso, a guerra fiscal foi considerada inconstitucional.

A base da retomada dos debates sobre a reforma é a sistemática adotada na Resolução 72, quer dizer, padronizar as cobranças do ICMS de transações interestaduais em uma faixa de alíquotas mais baixas – hoje, essa faixa vai de 7% a 12%, dependendo do estado e do produto comercializado. O passo seguinte seria passar a cobrança para o destino (local de consumo do produto), ao invés de fazer a cobrança na origem (local de produção), como é hoje.

Essa padronização retiraria o instrumento que os estados usam para a guerra fiscal. A etapa seguinte seria equacionar os demais impostos para unificar a tributação no futuro IVA (Imposto sobre Valor Agregado).

Há outros pontos importantes, como taxar grandes fortunas, introduzir o caráter progressivo no sistema tributário, estimular pesquisa em tecnologia e inovação, além de constituir um fundo de desenvolvimento regional e que compense perdas de arrecadação com a reforma.

Mais uma vez, o governo federal busca maneiras de superar um sistema tributário que prejudica a produção, dificulta o desenvolvimento nacional e onera justamente os que precisa favorecer. E os estados? Voltarão a sentar na mesa e discutir o assunto pelo bem do país ou repetirão a tacanha postura de outrora?

 José Dirceu é advogado, ex-ministro da Casa Civil e membro do Diretório Nacional do PT

Um peso difícil de ser reduzido

Fonte: Diário do Comércio (São Paulo – SP) – 22/05/2012

A presidente Dilma Rousseff tem insistido que, se politicamente não dá para fazer a reforma tributária ampla e irrestrita que torne o sistema de cobrança de impostos no Brasil mais amigável para os contribuintes e para a economia como um todo, é possível conseguir avanços substanciais nesse que ɠ um dos maiores entraves à competividade brasileira.

 Nos últimos dias a presidente tem insistido, principalmente, no peso dos impostos sobre a energia elétrica, um dos paradoxos brasileiros – temos uma das matrizes energéticas capaz de produzir uma das eletricidades mais baratas do mundo e, ao mesmo tempo, temos a terceira conta de luz mais cara do mundo, tanto a das casas quanto a da que é consumida pelo setor produtivo. O imposto comeria 50% da fatura. Não é a toa que a Alcoa, produtora de alumínio e grande compradora de energia elétrica, ameaça fechar duas de suas fábricas no Brasil e transferir para o exterior os empregos que dá aqui e os impostos que paga ao Tesouro.

Espera-se, para os próximos dias, ações oficiais nesta área. E na esteira dessa nova cruzada da presidente Dilma, depois da bem sucedida, pelo menos de público, campanha contra os juros altos, o ministro das Comunicações, Paulo Bernardo – há tempos um tanto sumido dos debates como praticamente todos os ministros da presidente – veio à cena para falar e propor o mesmo no setor de telecomunicações em geral. Também nessas contas o bote tributário bate fácil a cota dos 40%.

Como diz o dito popular, no entanto, falar é fácil, fazer é que são “outros quinhentos mil reis”.

O que o governo federal pode fazer nesses dois setores, especificamente, é muito pouco em relação ao tamanho do imposto cobrado. O peso maior, como todo empresário sabe, é de um tributo estadual, o Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS). Aliás, o ministro Bernardo chamou a atenção para esse pequeno grande detalhe: para reduzir substancialmente, como o necessário, a carga de impostos tanto na energia quando nas telecomunicações, seria necessária a contribuição dos governadores.

E é nesse ponto que morreu – ou morrerá –  Neves. Hoje, mais de 60% do que os fiscos estaduais arrecadam vem do ICMS cobrado de apenas cinco categorias de produtos: eletricidade, telecomunicações, combustíveis, veículos e bebidas. Não há governador que queira – ou mesmo possa –, nas condições atuais, abrir mão dessa mina, pois são setores de arrecadação concentrada, fáceis e cobrar e de fiscalizar.

Aliás, os governadores, como os prefeitos que vaiaram a presidente Dilma de forma incivilizada na semana passada, têm reivindicação oposta aos planos brasilienses que podem atingir os seus cofres: eles querem é mais recursos. Eles pretendem que o governo federal divida melhor com os Estados e municípios o bolo dos impostos. Na soma geral, embora o ICMS seja o imposto de maior peso (e o mais complicado de operar para as empresas) a parte maior da guloseima tributária fica com Brasília – mais de 60%.

Qualquer conversa para cima deles sobre baixar o ICMS só vai de fato começar se Dilma e o ministro Mantega acenarem com compensações. Muitos governadores contam com a redivisão dos royalties do petróleo para melhorar seus caixas. Acontece que, na hora de fazer essa repartição, o governo federal de novo pegou a maior parte para ele. Deu em nada.

Assim, discurse-se o que se discursar, a reforma tributária fatiada que a presidente Dilma Rousseff pretende fazer para driblar os obstáculos que se antepõem a uma mudança mais profunda no jeito do Estado brasileiro se financiar sempre será um remendo, melhorzinho ou piorzinho, um pouco dependendo do estilista do momento.

E assim ficamos neste mundo impossível: temos uma das maiores cargas tributárias do mundo, governos estaduais que se queixam de não ter dinheiro suficiente para cumprir suas obrigações e serviços públicos de fazer chorar. E sem soluções à vista.

Tudo porque o debate continua equivocado. As mudanças só ocorrerão para valer e no sentido correto quando primeiro se olhar para o lado das despesas. Inicialmente, é preciso que a reforma do Estado faça a poda de inutilidades e ineficiências. E como estamos nisso? Em lugar nenhum? Por exemplo: o que é da comissão comandada pelo empresário Jorge Gerdau exatamente com esse fito? Quais resultados apresentou até agora? A verdadeira coragem da presidente será mostrada quando ela peitar as estruturas da burocracia e o corpo político-partidário.

Sem isso, ninguém tenha a ilusão de que os impostos possam cair no Brasil para valer e permanentemente.

José Márcio Mendonça é jornalista e analista político

Passeio de nota fiscal 2.0

Fonte: Info Exame (São Paulo – SP) – 22/05/2012

São Paulo – O manicômio tributário brasileiro oferece um vasto espaço para a atua­ção de sonegadores. Apenas no que diz respeito ao imposto sobre circulação de mercadorias e serviços (ICMS), cada estado tem sua própria legislação, com um total de 3.500 normas em constante mutação.

Nos últimos anos, esse emaranhado se complicou ainda mais com o agravamento da guerra fiscal entre estados e municípios para atrair empresas e aumentar sua arrecadação. É fácil entender o apetite pelo ICMS. A arrecadação do imposto aumentou 33% desde 2009 e se aproximou de 300 bilhões de reais no ano passado.

A principal arma utilizada na guerra é a oferta de redução no tributo. Como resultado, vigoram no país mais de 40 alíquotas diferentes de ICMS, variando de 4% a 25%. E o que poderia ser bom — pagar menos imposto — se tornou um campo fértil para o crime.

O golpe mais aplicado é o passeio da nota fiscal. Há alguns anos, os golpistas elaboravam uma verdadeira engenharia logística para fraudar: partindo de um estado produtor, as mercadorias viajavam para estados com tributo menor. O passeio servia para esquentar a nota, registrando o produto como se tivesse sido produzido no estado que cobra menos imposto.

Depois, o bem voltava ao ponto de partida, geralmente São Paulo, para ser consumido. Com a criação da nota eletrônica, um clique no computador passou a ser suficiente para emitir o documento — são 180 milhões por mês no país. E aí nasceu o passeio 2.0: a nota fiscal cumpre virtualmente o trajeto para outros estados, mas o produto não sai do lugar.

Para simular que algo foi produzido num estado distante, basta enviar a nota para lá e depois fazer o inverso. Por mágica, o produto “muda” de origem. “A diferença de ICMS induz o desonesto a simular um destino fictício”, diz Clóvis Panzarini, ex-coordenador da Secretaria da Fazenda paulista.

Embora alguns estados e algumas empresas possam ter ganhos com a fraude, a economia do país só tem a perder. “A guerra fiscal promove distorção nas decisões de investimento, eleva custos e prejudica as empresas que andam dentro da lei”, diz o economista Paulo Rabello de Castro.

Para tentar acabar com a guerra, o governo federal discute com estados a unificação das alíquotas interestaduais — hoje elas são de 7% e 12%. Mas a negociação deve demorar. Enquanto isso, o passeio de nota viceja, como mostram três exemplos a seguir, nos mercados de etanol, medicamentos e aço.

Etanol

Desde 2007, para evitar fraudes, o governo determinou que as 16 refinarias do país centralizassem o recolhimento de impostos sobre a gasolina e o óleo diesel. O etanol, porém, por ser produzido em centenas de usinas, ficou de fora — e se tornou o alvo preferido de distribuidores desonestos.

Os fraudadores criam distribuidoras em estados como Goiás, onde a alíquota do ICMS é inferior à de São Paulo, o principal estado produtor. “O esquema é montado com uma empresa legalmente constituída, mas em nome de laranjas”, diz Alísio Vaz, presidente do sindicato das distribuidoras de combustíveis.

A empresa serve apenas para simular a passagem do etanol e emitir a nota fiscal eletrônica, obtendo o benefício do imposto menor. Mas só a nota viaja a Goiás. O combustível segue direto do produtor para postos que participam do esquema e que, assim, oferecem etanol a preço baixo — tirando clientes dos concorrentes que atuam na legalidade.

A fraude, porém, não termina no passeio da nota. Com o tempo, os fraudadores passam a sonegar todos os impostos. Quando são multados, abandonam a distribuidora e recomeçam com o nome de outro laranja. Sete empresas estão atualmente sob investigação — a Agência Nacional do Petróleo não divulga quais são.

Medicamentos

os medicamentos são um dos produtos mais afetados pelo passeio de nota fiscal. A existência de 82 000 farmácias dispersas pelo país — 90% delas pequenas — e as margens apertadas do setor facilitam a atuação dos picaretas, pois ganhos no imposto podem aumentar o lucro dos comerciantes.

As fraudes com remédios são antigas, mas recentemente incorporaram a tecnologia. Até três anos atrás, a carga e a nota fiscal de papel faziam um bate-volta: viajavam de estados que são produtores, como São Paulo e Rio de Janeiro, onde o ICMS é mais pesado, até, por exemplo, o Distrito Federal, que cobra um tributo menor.

Depois, a carga voltava à origem para ser vendida. Agora, com um clique no computador, é emitida a nota eletrônica como se a carga tivesse cumprido o mesmo trajeto. O novo esquema é chamado de carrossel: a nota faz uma volta para chegar ao mesmo lugar e a carga fica parada. “A diferença de alguns pontos percentuais incentiva o passeio de notas no atacado”, diz Ronaldo de Carvalho, dono da rede Drogaria São Paulo.

Aço

Longe de diminuir, a guerra fiscal entre os estados tem evoluído com novos formatos. O que ganhou mais espaço recentemente foi a oferta de  benefícios fiscais específicos para produtos importados. Em portos como Itajaí, em Santa Catarina, e Vitória, no Espírito Santo, isso passou a ser feito para atrair cargas vindas do exterior e destinadas a outros estados.

Assim, um produto que vai ser vendido em São Paulo, em vez de desembarcar em Santos, utiliza um terminal de um estado que cobra ICMS menor. As empresas que desembaraçam seus produtos importados nesses portos pagam uma pequena parcela de ICMS ao estado e recebem um crédito tributário como se tivessem recolhido integralmente o imposto.

A diferença é cobrada do estado de destino e se transforma em lucro. No mercado de distribuição de aço, esse novo cenário da guerra fiscal está propiciando mais uma trambicagem: o passeio de nota fiscal internacional. Distribuidores desonestos passaram a simular que cargas de produtos brasileiros vieram de países como China ou Itália.

Mas, na realidade, apenas a nota fiscal foi emitida eletronicamente como se o aço tivesse origem no exterior. Com a operação, os enganadores conseguem vender aço a preço até 8% mais barato que a média do mercado, o equivalente a 224 reais por tonelada.

“Dependendo do crédito tributário obtido pelo distribuidor no porto, a vantagem em relação ao preço do meu produto chega a 12%”, afirma um empresário do setor que pediu anonimato. A solução para acabar com esse tipo de golpe está em discussão no Senado: definir uma alíquota única de ICMS para os bens importados.

“A guerra dos portos patrocinada por alguns estados exige uma solução urgente para acabar com fraudes como o passeio de nota internacional”, diz Marco Polo Lopes, presidente do Instituto Aço Brasil.

Economistas criticam medidas de estímulo anunciadas pelo governo

Fonte: O Globo Online (Rio de Janeiro – RJ) – 21/05/2012

Eles dizem que cortes têm efeitos limitados e de curto prazo e defendem reformas mais profundas

As medidas de incentivo à economia anunciadas na noite desta segunda-feira pelo Ministério da Fazenda – redução de IPI para automóveis e de juros para algumas linhas de financiamento do BNDES – podem não gerar o impacto esperado, segundo economistas. Para eles, o governo pode até gerar alguma melhoria de curto prazo, mas isso não será duradouro e pode, inclusive, aumentar o risco de aumento da inadimplência no futuro.

O professor Armando Castelar, da UFRJ, acredita que, dado os fracos números da atividade econômica, o governo acerta em propor estímulos à economia. Ele, contudo, acredita que a repetição do modelo de corte de IPI e redução dos juros de algumas linhas do BNDES podem não surtir a eficácia esperada:

– Acredito que estamos perto da exaustão de um modelo que teve grande sucesso entre 2005 e 2010, com o incetivo ao consumo baseado no aumento do financiamento. As famílias estão muito endividadas. Este modelo pode gerar problemas futuros de inadimplência, que já está preocupante mesmo com emprego e renda e alta. O governo precisava se perguntar o motivo da economia continuar patinando, mesmo com juros tão baixos, e rever o modelo, buscar uma forma de se incentivar o investimento – afirmou o professor.

Ele acredita que medidas mais horizontais, como redução na burocracia e de impostos de forma mais linear, poderiam surtir mais efeitos. Castelar questiona, inclusive, a redução de juros do BNDES:

– Essa redução impacta mais as grandes empresas. E os empresários não lamentam a falta de financiamento, mas a burocracia, problemas tributários e trabalhistas. O governo precisa melhorar o ambiente de negócios. Os resultados podem demorar um pouco mais, mas é algo mais duradouro – disse.

Carlos Langoni, professor de economia da FGV e ex-presidente do BC, concorda que as medidas poderão gerar algum alívio de curto prazo, mas que isso não será suficiente. Em sua opinião, o governo deveria aproveitar o momento para retomar uma agenda de reforma audaciosa, focada principalmente na reforma tributária.

– O governo está usando incentivos pontuais e seletivos, que têm efeito positivo, porém limitado. Além disso, o esforço total do governo tem sido na redução dos juros. Eu não acho que o problema esteja na demanda, mas na oferta. O governo precisa incentivar o investimento, mas o Brasil atualmente pune o investimento, a poupança e o emprego formal. O governo poderia aproveitar o momento da economia mundial, de uma longa estagnação das economias desenvolvidas e de uma forte desaceleração dos grandes emergentes, como a China, para votar a reforma tributária, o que teria grande apoio da sociedade – disse.

O professor Fábio Kanzuc, da USP, afirma que o impacto positivo destas medidas que se repetem são cada vez menores:

– A população está muito endividada, medidas como esta ficam cada vez mais ineficientes. E, além do limite do endividamento das famílias, há o limite das cidades, que já estão lotadas de carros – disse.

Nova regra no e-commerce pode garantir R$ 40 mi à SC

Fonte: Diário Catarinense (Florianópolis – SC) – 21/05/2012

Proposta para a redistribuição do imposto entre os Estados ainda precisa passar pela aprovação do plenário do Senado

As mudanças que devem ocorrer na partilha dos ICMS de produtos comprados pela internet ou vendidos em programas de televisão podem gerar R$ 40 milhões para Santa Catarina a partir do próximo ano. Hoje, todo o imposto fica com o Estado onde estão os centros de distribuição das empresas vendedoras, que estão concentrados no Sudeste. A proposta é de que, a partir de 2013, os recursos sejam divididos.

O secretário da Fazenda de Santa Catarina, Nelson Serpa, conta que pelas novas regras 40% do ICMS das compras pela internet ficará com o Estado do centro de distribuição e 60% no local onde mora o comprador do produto.

Ele lembra, ainda, que o montante recolhido por Santa Catarina deve aumentar ao longo dos anos porque o comércio na internet está crescendo de maneira consistente (veja quadro). Desde 2007, triplicou de volume e fechou ano passado em R$ 18,7 bilhões, conforme dados da consultoria e-bit. E dos 8,5 novos milhões de novos consumidores online conquistados no ano passado, 61% pertenciam a classe C. A previsão continua positiva e entre janeiro e dezembro deste ano devem ser comercializados R$ 23,4 bilhões em produtos no país.

Mas antes do governo catarinense poder contar com o dinheiro, é preciso que o projeto seja aprovado no Senado Federal. O ambiente político é bastante favorável, informa a assessoria do Ministério das Relações Institucionais. O secretário da Fazenda de SC diz que a proposta passou na Comissão de Constituição e Justiça e, agora, haverá uma audiência pública neste mês na Comissão de Assuntos Econômicos. Ele estará presente e adianta que o clima é bom porque a maioria dos estados será beneficiada. Hoje, os centros de distribuição estão concentrados em São Paulo e há presença menos expressiva no Rio de Janeiro e em Minas Gerais.

Outro aliado de muito peso é o próprio governo federal. Serpa lembra que, na reforma tributária, a equipe do Ministério da Fazenda defende que o ICMS fique com os estados onde estão os compradores.

De acordo com Serpa, o Estado está entre os principais mercados de produtos vendidos pela internet no Brasil. A lista de compras segue a relação nacional e consiste em produtos de informática, eletrodomésticos e itens de saúde e beleza. Outro fator favorável é a penetração da internet em Santa Catarina. Estudo realizado pela Fundação Getúlio Vargas e Fundação Telefônica, divulgado semana passada, mostra que 41,66% dos computadores existentes nas cidades catarinenses estão conectados. A média nacional é de 33%. Florianópolis também se destaca: é a Capital com maior inclusão digital, 62,1%.