Brasil é líder mundial em tributação de remédio

Folha de S. Paulo – 19/08/2012

Entre 38 países, o Brasil é hoje recordista no nível de tributação sobre os medicamentos vendidos nas farmácias sob prescrição.

A somatória das alíquotas de impostos federais e estaduais incidentes sobre o produto, de 28%, é três vezes maior que a média obtida entre os países do estudo. Alguns, como Canadá, México e Reino Unido, têm alíquota zero sobre os remédios.

A constatação é de um estudo inédito elaborado pelo pesquisador Nick Bosanquet, professor de políticas de saúde do Imperial College, em Londres, que considerou os impostos sobre consumo em cada um dos países.

No Brasil, foram contabilizados o ICMS, imposto cobrado pelos governos dos Estados, e o PIS/Cofins, cobrado pelo governo federal.

O ranking faz parte de uma publicação da Interfarma (Associação da Indústria Farmacêutica de Pesquisa), que será divulgada amanhã.

GASTOS PESSOAIS

O nível recorde de tributação tem impacto direto no bolso dos consumidores, uma vez que, no mercado brasileiro, os gastos com remédios não são reembolsados pelo Estado ou pelos planos de saúde, como ocorre em países desenvolvidos.

No mercado farmacêutico brasileiro, cujo faturamento somou R$ 42,8 bilhões em 2011, segundo dados do instituto IMS Health, 71,4% do desembolso é realizado diretamente pela população.

Nos países europeus, de 10% a 15% dos gastos são assumidos pelo consumidor.

“O consumidor tira do próprio bolso para financiar seu tratamento e ainda paga o maior tributo do mundo”, diz Antonio Brito, presidente da Interfarma. “A soma das duas situações é explosiva.”

A eliminação de tributos sobre medicamentos prescritos pode aumentar as vendas em 2,5% a 5%, diz o estudo.

Esse impacto ocorreria sobretudo entre os consumidores de menor renda.

Dados do IBGE mostram que o desembolso das famílias de classe E em medicamentos é de R$ 7 por mês.

Os mais ricos gastam por mês R$ 97, enquanto a média nacional é de R$ 38,60.

“Esses números mostram que o acesso aos medicamentos depende exclusivamente da renda do brasileiro”, afirma Brito.

ICMS

Segundo o tributarista Bruno Coutinho de Aguiar, do escritório Rayes e Fagundes, o grande vilão da tributação no setor farmacêutico é o ICMS.

A alíquota do imposto dos Estados é de, em média, 17%.

“Um produto essencial como o medicamento tem uma alíquota maior que a de automóveis, por exemplo.”

Marcelo Liebhard, diretor de assuntos econômicos da Interfarma, diz que, em muitos Estados, o valor arrecadado com o ICMS sobre medicamentos é superior à quantia gasta pelo governo na distribuição de medicamentos.

“Isso ocorre em São Paulo, onde são recolhidos R$ 3 bilhões de imposto.”

Segundo os especialistas, o preço impeditivo faz com que cresçam as demandas na Justiça pedindo o fornecimento de medicamentos pelo governo. Estima-se que existam 200 mil processos na Justiça brasileira com esse tipo de solicitação.

Três perguntas para Hamilton Dias de Souza

O advogado tributarista e membro do Conselho Consultivo do ETCO Hamilton Dias de Souza dá detalhes sobre a regulamentação do artigo 146-A, que entrou na Constituição Federal em 2003 para permitir que critérios especiais de tributação evitem desequilíbrios concorrenciais tributários.

De que forma a regulamentação do artigo 146-A poderá estabelecer critérios especiais de tributação?

Não é a lei complementar que vai definir os sistemas especiais de tributação. Ela apenas vai criar a moldura dentro da qual União, Estados e municípios poderão disciplinar essas questões. Até porque, é impossível tratar desse assunto nos mais de 5.500 municípios que nós temos no País. O trabalho deve ser no âmbito estadual ou municipal, onde cada um criará ou tratará do assunto de acordo com a sua própria legislação. Vale lembrar que o artigo 146-A não é uma norma que permite cobrar tributos. Ele também não é voltado para os interesses do Fisco, mas sim para a proteção da concorrência e do mercado.

A lei complementar visa prevenir os desequilíbrios concorrenciais de qual origem?

A lei complementar visa prevenir desequilíbrios provocados pelo contribuinte e não os provocados pelo Fisco ou pela norma tributária. Se houver uma norma tributária que, em si, provoque um desequilíbrio concorrencial tributário, ela vai ser inconstitucional. Trata-se, portanto, de coibir os desvios praticados por aqueles contribuintes que, de uma forma ou de outra, deixam de pagar sistematicamente e atrapalham o mercado como um todo. Não atrapalham o concorrente, mas sim a concorrência. Portanto, não se trata de um problema entre particulares, e sim do que é prejudicial ao mercado e à economia de modo geral.

Como definir critérios para estabelecer o limite dos incentivos fiscais?

O limite, na minha opinião, é o da livre concorrência. Se através de um incentivo fiscal, determinado Estado chegar ao ponto de afetar o mercado, ele inevitavelmente poderá infringir o princípio da livre concorrência, que é consagrado no artigo nº 170 da Constituição. Não sou contra o incentivo, porém acredito que os parâmetros devem ser estabelecidos por cláusulas gerais e isso tem que ser verificado em casos concretos. Se, atualmente, o Confaz tivesse um sistema capaz de apurar qual é a racionalidade dos incentivos, a definição poderia ser mais concreta e adequada.

Simplificação do sistema tributário e lei contra concorrência desleal são debatidas por especialistas

Encontro realizado pelo ETCO, na última semana de julho, reuniu representantes do instituto e imprensa especializada em torno do tema “Tributação e Negócios: Entrave ou Instrumento para o Desenvolvimento”. Com a presença dos tributaristas Everardo Maciel e Hamilton Dias de Souza e do presidente-executivo do ETCO, Roberto Abdenur, foram discutidos assuntos como simplificação do sistema tributário e regulamentação do artigo 146-A da Constituição. 

Atualmente, a incidência de tributos responde por 36% do Produto Interno Bruto (PIB) brasileiro. Esse dado por si só não deveria causar tanta preocupação, uma vez que, como é sabido, países com alto nível de desenvolvimento apresentam cargas até mais elevadas. A questão se torna preocupante quando a carga tributária é comparada com o PIB per capita desses países.   

    

O presidente-executivo do ETCO, Roberto Abdenur, explica que “apesar de ser vital para o País, o atual sistema tributário é considerado como um dos principais entraves para o desenvolvimento econômico”. Abdenur ressalta ainda como um dos principais impactos causados pela alta carga tributária na economia, a elevação do custo da produção da indústria, que desestimula os investimentos.

Dados da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp) mostram que, no Brasil, 64% dos empresários apontam a carga tributária como limitadora dos investimentos e 59% deles assinalam a mesma como principal obstáculo à inovação. A situação é ainda pior quando essa mesma carga é avaliada junto ao Índice de Desenvolvimento Humano (IDH).

“Enquanto a carga tributária brasileira aumentou 24,4% entre 1994 e 2007, o IDH cresceu apenas 10,7%, o que comprova que o aumento dos impostos não está favorecendo o desenvolvimento da população”, explica Abdenur.

Abdenur também cita que, na América Latina, o Brasil é o país com maior peso tributário. Está acima da Argentina (30,6%), que enfrenta um longo período de problemas econômicos, assim como da média da região, que é de 20,9%.

“Ao levar em conta ainda a burocracia do nosso sistema tributário, segundo estudo do Banco Mundial, o Brasil também aparece mal posicionado”, complementa Abdenur. Enquanto na Suíça – que tem uma carga semelhante à brasileira – as empresas gastam 63 horas para pagar impostos básicos, aqui o tempo padrão é de 2.600 horas, o pior do mundo.

O ex-secretário da Receita Federal e membro do Conselho Consultivo do ETCO Everardo Maciel apresentou uma das propostas do instituto, cuja base principal é a desburocratização.

Para Maciel, existem algumas medidas que podem ajudar no processo de simplificação e racionalização do sistema tributário. Dentre elas está a unificação das pessoas jurídicas (CNPJ) nos cadastros federal, estadual e municipal. “Queremos introduzir isso no Código Tributário Nacional. Não faz sentido que uma mesma empresa tenha cadastro em cada uma dessas unidades da Federação”, avalia o ex-secretário da Receita Federal.

Outra sugestão é que ocorra a implementação da anterioridade plena. Ou seja, qualquer mudança tem que ter um prazo para ser definida, que no caso da proposta do ETCO é até 30 de junho do ano anterior. Nesse mesmo sentido, o instituto sugere que ocorra a consolidação da legislação tributária para todos os tributos até 31 de setembro.

O advogado tributarista e membro do Conselho Consultivo do ETCO Hamilton Dias de Souza apresentou a proposta de regulamentação do artigo 146-A da Constituição Federal por meio de lei complementar que poderá estabelecer critérios especiais de tributação, “com o objetivo de prevenir desequilíbrios da concorrência, sem prejuízo da competência de a União, por lei, estabelecer normas de igual objetivo”. A intenção é permitir aos Estados e municípios a melhora da concorrência das companhias.

“Essa lei não cria os critérios de tributação, mas permite que União, Estados e municípios os criem e cabe a uma lei complementar fazer uma moldura para tais tributos”, explica Dias de Souza, que foi um dos responsáveis pela redação do artigo.

Artigo – A boa notícia, um alerta e os impostos

Fonte: O Estado de S. Paulo (São Paulo – SP) – 23 de julho de 2012

por Roberto Abdenur*

Traz uma boa notícia o Índice de Economia Subterrânea (IES), estudo que estima os valores de atividades deliberadamente não declaradas aos poderes públicos com o objetivo de sonegar impostos e das de quem se encontra na informalidade por força da tributação e da burocracia excessivas. Em 2011 ele representou 16,8% do produto interno bruto (PIB), o que corresponde a R$ 695,7 bilhões.

A notícia é muito boa porque, no ano anterior, o tamanho estimado do IES foi de 17,7% do PIB, ou R$ 715,1 bilhões. O estudo sobre o IES vem sendo realizado pelo Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getúlio Vargas, em conjunto com o Instituto Brasileiro de Ética Concorrencial (Etco) desde 2003, quando a economia subterrânea foi estimada em 21% do PIB.

Entre 2004 e 2006 o tamanho estimado dessa economia ficou em torno de 20%. Em 2007 baixou para 19,5%, como resultado do aumento do trabalho formal. A situação econômica do País, o crescimento da classe C e as boas perspectivas para o futuro comprovavam a tendência de formalização do emprego. Em 2008 e 2009, o IES foi de 18,7% e 18,5%, respectivamente, o que seguiu confirmando a tendência de redução das atividades que correm à margem da economia formal.

Aí vem o alerta. Chegar aos níveis dos países desenvolvidos – onde o IES fica ao redor de 10% – parece distante, apesar do número de 2011 (16,8%). É que a tendência de queda pode estar chegando temporariamente ao limite no Brasil, em razão da perda do dinamismo da economia e da redução do ritmo de aumento do crédito.

A perda do dinamismo da economia traduz-se pela perspectiva de um PIB menor. Isso tende a afetar o mercado de trabalho, o que agrava o endividamento das famílias e dificulta o crédito. Passou o momento de deslumbramento com o consumo da nova classe média, ao se perceber que tudo dependia de numerosas prestações a serem honradas.

Ademais da desaceleração da economia, a alta carga tributária também é fator de informalização das atividades no País. O atual sistema tributário eleva o custo da produção da indústria, prejudica a competitividade interna e externa, desestimula os investimentos, diminui o consumo, aumenta o desemprego, estimula a sonegação fiscal e, como resultado geral, contribui para a informalidade e a economia subterrânea.

Comparando carga tributária e PIB per capita, o Brasil fica muito mal colocado, segundo dados do Banco Mundial. Os tributos no País (36% do PIB) estão no mesmo nível da Rússia, Irlanda e Austrália e superam Estados Unidos e Coreia do Sul. Mas esses países têm PIB per capita maior (de três a cinco vezes) que o nosso. Por outro lado, nossos impostos superam os de países como China e Índia, além de Argentina e México, que têm PIB per capita mais semelhante ao brasileiro e conosco competem.

A cobrança de tributos é vital para o Estado, mas o sistema tributário deve estar em harmonia com outros fatores inerentes à atividade econômica. No Brasil, além da carga tributária elevada, o problema reside na complexidade para o pagamento de impostos e na rigidez da legislação para quem atua na legalidade.

Outro estudo do Banco Mundial, denominado Paying Taxes, mostrou que, em 2008, uma empresa-padrão gastava nada menos que 2.600 horas no ano para pagar os impostos básicos no Brasil. Foi o pior resultado em todo o mundo. Nos Emirados Árabes Unidos, por exemplo, eram 12 horas; na Suíça, 63; na Venezuela, 864.

O tempo gasto é consequência direta da complexidade da legislação tributária, que de 1988 a 2005 teve incríveis 3,4 milhões de normas editadas. A demora na simplificação e racionalização do sistema tributário tem sido um dos maiores obstáculos à modernização da economia brasileira. Na medida em que tal complexidade é usada como justificativa para a sonegação de impostos, beneficia transgressores, deteriora o ambiente de negócios, afasta investimentos e reduz o potencial de crescimento do País.

Um sistema mais simples, ao contrário, fomenta o setor produtivo, incentiva o consumo, promove o emprego formal, eleva a renda dos trabalhadores, diminui a sonegação fiscal e reduz a informalidade. Não se trata, na presente etapa, de promover uma ampla reforma tributária – que pode exigir anos de debates e ajustes -, mas de estudar propostas pontuais que poderão ter resultados quase imediatos. Entre essas propostas estão a unificação de impostos e taxas com os mesmos base de cálculo e fato gerador, como bens e serviços (IPI, ICMS, ISS), faturamento (PIS, Cofins), renda (IR, Contribuição Social) ou importação (IPI, ICMS, ISS, Cofins, tarifas).

Diante da tendência apontada pelo Índice de Economia Subterrânea e do cenário global, é preciso, agora, um esforço conjunto – dos Poderes Executivo, Legislativo e Judiciário com a sociedade – para estimular a formalidade na economia brasileira.

Vivemos um momento ímpar em nossa história econômica, propício para a revisão de uma série de regras que, historicamente, impedem o crescimento saudável da nossa economia. O louvável esforço da presidente Dilma Rousseff para pôr fim à chamada guerra fiscal e avançar na modernização das regras tributárias, bem como a instituição do microempresário individual – apenas para citar dois fatos recentes -, são exemplos dentre inúmeras propostas que devem ser avaliadas e postas em prática.

Está claro que só existe um caminho para reduzir o tamanho da economia subterrânea. E esse caminho consta de cinco medidas: aprimorar o sistema tributário, reduzir a sonegação fiscal, reduzir o comércio ilegal e a pirataria, reduzir a economia informal e, não menos importante, combater a corrupção. Temos avançado nessas frentes, mas ainda há muito por fazer.

* DIPLOMATA, É PRESIDENTE EXECUTIVO DO ETCO

Norte de Santa Catarina realiza mobilização por menos impostos

Fonte: Jornal de Santa Catarina (Blumenau – SC) – 31/05/2012

Venda de combustível mais barato nesta quinta e propostas no Congresso Nacional em defesa da redução dos tributos estão entre as iniciativas

Quase 41% dos rendimentos do consumidor brasileiro devem voltar para os cofres do governo neste ano sob a forma de impostos, taxas e contribuições, segundo estimativas do Instituto Brasileiro de Planejamento Tributário (IBPT). A alta na carga tributária é a quarta seguida. É como se as pessoas tivessem de trabalhar até quarta-feira para atender às necessidades do setor público.

Uma série de iniciativas estão sendo tomadas em Joinville e Barra Velha para conscientizar a população do peso dos tributos no orçamento das famílias. Núcleos de jovens empresários programaram a venda de combustíveis sem impostos em postos das duas cidades;

— Não somos contra o pagamento de impostos, só queremos que haja uma melhor aplicação desses recursos por parte dos governos. Por isso organizamos o Dia da Liberdade de Impostos, para conscientizar a sociedade para que cobre uma educação de qualidade e um serviço de saúde de excelência. Pagamos praticamente cinco meses de trabalho em impostos para o governo. Não é justo que tenhamos ainda de pagar escola particular ou plano de saúde se quisermos ter uma vida melhor —, diz Douglas Hoffmann, um dos coordenadores da ação em Joinville.

Na semana passada, representantes do Movimento Brasil Eficiente (MBE), que prega mais eficiência na utilização dos recursos públicos, esteve em Brasília para discutir a necessidade urgente de uma reforma tributária. O empresário joinvilense Carlos Schneider, um dos líderes do MBE, discursou na Câmara de Deputados, falando sobre a necessidade da racionalização dos gastos públicos.

O coordenador do MBE, Paulo Rabello de Castro, apresentou uma proposta de reforma tributária para o vice-presidente da República, Michel Temer, e para o ministro da Fazenda, Guido Mantega na quarta-feira. As ideias são simplificar a cobrança dos tributos, melhorar a gestão pública e cortar juros. O projeto prevê a redução da carga tributária de 38%, neste ano, para 30%, em 2022.

O empresário Sérgio Rodrigues Alves, que preside a Câmara de Assuntos Tributários e Legislativos da Fiesc, dá um bom exemplo do quanto os impostos impedem que as empresas brasileiras sejam mais fortes.

— Hoje a carga tributária no Brasil representa 38% do PIB, enquanto na China esse índice não chega a 20%.

As iniciativas para mudanças imediatas nesta situação são pontuais. O secretário executivo do Ministério da Fazenda, Nelson Barbosa, confirmou quarta-feira que o governo discute a simplificação da cobrança de PIS e Cofins, segundo proposta apresentada pelo setor empresarial.

Senadores

Com forte base eleitoral no Norte do Estado, os senadores Luiz Henrique da Silveira e Paulo Bauer defendem ações que apresentam propostas para a redução de impostos no País.

No início desta semana, em Brasília, LHS reforçou estratégia para diminuir impostos que possam ter impacto na mobilidade urbana. Segundo ele, esta é uma ação que pede a integração entre órgãos municipais, estaduais e federais.

Bauer defende duas propostas de emendas à constituição (PEC). Em reunião, quarta-feira, com o ministro da Saúde, Alexandre Padilha, o parlamentar recebeu apoio para a proposta que mira imposto zero sobre qualquer remédio.

Hoje, os brasileiros pagam 34% de tributos. Além disso, Bauer é autor de outra ação que prevê incentivos fiscais a empresas que usam materiais recicláveis.

— Esta mobilização deixa claro que a classe política entende a importância da redução dos impostos —, diz.

Passeio de nota fiscal 2.0

Fonte: Info Exame (São Paulo – SP) – 22/05/2012

São Paulo – O manicômio tributário brasileiro oferece um vasto espaço para a atua­ção de sonegadores. Apenas no que diz respeito ao imposto sobre circulação de mercadorias e serviços (ICMS), cada estado tem sua própria legislação, com um total de 3.500 normas em constante mutação.

Nos últimos anos, esse emaranhado se complicou ainda mais com o agravamento da guerra fiscal entre estados e municípios para atrair empresas e aumentar sua arrecadação. É fácil entender o apetite pelo ICMS. A arrecadação do imposto aumentou 33% desde 2009 e se aproximou de 300 bilhões de reais no ano passado.

A principal arma utilizada na guerra é a oferta de redução no tributo. Como resultado, vigoram no país mais de 40 alíquotas diferentes de ICMS, variando de 4% a 25%. E o que poderia ser bom — pagar menos imposto — se tornou um campo fértil para o crime.

O golpe mais aplicado é o passeio da nota fiscal. Há alguns anos, os golpistas elaboravam uma verdadeira engenharia logística para fraudar: partindo de um estado produtor, as mercadorias viajavam para estados com tributo menor. O passeio servia para esquentar a nota, registrando o produto como se tivesse sido produzido no estado que cobra menos imposto.

Depois, o bem voltava ao ponto de partida, geralmente São Paulo, para ser consumido. Com a criação da nota eletrônica, um clique no computador passou a ser suficiente para emitir o documento — são 180 milhões por mês no país. E aí nasceu o passeio 2.0: a nota fiscal cumpre virtualmente o trajeto para outros estados, mas o produto não sai do lugar.

Para simular que algo foi produzido num estado distante, basta enviar a nota para lá e depois fazer o inverso. Por mágica, o produto “muda” de origem. “A diferença de ICMS induz o desonesto a simular um destino fictício”, diz Clóvis Panzarini, ex-coordenador da Secretaria da Fazenda paulista.

Embora alguns estados e algumas empresas possam ter ganhos com a fraude, a economia do país só tem a perder. “A guerra fiscal promove distorção nas decisões de investimento, eleva custos e prejudica as empresas que andam dentro da lei”, diz o economista Paulo Rabello de Castro.

Para tentar acabar com a guerra, o governo federal discute com estados a unificação das alíquotas interestaduais — hoje elas são de 7% e 12%. Mas a negociação deve demorar. Enquanto isso, o passeio de nota viceja, como mostram três exemplos a seguir, nos mercados de etanol, medicamentos e aço.

Etanol

Desde 2007, para evitar fraudes, o governo determinou que as 16 refinarias do país centralizassem o recolhimento de impostos sobre a gasolina e o óleo diesel. O etanol, porém, por ser produzido em centenas de usinas, ficou de fora — e se tornou o alvo preferido de distribuidores desonestos.

Os fraudadores criam distribuidoras em estados como Goiás, onde a alíquota do ICMS é inferior à de São Paulo, o principal estado produtor. “O esquema é montado com uma empresa legalmente constituída, mas em nome de laranjas”, diz Alísio Vaz, presidente do sindicato das distribuidoras de combustíveis.

A empresa serve apenas para simular a passagem do etanol e emitir a nota fiscal eletrônica, obtendo o benefício do imposto menor. Mas só a nota viaja a Goiás. O combustível segue direto do produtor para postos que participam do esquema e que, assim, oferecem etanol a preço baixo — tirando clientes dos concorrentes que atuam na legalidade.

A fraude, porém, não termina no passeio da nota. Com o tempo, os fraudadores passam a sonegar todos os impostos. Quando são multados, abandonam a distribuidora e recomeçam com o nome de outro laranja. Sete empresas estão atualmente sob investigação — a Agência Nacional do Petróleo não divulga quais são.

Medicamentos

os medicamentos são um dos produtos mais afetados pelo passeio de nota fiscal. A existência de 82 000 farmácias dispersas pelo país — 90% delas pequenas — e as margens apertadas do setor facilitam a atuação dos picaretas, pois ganhos no imposto podem aumentar o lucro dos comerciantes.

As fraudes com remédios são antigas, mas recentemente incorporaram a tecnologia. Até três anos atrás, a carga e a nota fiscal de papel faziam um bate-volta: viajavam de estados que são produtores, como São Paulo e Rio de Janeiro, onde o ICMS é mais pesado, até, por exemplo, o Distrito Federal, que cobra um tributo menor.

Depois, a carga voltava à origem para ser vendida. Agora, com um clique no computador, é emitida a nota eletrônica como se a carga tivesse cumprido o mesmo trajeto. O novo esquema é chamado de carrossel: a nota faz uma volta para chegar ao mesmo lugar e a carga fica parada. “A diferença de alguns pontos percentuais incentiva o passeio de notas no atacado”, diz Ronaldo de Carvalho, dono da rede Drogaria São Paulo.

Aço

Longe de diminuir, a guerra fiscal entre os estados tem evoluído com novos formatos. O que ganhou mais espaço recentemente foi a oferta de  benefícios fiscais específicos para produtos importados. Em portos como Itajaí, em Santa Catarina, e Vitória, no Espírito Santo, isso passou a ser feito para atrair cargas vindas do exterior e destinadas a outros estados.

Assim, um produto que vai ser vendido em São Paulo, em vez de desembarcar em Santos, utiliza um terminal de um estado que cobra ICMS menor. As empresas que desembaraçam seus produtos importados nesses portos pagam uma pequena parcela de ICMS ao estado e recebem um crédito tributário como se tivessem recolhido integralmente o imposto.

A diferença é cobrada do estado de destino e se transforma em lucro. No mercado de distribuição de aço, esse novo cenário da guerra fiscal está propiciando mais uma trambicagem: o passeio de nota fiscal internacional. Distribuidores desonestos passaram a simular que cargas de produtos brasileiros vieram de países como China ou Itália.

Mas, na realidade, apenas a nota fiscal foi emitida eletronicamente como se o aço tivesse origem no exterior. Com a operação, os enganadores conseguem vender aço a preço até 8% mais barato que a média do mercado, o equivalente a 224 reais por tonelada.

“Dependendo do crédito tributário obtido pelo distribuidor no porto, a vantagem em relação ao preço do meu produto chega a 12%”, afirma um empresário do setor que pediu anonimato. A solução para acabar com esse tipo de golpe está em discussão no Senado: definir uma alíquota única de ICMS para os bens importados.

“A guerra dos portos patrocinada por alguns estados exige uma solução urgente para acabar com fraudes como o passeio de nota internacional”, diz Marco Polo Lopes, presidente do Instituto Aço Brasil.

Economistas criticam medidas de estímulo anunciadas pelo governo

Fonte: O Globo Online (Rio de Janeiro – RJ) – 21/05/2012

Eles dizem que cortes têm efeitos limitados e de curto prazo e defendem reformas mais profundas

As medidas de incentivo à economia anunciadas na noite desta segunda-feira pelo Ministério da Fazenda – redução de IPI para automóveis e de juros para algumas linhas de financiamento do BNDES – podem não gerar o impacto esperado, segundo economistas. Para eles, o governo pode até gerar alguma melhoria de curto prazo, mas isso não será duradouro e pode, inclusive, aumentar o risco de aumento da inadimplência no futuro.

O professor Armando Castelar, da UFRJ, acredita que, dado os fracos números da atividade econômica, o governo acerta em propor estímulos à economia. Ele, contudo, acredita que a repetição do modelo de corte de IPI e redução dos juros de algumas linhas do BNDES podem não surtir a eficácia esperada:

– Acredito que estamos perto da exaustão de um modelo que teve grande sucesso entre 2005 e 2010, com o incetivo ao consumo baseado no aumento do financiamento. As famílias estão muito endividadas. Este modelo pode gerar problemas futuros de inadimplência, que já está preocupante mesmo com emprego e renda e alta. O governo precisava se perguntar o motivo da economia continuar patinando, mesmo com juros tão baixos, e rever o modelo, buscar uma forma de se incentivar o investimento – afirmou o professor.

Ele acredita que medidas mais horizontais, como redução na burocracia e de impostos de forma mais linear, poderiam surtir mais efeitos. Castelar questiona, inclusive, a redução de juros do BNDES:

– Essa redução impacta mais as grandes empresas. E os empresários não lamentam a falta de financiamento, mas a burocracia, problemas tributários e trabalhistas. O governo precisa melhorar o ambiente de negócios. Os resultados podem demorar um pouco mais, mas é algo mais duradouro – disse.

Carlos Langoni, professor de economia da FGV e ex-presidente do BC, concorda que as medidas poderão gerar algum alívio de curto prazo, mas que isso não será suficiente. Em sua opinião, o governo deveria aproveitar o momento para retomar uma agenda de reforma audaciosa, focada principalmente na reforma tributária.

– O governo está usando incentivos pontuais e seletivos, que têm efeito positivo, porém limitado. Além disso, o esforço total do governo tem sido na redução dos juros. Eu não acho que o problema esteja na demanda, mas na oferta. O governo precisa incentivar o investimento, mas o Brasil atualmente pune o investimento, a poupança e o emprego formal. O governo poderia aproveitar o momento da economia mundial, de uma longa estagnação das economias desenvolvidas e de uma forte desaceleração dos grandes emergentes, como a China, para votar a reforma tributária, o que teria grande apoio da sociedade – disse.

O professor Fábio Kanzuc, da USP, afirma que o impacto positivo destas medidas que se repetem são cada vez menores:

– A população está muito endividada, medidas como esta ficam cada vez mais ineficientes. E, além do limite do endividamento das famílias, há o limite das cidades, que já estão lotadas de carros – disse.

Votação da MP com objetivo desvirtuado é adiada

Fonte: DCI (São Paulo – SP) – 17/05/2012

Prestes a perder a validade, a Medida Provisória (MP) 556/2012 proposta pelo Executivo para tratar de isenções de impostos e flexibilizar as regras de licitação da Copa e do PAC teve ontem sua votação adiada mais uma vez. É que, além desse tema polêmico, a proposta altera ainda o Plano de Seguridade do Servidor Público, motivo pelo qual é rejeitada pela oposição e tem sido motivo de desacordo entre os líderes.

O relator dessa MP, deputado Jerônimo Goergen (PP-RS), como bom governista que é, incluiu todas as solicitações do Planalto de ampliar o sistema de licitação simplificada, o chamado Regime Diferenciado de Licitações (RDC) para as obras do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) e para a construção de escolas, creches, postos de saúde e quadras esportivas.

A emenda que estende as regras de licitações do RDC da Copa e das Olimpíadas para as obras do PAC foi enviada de última hora pelo governo e foi o item que mais gerou polêmica entre os parlamentares. A MP vence no dia 31 de maio; portanto, se não for votada na Câmara e no Senado antes dessa data não terá validade alguma. E não poderá ser alvo de outra MP ainda este ano.

A MP 556 foi criada para tratar de isenções de impostos e contribuições para cinco setores. Mas, depois das iniciativas dos parlamentares e do próprio governo, vai mexer na tributação de 16 setores e dá prerrogativas ao Ministério da Fazenda.

Agilidade

O RDC flexibiliza as regras da Lei de Licitações com o objetivo de dar mais agilidade às obras públicas. Permite, por exemplo, a contratação integrada, em que o governo contrata uma só empresa para toda a obra (do projeto ao acabamento) por um único preço, sem aditivos. Na lei de licitações, projeto e obra são etapas distintas.

Além disso, Goergen reforçou que vai rejeitar dois pontos da MP original: o aumento do teto da Cide para o álcool combustível e o fim do crédito presumido para o mercado interno agropecuário. Ele defende que as duas medidas vão impor aumento desnecessário de custos aos produtores de biodiesel e ao setor agropecuário brasileiro. O relator garantiu que as mudanças foram negociadas com o governo, que estaria mais interessado em garantir a ampliação da RDC.

“O governo garantiu que não haverá destaques nem veto a algumas das propostas feitas”, disse. Goergen defende que o RDC vai dar agilidade às construções de creches anunciadas pela presidente Dilma Rousseff. “Isso vai dar eficácia às obras”, defendeu. Ele se reuniu com representantes do DEM e a maioria dos deputados oposicionistas, que antes eram críticos ao RDC, defende a aprovação da Medida Provisória tendo em vista que ela beneficia agricultores e pecuaristas com redução de tributos.

Esta é apenas uma das cerca de 15 mudanças propostas pelo relator. Ele incluiu no texto diversas desonerações a setores como produção de erva-mate, equipamentos de irrigação da seca, e empresas cerealistas que vendem soja para biodiesel, entre outros. “É importante destacar os efeitos econômicos dessas propostas”, disse.

A MP 556 permite desconto de PIS e Cofins só à indústria que exporta produtos originários do agronegócio e que já tiveram benefício fiscal. A MP 552, de 1º de dezembro, tinha acabado com esse desconto para todas as indústrias. Antes da MP 552, todos os industriais poderiam obter esse desconto.

O governo pretende voltar à situação anterior a dezembro do ano passado, ou seja, todas as indústrias vão poder obter o desconto no imposto mesmo que tenham comprado produtos que já tiveram benefício fiscal. O custo para o empresariado e os consumidores fica menor, mas o governo paga a conta. Na negociação de Goergen com o governo, ficou decidido que o imposto pago a mais entre 1º de dezembro e a publicação da lei será devolvido aos industriais.

Se Goergen diz contar com o apoio do DEM, o mesmo não acontece com o PSDB. Bruno Araújo criticou duramente a emenda do governo que amplia um sistema que muda a Lei de Licitações para apressar as obras. “É grave porque a Lei de Licitações, diz o governo, não vale para as suas obras. O governo quer um atalho na lei que tenta suprir a sua incapacidade geral”, afirmou o líder do PSDB. O tucano ainda criticou o “contrabando” da proposta. “A discussão se dá furando fila, pegando carona em outra MP”, disse Araújo.

Lei vira exceção

Para o líder do PSDB, deputado Bruno Araújo (PE), o governo erra ao tentar novamente aprovar um tema tão complexo por meio de medida provisória. Ele também criticou o esvaziamento da Lei de Licitações (8.666/1993).

“Impor o RDC agora a todas as obras do PAC é transformar a lei de licitações em exceção. Essa medida é lesiva ao controle, desmoraliza a Lei e, sobretudo, demonstra fraqueza do governo, que não assume a autoria da proposta”, disse. Nas contas de Goergen, se a MP 556 não for votada logo, não haverá prazo para que o Senado analisasse o texto. Aí, perderia sua validade.