Reforma Tributária: opiniões

Por ETCO

Autor: ETCO

DEM apresentará emenda para garantir redução paulatina de carga fiscal



Valor Econômico, 05/03/2008

O Democratas, maior partido de oposição ao governo Luiz Inácio Lula da Silva no Congresso, tentará incluir na emenda da reforma tributária ou na sua regulamentação infraconstitucional uma garantia de redução paulatina da carga em relação ao Produto Interno Bruto (PIB). Segundo o deputado Rodrigo Maia (RJ), presidente nacional do DEM, esse será um dos principais alvos de intervenção do partido no texto da reforma.

“É claro que é melhor haver algum limite para o aumento da carga do que nenhum. Mas isso não basta”, disse Maia ao Valor, referindo-se à disposição, anunciada anteontem pelo governo, de antecipar o debate – e, se necessário, também o encaminhamento ao Congresso – do projeto de lei complementar que limitará o impacto da substituição de alguns tributos no volume de arrecadação da União e dos Estados.

A proposta do Ministério da Fazenda, cuja minuta será conhecida nos próximos dias, é restringir o aumento da carga tributária apenas no ano da implementação dos novos impostos – 2010, no caso federal, e 2016, no caso estadual, na hipótese de a parte constitucional da reforma ser aprovada ainda em 2008. O mecanismo legal de limitação não seria válido ou aferido nem antes nem depois; só mesmo na passagem para o novo sistema tributário e, ainda assim, apenas em relação ao universo de tributos envolvidos na substituição.

Maia esclareceu que não está nos planos do DEM criar um limite permanente, nem para o nível da carga tributária nem para sua variação anual. O que o Democratas quer é um dispositivo que seja aplicado por um período determinado de tempo, mas que seja longo o suficiente para assegurar redução do volume de tributos em relação ao PIB, sem gerar problemas fiscais para a administração pública. Na visão do DEM, acrescenta o deputado, o problema não é apenas o crescimento da carga tributária de agora em diante, mas também o nível que ela já atingiu, “muito alto”, na sua opinião.

Segundo o último levantamento oficial da Receita Federal, a arrecadação de tributos pela União, por Estados e por Municípios somou o equivalente 34,23% do PIB em 2006, já considerada a nova forma de apuração do produto. Isso representou aumento em relação a 2002, quando a carga tributária foi de 31,86% do PIB.

O governo também não quer elevação da carga, mas, sob o ponto de vista do gerenciamento das contas públicas, acha que não é prudente impor limites artificiais, a não ser no momento da transição para novos impostos. O secretário de Política Econômica do Ministério da Fazenda, Bernard Appy, admite que, feita a transição, o volume de tributos poderá voltar a crescer como proporção do PIB, mas em função do dinamismo da economia e não de elevação de impostos, explica.

Segundo Appy, estudos econômicos mostram que a taxa de crescimento da arrecadação antecipa a tendência do PIB. Se, por um lado, a receita cresce mais rápido do que o PIB quando há aceleração da atividade econômica, de outro lado, também desacelera de forma mais acentuada do que o produto quando este cai. Diante desse comportamento, ele não acha prudente criar limites para a carga tributária como proporção do PIB. Appy alerta que, em momentos de bonança econômica, o país ficaria impedido de aproveitar a fase de “vacas gordas” para aumentar investimentos públicos ou reduzir mais acentuadamente a dívida pública, com superávit fiscais mais elevados. E, em momentos de desaceleração econômica, o país se veria compelido a elevar impostos para empresas e famílias, num movimento pró-cíclico e não anti-cíclico como recomendável. Maia, porém, entende que, antes de se preocupar com isso o país precisa reduzir a sua carga tributária justamente para dar mais dinamismo à economia.

PSDB defende nota fiscal eletrônica, cadastro único e mudança no Confaz
 


Ruy Baron/Valor – 18/12/2007
 
Guerra (Valor)Guerra: “Como é que o governo quer aprovar a reforma tributária em ano eleitoral e com essa volúpia de MPs?”


Com base em proposta que está sendo elaborada pela Subcomissão de Reforma Tributária do Senado, ligada à Comissão de Assuntos Econômicos (CAE), a cúpula do PSDB vai defender três premissas básicas para votar a favor de qualquer reforma tributária no país: a implantação da nota fiscal eletrônica, cadastro único de contribuintes e a completa regulamentação do Conselho Tributário Nacional – em substituição ao Conselho Nacional de Política Fazendária (Confaz), hoje integrado pelos secretários de Fazenda dos Estados.

Essas medidas devem constar do relatório que o senador Francisco Dornelles (PP-RJ) vai apresentar aos integrantes da subcomissão do Senado no próximo dia 25. A subcomissão é presidida pelo senador Tasso Jereissati (PSDB-CE), ex-presidente do seu partido. A proposta relatada por Dornelles deve constar, entre outras medidas, a incorporação de todos os impostos federais indiretos mais o Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) no IVA (Imposto sobre Valor Agregado), legislação federal do IVA com arrecadação e fiscalização dos governos estaduais e incorporação da Contribuição Social Líquida sobre Lucro (CSLL) no Imposto de Renda.

A adoção imediata da nota fiscal eletrônica, a unificação do cadastro de contribuintes e a criação do conselho tributário – entre outras medidas – foram defendidas pelo deputado Luiz Paulo Vellozo Lucas (PSDB-ES), presidente do Instituto Teotônio Vilela (ITV), em reunião com outros integrantes da Executiva Nacional do PSDB na segunda-feira passada. Elas haviam sido propostas pelo economista José Roberto Afonso, do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), em audiência à subcomissão. O PSDB decidiu incorporar as propostas, segundo o presidente nacional, senador Sérgio Guerra (PE).

O PSDB também decidiu apresentar ao governo Luiz Inácio Lula da Silva, como condição para votar a reforma tributária, a suspensão da edição de medidas provisórias nesses meses em que a proposta está tramitando no Congresso. “Como é que o governo quer aprovar a reforma tributária em ano eleitoral e com essa volúpia de MPs?”, pergunta Guerra. Segundo ele, sem as três premissas citadas e sem a suspensão da edição de MPs, a reforma tributária não terá andamento no Congresso.

O presidente do PSDB disse que a posição dos congressistas tucanos na tramitação da proposta de reforma tributária encaminhada pelo governo ao Congresso terá duas “referências”: o trabalho da subcomissão do Senado presidida por Tasso e as propostas de Vellozo Lucas.

Segundo o presidente do ITV, a nota fiscal eletrônica teria modelo único em todo o país, com especificações dos impostos cobrados. “Daria ao atual sistema a transparência que ele não tem, porque hoje o contribuinte não sabe o que paga”, disse Vellozo Lucas.

Com relação ao cadastro de contribuinte, ele constaria de apenas um número para o contribuinte pessoa física e um para pessoa jurídica. Já o Conselho Tributário Nacional seria integrado por representantes do setor produtivo, dos Estados e dos municípios. “São medidas de curto prazo, não para serem implementadas no próximo governo”, diz Vellozo Lucas.

A cúpula tucana não acredita que o governo Luiz Inácio Lula da Silva esteja realmente empenhado na aprovação da reforma tributária. Guerra cita alguns sinais, como o fato de ter incluídos medidas polêmicas, sem uma discussão prévia com os governadores. Além disso, é ano eleitoral – em que os trabalhos no Legislativo praticamente se encerram no primeiro semestre – e há uma enxurrada de MPs sendo enviada pelo governo, trancando a pauta de votações da Câmara e do Senado.


O imperativo da reforma tributária

José Dirceu


EX-MINISTRO CHEFE DA CASA CIVIL


Jornal do Brasil – Cartas, 20/03/2008

Já está na rua a nova pro- posta de reforma tributária, que prevê a unificação do ICMS e a criação do Imposto de Valor Agregado, o IVA. Esse imposto substituirá o PIS, a Confins, a CIDE e o salário-educação, mas já existem propostas, como a do senador Francisco Dornelles (PP/RJ), que extingue também o IPI. A CSLL, Contribuição Sobre o Lucro Líquido, desaparecerá e será incorporada ao Imposto de Renda das pessoas físicas. O ISS será mantido. Com essas medidas, haverá uma extraordinária simplificação do sistema tributário nacional ¬ hoje, temos 27 legislações, o que resulta em aumento do custo de administração dos tributos ¬ com maior transparência para o contribuinte e ganhos de eficiência.

O objetivo da reforma é não só a simplificação do sistema, mas o fim da guerra fiscal entre os Estados, com a unificação do ICMS, e a cobrança do imposto no destino e não na origem, como ocorre hoje. Os Estados produtores, que temem perder arrecadação com a nova forma de cobrança do imposto, serão protegidos com uma alíquota de 2%.

As alterações, indicam os estudos, vão permitir maior justiça tributária entre os Estados e estímulo ao desenvolvimento regional, com a criação do Fundo Nacional de Desenvolvimento Regional ¬ serão R$ 9,5 bilhões ao ano ¬ desoneração dos bens de capital, e, por fim, busca do equilíbrio federativo para compensar perdas dos Estados com a reforma tributária, por meio da criação do Fundo de Equalização das Receitas (R$ 3,5 bilhões ao ano).

O governo estuda, ainda, a desoneração da folha de pagamentos da contribuição patronal, reduzindo a alíquota de 20% para 14%, em seis anos, além de mudanças no Imposto de Renda da pessoa física, para atenuar as distorções que existem hoje e que afetam, particularmente, os trabalhadores qualificados e a classe média. Segundo técnicos do Ministério da Fazenda, haverá uma desoneração geral de R$ 24 bilhões, ou seja, uma desoneração líquida de R$ 9 bilhões a R$ 14 bilhões, já que os Estados terão um ganho estimado entre R$ 10 bilhões e R$ 15 bilhões.

É preciso destacar a coragem do governo federal que, mesmo com a perda da arrecadação proveniente da extinta CPMF (R$ 26 bilhões, já que conseguiu recuperar R$ 12 bilhões com o aumento da alíquota do IOF e da CSLL), manteve a decisão de enviar ao Congresso a proposta de reforma tributária, uma antiga exigência da sociedade brasileira.

A proposta do governo, que foi negociada com governadores e prefeitos, tem tudo para ser aprovada, mesmo havendo propostas alternativas sobre a mesa. Além da apresentada pelo senador Dornelles, o Partido da República defende a criação de um imposto sobre débitos e créditos bancários de 0,5%, portanto, de 1%, que arrecadaria, tomando por base os 0,38% da CPMF, cerca de R$ 100 bilhões.

Os governadores dos Estados produtores de energia, petróleo e minérios, por sua vez, querem uma alíquota especial sobre esses bens, que, com a reforma, passarão a ser taxados no destino. E o PT está tentando incluir na reforma a taxação de grandes fortunas, cuja arrecadação também poderia beneficiar Estados e municípios.

O Imposto sobre Grandes Fortunas entrou na Constituição de 88 (art. 153), por sugestão do então senador Fernando Henrique Cardoso, mas nunca chegou a ser regulamentado.

O importante, na negociação da proposta de reforma tributária, é construir rapidamente um consenso, já que cresce a consciência de que o Brasil precisa, com urgência, até pela crise internacional que se avizinha, dar continuidade às reformas. Tanto a tributária quanto a administrativa, para melhorar a gestão pública e diminuir a burocracia.

Também como escudo contra a contaminação pela crise, o país tem de manter e aumentar os investimentos do PAC na infra-estrutura e do PDE na educação, e baixar já os custos financeiros das empresas, com a redução dos juros. Aliás, única forma de fazer frente à concorrência internacional e à valorização do real, na verdade a desvalorização do dólar. Com a palavra, a oposição.



 

Outras reflexões sobre a mitologia tributária



Por EVERARDO MACIEL*


Gazeta Mercantil, 20/03/2008

20 de Março de 2008 – Dando curso às reflexões que tenho feito sobre o vasto campo dos mitos que se formam em torno da matéria tributária, hoje pretendo explorar a compulsão brasileira pela via constitucional, como forma de implementar mudanças na legislação tributária.

Como se sabe, nenhuma Constituição explora tanto o tema tributário quanto a brasileira. Nosso texto constitucional inclui desde princípios de caráter geral até normas francamente técnicas, como substituição tributária, não-cumulatividade, redução de base de cálculo, etc. Tal distorção converte quase todas as polêmicas tributárias em questões sujeitas a intermináveis processos judiciais, que invariavelmente deságuam no Supremo Tribunal Federal (STF).
Enquanto a Suprema Corte não elucida definitivamente a questão, os que têm acesso à Justiça passam a ter vantagens competitivas em relação aos seus concorrentes, para não falar da insegurança jurídica que inibe investimentos e gera um clima propício à corrupção.

O modelo tributário, instituído pela reforma da década de 1960, exibia alguns defeitos, dos quais o mais notório era a titularidade estadual do ICM. Nele, entretanto, não se pode deixar de reconhecer a qualidade técnica dos conceitos, a consistência interna e o equilíbrio no plano do federalismo fiscal.

As virtudes desse modelo foram sendo gradualmente solapadas por sucessivas mudanças constitucionais, especialmente as decorrentes da promulgação da Constituição de 1988. Houve uma completa desarticulação no equilíbrio federativo. Em conseqüência, a União se viu obrigada a expandir largamente o domínio das contribuições não partilhadas com as entidades subnacionais. Esse processo degenerativo, além disso, produziu inúmeras ambigüidades conceituais.

A experiência demonstrou que qualquer Proposta de Emenda Constitucional (PEC) se transforma rapidamente em matéria de caráter teratológico, por abrigar demandas de origem duvidosa, robustecidas pela certeza de que emenda promulgada não se sujeita a vetos corretivos.

Tome-se, como exemplo, a primeira proposta de “reforma tributária”, encaminhada ao Congresso Nacional, pelo atual governo. O substitutivo é um verdadeiro balaio de gatos, cuja paternidade já ninguém mais assume.

A simples apresentação de proposta de emenda constitucional já inaugura uma temporada de caça a parlamentares para apresentação de casuísmos, flagrantemente incongruentes com o modelo apresentado. De mais a mais, malgrado o excesso de matéria tributária na Constituição, não se conhecem vocações parlamentares para produzir emendas supressivas no texto constitucional.

Da parte do Poder Executivo, a compulsão pela via constitucional encontra amparo na demanda por soluções “abrangentes”, que entende como pífias soluções centradas em problemas ou que se operem por meio da legislação complementar ou ordinária. Esse fato também encontra explicação no recorrente equívoco que consiste em presumir que a eficácia da norma decorre inexoravelmente de sua hierarquia. Neste País, não raro uma portaria é mais eficaz que uma norma constitucional.

Tem-se por prudente abdicar de uma solução pela via constitucional quando se pode obter idêntico resultado por meio de uma norma de hierarquia inferior. A Constituição não deve assumir ares de um regulamento que reclama contínuas adaptações, com os enormes custos políticos inerentes a essas mudanças constitucionais.


A PEC recém-enviada ao Congresso incorre, de plano, no erro de tratar por esse instrumento matérias que poderiam ser objeto de legislação infraconstitucional.

Não se faz necessário alardear, como pretende a PEC, que o ICMS terá uma legislação única. Bastaria tão-somente detalhar, tanto quanto possível, a lei complementar prevista no art. 155, § 2, XII, da Constituição, para se dispor, na prática, de uma legislação única, ainda que disposta em 27 leis.

Tampouco se necessita de mudança constitucional para fixar alíquotas interestaduais do ICMS. A Constituição atual inclui essa matéria na competência do Senado Federal.

Tendo em conta que já existe identidade entre as legislações do PIS e da Cofins e entre as do IRPJ e CSLL, unificar os respectivos documentos de arrecadação – enfim, parece ser isso o que se busca sob o pretexto de “simplificar” – é algo que se resolve por meio de uma instrução normativa da Receita Federal.
Na PEC, de fato, existem questões que exigem tratamento constitucional. Quase tudo, entretanto, resulta da própria solução adotada.

Preferiu-se a solução constitucional, mais cômoda para os que apresentam, menos para os operadores da legislação tributária. A razão ainda aguarda momentos mais auspiciosos na saga da “reforma tributária” brasileira.



 


kicker: A mais recente proposta de reforma tributária é um verdadeiro balaio de gatos



 



EVERARDO MACIEL* – Consultor tributário e ex-secretário da Receita Federal. Próximo artigo do autor em 10 de abril
 

Reforma tributária

Ives Gandra Martins

A verdadeira reforma tributária seria aquela que implicasse redução da carga tributária. Melhorar a técnica de arrecadação sem reduzir a carga não é suficiente. E a carga tributária só cairá com a diminuição da carga burocrática, que, infelizmente, no governo Lula, tem crescido assustadoramente, sem contrapartida em serviços públicos corres pondentes.

O governo, todavia, apresentou seu projeto de reforma tributária, em que se incluem a eliminação do salário-educação, redução da contribuição previdenciária, no tempo, sobre a mão-de-obra; inclusão, num único tributo (IVA), de PIS, Cofins e Cides; partilha de quase todos os tributos federais, assim como a redução do número de alíquotas; e adoção do princípio de destino, para o ICMS.

A desoneração da folha salarial é uma boa sinalização, se não ocorrer a transferência da imposição para outros tributos de forma mais elevada. É que, sempre que o governo adota uma técnica de tributação nova, eleva as alíquotas acima do recomendável, para precaver-se contra possíveis e eventuais dificuldades na implantação do novo sistema. É a denominada “calibragem de conforto”, que elevou, por exemplo, a arrecadação do PIS e da Cofins em 50%, ao ser implantada a técnica não-cumulativa. Infelizmente, a calibragem de conforto termina se perpetuando, ainda quando não se verificam as perdas previstas.

Por outro lado, a União detém, hoje, em torno de 60% do bolo tributário. Se tiver de partilhar quase todos os tributos com Estados e municípios, não podendo abrir mão da receita atual, à evidência, os tributos federais embutirão um aumento da carga, compensatório do que irá perder. E, certamente, adotará – o que é uma tradição nas alterações tributárias – a “calibragem de conforto” na fixação das novas alíquotas.

O problema maior, todavia, reside no ICMS. A adoção do regime de destino, implicará perdas para os “Estados exportadores líquidos” e ganhos para os “Estados importadores líquidos”, isto é, perda para os Estados que vendem mais do que compram de outros Estados e ganho para os Estados que compram mais do que vendem.

Certamente, os Estados que vão ganhar não reduzirão o peso dos tributos e os Estados que irão perder terão de aumentar o peso tributário, com o que, necessariamente, a mudança de critério implicará aumento de imposição. A criação de um “fundo de equalização”, como pretendido pelo governo federal, para compensar os que vierem a sofrer perdas, demandará recursos, o que sinaliza, também, aumento da carga fiscal.

Para evitar 27 fiscalizações estaduais sobre as empresas “exportadoras”, o governo propõe uma alíquota compensatória na origem de 2%. Na proposta anterior, era de 4%. Creio que o justo seria elevar a alíquota para o Estado de origem.

A meu ver, uma sistemática razoável para o ICMS seria a seguinte: vedação a qualquer incentivo fiscal, no que concerne a este tributo, e adoção do sistema misto, que existe hoje, porém com um menor número de alíquotas, que seriam idênticas para todas as operações interestaduais. Eliminando o estímulo fiscal e as alíquotas diferenciadas, eliminar-se-ia a guerra fiscal. No modelo que proponho, até mesmo os estímulos de natureza financeira seriam proibidos, desde que os financiamentos concedidos pelos Estados aos contribuintes estivessem vinculados aos valores componentes do ICMS.

Tenho muito receio de que, apesar de serem boas algumas medidas constantes da reforma, tenhamos um considerável aumento da carga tributária e um acréscimo burocrático para as empresas, que hoje já dedicam aproximadamente 2.600 horas, em média, por ano, para atender compromissos fiscais. Na Alemanha, são necessárias apenas 105, e na Irlanda, 76, segundo levantamento do Banco Mundial e da Price Coopers abrangendo 175 países.

O desafio da reforma tributária é criar um sistema mais leve, mais justo, mais simples e mais eficiente

Antonio Palocci Filho


 


HÁ UM fator novo a encorajar a presente proposta de reforma tributária: o Brasil vive um período de crescimento que se mostra duradouro e consistente. E ele é acompanhado de uma maior formalização de amplos setores econômicos -a construção civil e os frigoríficos são os exemplos mais eloqüentes-, resultando numa maior arrecadação de impostos e de contribuições em todos os níveis de governo, a taxas mais elevadas do que o próprio crescimento do PIB. Certamente, esse movimento tem limites, mas oferece uma janela de oportunidade para permitir os ajustes naturais de uma reforma como a proposta pelo presidente Lula.

Contribui para essa possibilidade o fato de o governo ter enviado uma proposta com poucas mudanças, mas com objetivos ambiciosos de simplificação, modernização, correção de distorções e desoneração dos investimentos. Os debates mais modernos sobre tributos em todo o mundo têm apontado que o principal objetivo de reformas tributárias deve ser a busca da simplificação. Se tomarmos o exemplo do ICMS, o tributo mais importante em termos de arrecadação, vemos com clareza o quanto nossa estrutura pode ser melhorada. São 27 diferentes legislações, uma para cada Estado; uma infinidade de normas e dezenas de diferentes alíquotas para os mesmos produtos. É uma verdadeira biblioteca de leis e normas referentes a um único tributo! Isso eleva o custo para o fisco e para as empresas.

A proposta prevê uma forte simplificação do ICMS, substituindo as leis e normas atuais por uma única lei a ser aprovada no Congresso Nacional. O novo IVA passaria a ser cobrado no destino, ficando um pequeno percentual na origem para fins de estímulo ao trabalho do fisco local. Com essa mudança, corrigem-se duas grandes distorções que prejudicam a economia hoje: a guerra fiscal e o acúmulo de ICMS por empresas exportadoras. Esse acúmulo de crédito tem se tornado um custo altíssimo nos balanços dessas empresas. E, na prática, funcionando como um verdadeiro imposto de exportação.
No plano dos impostos e contribuições federais, também se prevê uma forte simplificação, com fusão da Contribuição Social sobre o Lucro Líquido com o Imposto de Renda da pessoa jurídica e a fusão das atuais contribuições num IVA Federal, com definição clara da parcela destinada à seguridade social (saúde, Previdência e assistência social).

A simplificação no desenho dos tributos permite maior redução da sonegação e menor pressão sobre aqueles que pagam corretamente seus impostos.

Ao eliminar o que resta de tributos sobre o investimento, o projeto investe no bom senso, pois taxar a empresa antes de investir é uma das graves deformações que persistem em nosso sistema.

O tema do desenvolvimento regional também é tratado, dando nova ênfase ao investimento de infra-estrutura para as regiões com menor dinamismo econômico, embora essa questão demande ainda muito debate.

Evidentemente, a proposta atual não é uma panacéia. E não há nada mais fácil do que criticar qualquer proposta de reforma tributária. A complexidade do tema permite um número ilimitado de opiniões e de propostas criativas. Mas o momento exige que o Congresso se concentre em aperfeiçoar a proposta do Executivo e dedique essa reforma à sociedade. O desafio é criar um sistema mais leve, mais justo, mais simples e mais eficiente. Uma reforma com esse resultado certamente prolongará o atual ciclo de crescimento e beneficiará as próximas gerações.



 


ANTONIO PALOCCI FILHO, ex-ministro da Fazenda, é deputado federal (PT-SP) e presidirá a comissão especial da Câmara sobre reforma tributária.