Financiamento público de campanha divide opiniões

Por ETCO
17/08/2012

Valor Econômico – Caderno Especial – Combate à Corrupção – 17/08/2012

 

O financiamento público das campanhas eleitorais é um passo decisivo no combate à corrupção? O tema é polêmico. Todos, porém, concordam em um ponto: a necessidade urgente de tornar o processo mais transparente, de forma a fortalecer a democracia e torná-la mais representativa. A questão-chave é deixar claro “quem financia quem”, fundamental para o eleitor ter condições de conhecer os vínculos entre candidatos e empresas. E de poder avaliar como o político se posiciona na hora de escolher entre o interesse público e daqueles que bancaram as despesas da campanha.

“O poder econômico tem importância fundamental no financiamento de campanhas políticas cada vez mais onerosas. Até para valorizar a democracia representativa, seria interessante avançar no modelo do financiamento público”, diz o presidente do Instituto Ethos, Jorge Abrahão. “Não dá para ter a ilusão de que o financiamento público vai acabar com a corrupção, mesmo porque não vai tornar as pessoas mais honestas”, afirma o professor da Faculdade de Direito da Fundação Getúlio Vargas do Rio de Janeiro (FGV-Rio), Pedro Abramovay. “Não há nenhuma evidência de que a forma de financiamento aumenta as chances de combater a corrupção”, explica o presidente da Associação Brasileira de Ciência Política e professor do Departamento de Ciência Política da Universidade Federal de Minas Gerais, Leonardo Avritzer.

O financiamento público das campanhas avançou em vários países a partir da segunda metade do século XX, como mostra o trabalho “A responsabilidade das empresas no processo eleitoral” realizado em 2010 pelo Instituto Ethos e pela Transparência Internacional. Mas se ele se fazia presente em 59% dos países democráticos em 2003, como constatou a ONG Idea International, em nenhum deles as despesas das eleições eram bancadas exclusivamente com recursos do Estado. No Brasil, esse financiamento tornou-se mais significativo a partir de 1995 com a criação do Fundo Partidário.

É impossível saber quanto o fundo efetivamente representa na receita total dos partidos porque parte significativa das doações ainda é feita “por baixo do pano”. “Não é possível menosprezar o pode econômico das grandes empresas. Elas ganham licitações, super-faturam os preços por meio de aditivos e financiam as campanhas com recursos do caixa 2”, comenta Avritzer. “Nesse contexto, o financiamento público pode aumentar a transparência e diminuir a corrupção.” Mas quem garante que as empresas não continuarão bancando seus candidatos? “O financiamento exclusivamente público não resolve o problema e pode ser até pior. Alguns candidatos continuarão recebendo recursos das companhias de forma ainda menos transparente do que agora”, diz o professor de direito penal da Universidade de Direito da FGV-Rio, Tiago Bottino.

No entanto, é impossível ignorar o fato de o financiamento privado privilegiar os políticos com acesso aos recursos do mundo empresarial. “Alguns candidatos passam parte considerável dos mandados arrecadando fundos para financiar as campanhas. Uns fazem isso de forma lícita, outros, de maneira ilícita, que abre uma enorme brecha para a corrupção”, explica Abramovay. Nesse contexto, recursos públicos podem tornar a disputa pelos votos mais igualitária, nesses tempos em que as despesas eleitorais sobem à estratosfera.

Em 2008, os 11 candidatos à Prefeitura de São Paulo declararam à Justiça Eleitoral que iriam gastar R$ 96,1 milhões. Neste ano, os 12 candidatos preveem gastos de R$ 341,5 milhões, 255% a mais.

Para os especialistas, mais importante que a origem dos recursos para o financiamento eleitoral é a transparência do processo, o estabelecimento de regras claras e a fiscalização para garantir o cumprimento. E, também, a fixação de penalidades mais duras para quem se desviar da rota, como a inegibilidade de quem for condenado pela Justiça Eleitoral durante um certo período de tempo. Nessas eleições, alguns juízes eleitorais estão exigindo a adoção dos princípios da Lei da Transparência pelos candidatos.