Pirataria de software tem solução?

Por ETCO



Por Guilherme Abrantes – Advogado especialista em propriedade intelectual do escritório Daniel Advogados. Gazeta Mercantil/Caderno A – Pág. 3








2 de Agosto de 2005 – O tsunami da pirataria é avassalador quando se sai de dentro das empresas. Muito se tem noticiado acerca da diminuição da pirataria de software no Brasil. Será que realmente está diminuindo? Talvez. Mas não na intensidade com que se tem noticiado. Pelo que consta, a pirataria de programas de computador no País gravita em torno de 55% do mercado. De fato, num passado não muito distante, esse índice ultrapassava 70%, e uma redução de cerca de 15% não pode ser menosprezada.

No entanto, há de ser feita uma distinção quando da análise desses números. Lá pelos idos de 1997, quando foi iniciada a campanha antipirataria de software no Brasil, o foco era coibir o uso ilegal dos programas de computador dentro das empresas. Conduzida com certa competência, a campanha trouxe bons resultados. Mas há algum tempo o problema central da pirataria não mais está dentro das empresas.

Bem ou mal, as empresas têm alguma condição de tocar seus negócios com uma política razoável de licenciamento dos programas que utilizam. Afinal, ninguém quer se sujeitar à multa estratosférica estabelecida pela lei. Mas o tsunami da pirataria é avassalador quando se sai de dentro das empresas.

Imaginemos um trabalhador comum que ganhe R$ 1 mil por mês. Com muito esforço ele consegue comprar seu computador em prestações homeopáticas. “Realmente vale o investimento. Não sou mais um excluído digital!”, alegra-se o trabalhador. Eis que lá pelas tantas vem o filho: “Pai, compra o KickMegaJumpStrike pra mim? Eu joguei na casa do Joãozinho e é bolado!”.

No dia seguinte, vai o pai trabalhar e, no caminho, ele depara com uma loja de informática com o tal jogo na vitrine: R$ 100,00. Depois do choque, ele segue para o trabalho meio desolado, até que tropeça num caixote de feira na calçada: “Counter-Strike, Half-Life, Doom, GTA, Fifa Soccer e… KickMegaJumpStrike! 1 é 10, 2 é 15!”.

Desconfiado, ele pergunta sobre a procedência daqueles jogos e o vendedor confirma que são cópias fiéis dos jogos originais. O trabalhador não pensa duas vezes: saca uma “arara” do bolso e vai-se embora munido do jogo que fará a alegria do filho. E realmente faz. Mas, como já diz o jargão popular, alegria de pobre dura pouco: durante o jantar vira-se o pequerrucho e dispara: “Pai, tenho que fazer um trabalho e o nosso micro não tem processador de texto”.

Manhã seguinte, mesma cena. Quando o pai viu o preço do editor de texto, quase teve um ataque. Haja “homeopatia” para “curar” mais R$ 1 mil. Aí ele se lembra das palavrinhas mágicas: “1 é 10, 2 é 15!”. Poucos segundos depois, mais uma “arara” voou do bolso do nosso trabalhador.

Ora, como um indivíduo que ganha, digamos, R$ 1 mil por mês consegue pagar esses preços? Ou o trabalhador come ou compra o programa. Por razões evidentes, ele come. Ponto para o dono do caixote e azar das empresas de software.

A propósito, o detalhe do caixote já está um pouco ultrapassado. “Vendedores” mais atualizados escondem os CDs em lojas de outros ou até mesmo em bueiros, dependendo da urgência. Mas a maioria dos ambulantes está adotando uma outra prática: os CDs só existem em casa e eles executam o serviço à noite. Durante o dia eles só coletam os pedidos. Otimizam o negócio e reduzem igualmente as chances de serem flagrados pela polícia.

No Centro do Rio de Janeiro há um edifício chamado Avenida Central, localizado em plena Avenida Rio Branco. Ele seria um edifício comercial comum não fosse por abrigar o que se conhece como Info Centro, um shopping de produtos de informática. A disposição dos ambulantes na calçada é tal que a entrada no edifício torna-se uma guerra, pois os transeuntes têm de driblar os ambulantes ao mesmo tempo que protegem os ouvidos dos berros e os bolsos de eventuais trombadinhas. Por mais caricata que possa parecer a historinha acima, o edifício Avenida Central está lá, todo dia, com os ambulantes, os transeuntes e os trombadinhas, para quem quiser ver.

Não adianta dar murro em ponta de faca. Num país como o Brasil, a população não vai comprar um programa de computador por R$ 1 mil. Mordam os cotovelos. O povo prefere correr o risco de ser preso a desembolsar uma fortuna por um programa de computador.

Enfim, parece que as empresas de software estão finalmente entendendo o recado. A Microsoft recentemente lançou no mercado versões mais simples do Windows e do Office por preços menos salgados. Ponto para o time do Bill Gates. É bem verdade que R$ 300 ou R$ 400 por um programa de computador ainda são mais do que a maioria da população pode suportar, mas já é um indício de que, em algum momento, poderemos chegar a um denominador comum. Enquanto isso… 1 é 10, 2 é 15.