REVISTA ETCO – EDIÇÃO 25
AGOSTO, 2020
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“É preciso estimular a solução extrajudicial de conflitos tributários”

A ministra Regina Helena Costa, do STJ, afirma que avanços recentes na legislação permitem intensificar a busca desse caminho para reduzir o contencioso judicial

Revista ETCO
20/07/2020

Na avaliação da ministra Regina Helena Costa, do Superior Tribunal de Justiça, a complexidade de um sistema tributário que sobrepõe três níveis de governo, a multiplicidade de normas e o excesso de obrigações acessórias representam as três principais causas do elevado contencioso tributário verificado no País.

Livre-docente em Direito Tributário pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, ela aponta também a existência de uma cultura no Brasil de achar que conflitos envolvendo o Estado só se resolvem no Judiciário. Em sua opinião, o País precisa estimular a utilização de meios extrajudiciais para a solução das divergências tributárias. Ela cita avanços legais importantes nesse sentido, como a previsão de arbitragem, conciliação e mediação no novo Código de Processo Civil, e defende que eles sejam mais utilizados pelos operadores do Direito.

Segundo a ministra Regina Costa, isso desafogará o Judiciário, que poderá então tratar melhor dos litígios envolvendo muitos contribuintes ou que não podem ser resolvidos pela via extrajudicial. “Ganharão todos”, ela afirma. A seguir, a visão da ministra.

Afeta arrecadação e afasta investimento

O contencioso judicial tributário no Brasil é alimentado pelo elevado nível de litigiosidade entre Fisco e contribuintes. ​Isso é muito nocivo para o País, porque, de um lado, gera insegurança jurídica para os sujeitos da relação tributária, com prejuízos à arrecadação; de outro, cria um ambiente econômico desfavorável para atrair investimentos. Além disso, congestiona o Poder Judiciário, que, por mais que aperfeiçoe continuamente sua estrutura, não consegue, na maioria de suas unidades, atender a essa demanda com eficiência e celeridade.

Três razões principais

A acirrada litigiosidade judicial nesse contexto ocorre por diversas razões, sendo que as principais, a meu ver, são: 1) a complexidade do sistema tributário brasileiro, que contempla grande número de tributos, num Estado Federal de tríplice ordem jurídico-política (União, Estados/Distrito Federal e Municípios); 2) a multiplicidade de leis e atos administrativos normativos, que torna as normas tributárias de difícil assimilação e compreensão; e 3) o excesso de obrigações tributárias acessórias, isto é, de deveres formais a serem observados pelos contribuintes.

Estímulo à solução extrajudicial de conflitos

No Brasil é arraigada a cultura segundo a qual os litígios, especialmente envolvendo o Poder Público, somente podem ser resolvidos judicialmente. Trata-se, em meu sentir, de uma ideia que precisa ser superada. É preciso estimular o emprego de meios de solução extrajudicial de conflitos, inclusive para as lides tributárias. Por exemplo, aprimorando o regramento do processo administrativo tributário, que é o mais antigo e conhecido desses expedientes em nosso ordenamento jurídico. Alterações legislativas recentes vêm confirmando essa tendência.

Nessa linha, o Código de Processo Civil de 2015, de espírito inovador, declara ser “permitida a arbitragem, na forma da lei”, bem como que “o Estado promoverá, sempre que possível, a solução consensual dos conflitos”, exortando os operadores do Direito a estimular a adoção da conciliação, da mediação e de outros métodos para o alcance desse objetivo (art. 3º, §§ 1º, 2º e 3º), representando o marco inicial de uma nova cultura na busca da pacificação social. Igualmente, a Lei nº 13.140, também de 2015, dispõe sobre a mediação entre particulares como meio de solução de controvérsias e sobre a autocomposição de conflitos no âmbito da Administração Pública, cujas normas são aplicáveis a conflitos tributários (arts. 32 a 38).

Segurança jurídica, eficiência e celeridade

Em síntese, penso seja imperioso estimular o emprego dos instrumentos de solução extrajudicial de conflitos tributários, reservando ao exame do Poder Judiciário apenas aqueles que não possam ser resolvidos por esses meios, como é o caso dos litígios envolvendo um elevado número de contribuintes na mesma situação, que demandam, portanto, uma solução uniforme. Assim, ganharão todos – Fisco, contribuintes e a sociedade em geral – em segurança jurídica, eficiência e celeridade, habilitando o Poder Judiciário, ao julgar menor quantidade de demandas, a entregar uma prestação jurisdicional de maior qualidade.

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